"É só o começo."

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– Nunca mais diga isso. – falo pondo minha mão direita sobre sua bochecha de forma que seja possível enxugar uma de muitas lágrimas que escorrem por seu rosto. – Você não tem noção do quanto isso me dói.
– Eu sei. Sei muito bem porque também está doendo aqui dentro de mim.
– Eu não sabia...
O pior é que eu realmente não sabia.
– Pê, eu sei que o relacionamento que tenho com minha mãe está mais sadio, mas preciso de você. Sabe que preciso.
– E eu de você. – Dou-me conta de que também estou chorando.– Preciso ir agora.
– Mas...
– Preciso conversar com minha mãe.
– O que vai dizer?
– É o que eu quero descobrir.
Dou-lhe mais um abraço e em seguida levanto-me de sua cama, fico observando a forma de como ela põe uma mecha de seu cabelo para trás de uma de suas orelhas. Seu cabelo é bem escuro e ganha perfeita harmonia quando em contato com sua pele parda. Seus olhos castanhos costumavam ser vibrantes, mas hoje não. Suas lágrimas afogaram o brilho que excedia sobre eles.
– Até mais.
– Até.

Saio da casa de Crislen e me direciono para o carro de minha mãe. Posso ouvir o barulho de um carro se aproximando como se quisesse parar. Só depois de ver de quem se tratava é que percebi que ainda estou olhando para o interior do veículo. Baixo minha cabeça, comprimo meus lábios e fecho não muito suavemente meus olhos antes de acenar para a mãe de Cris.
Ainda com a cabeça abaixada estou a olhar para Alícia, vejo que ela está tendo dificuldade para estacionar o veículo.
– Carro novo? – pergunto enquanto levando minha cabeça.
– Amm? – ela me olha como se não estivesse me reconhecendo. Só depois de vê-la por uma das mãos sobre os olhos noto que o sol atrapalhava-lhe à vista. – Aaah, Petrina! Não, isso não é meu. Esse...Esse carro não é meu.- fala tropeçando nas palavras.
– Tá tudo bem, Alícia? Você parece...
– Oh, querida! Está sim. É que meu carro está na oficina e o Martinez me emprestou o dele. Sabe? O dono da Oficina?
– Sei sim.
– Pois é. – ela põe as mãos na cintura e balança a cabeça como se estivesse aprovando algo. – E... E você? Está bem?
– Sim. Estou legal.
– Ótimo!
– É. Maravilha! – pronuncio essa última palavra fingindo empolgação. – Preciso ir. Tchau, Alícia.
– Tchau.
Entro no carro e sigo em direção para minha casa.

Ao chegar, estaciono o carro e olho fixamente para as janelas da sala. Depois de alguns segundos apoio minha cabeça no volante e penso em como falar com minha mãe.
– Que merda!
Ligo novamente o carro e o encaminho para à garagem. Existe, na garagem de nossa casa, uma porta que dá acesso à cozinha e é de lá que estou ouvindo a voz de minha mãe.
– Petrina?
Silêncio.
– Frenck, querido? - pergunta novamente.
– "Querido"... - resmungo baixinho.
– Frenck?
– Sou eu. - respondo desanimada enquanto entro na cozinha procurando por ela. – O que você tem nessa sua cabeça, hein? (A pergunta não saiu como eu imaginei).
– O que é isso??! – Mamãe pergunta confusa.
– Não se faça. Olha... Por que não me contou que íamos embora?
– Nós vamos. E outra, você não aceitaria, ia fazer papel de tola exatamente como está fazendo agora, por isso mantive em segredo.
– Nem tanto assim.
– Não importa. Melhor assim.
– Como não? Eu...
– O MUNDO NÃO GIRA EM TORNO DE VOCÊ, PETRINA. ENTENDA ISSO DE UMA VEZ! – ela fala alterando o tom de sua voz.
– E gira em torno do seu? – pergunto com a voz retraída.
– Conversaremos sobre isso mais tarde e ponto. – responde cruzando os braços  ficando de costas para mim.
– Mas mamãe, esse é o último ano...
– E PONTO, PETRINA!! – ela já está me olhando novamente e com o dedo indicador direcionado para mim.

Saio do vão em que estamos, qualquer outro é melhor que este. Subo para o meu quarto e tranco a porta. Quero ficar sozinha, quero que tudo isso acabe logo.
Mamãe disse que mais tarde conversaremos e isso quer dizer que a conversa terá de esperar por papai, o que é ruim, pois eu não conseguirei dizer '' não" caso a decisão de irmos embora resulte em uma melhoria para ele.
Eu, mais do que qualquer outra pessoa, torço pelo bem e sucesso do papai.

Jogo-me em cima da cama e fico a olhar para o teto de meu quarto. Tudo está girando. Fecho fortemente meus olhos.
"Por que isso não acaba?" Penso.

– É só o começo.

O calor da neveOnde histórias criam vida. Descubra agora