Capítulo 2

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CAPÍTULO 2

EU ME PERGUNTO SE NÃO deveria ter previsto isso. Se não deveria ter sido

mais observadora, mais esperta, mais sensível às sutis mudanças de

humor. Assim, talvez tivesse percebido que meus pais sentiam falta de

algo. De alguma coisa que encontrariam em Deus. Mas a verdade é que

não me lembro de nada sobre nossas vidas antes de Frick que pudesse

indicar que eles se voltariam para Deus de tão bom grado. A verdade,

tive que admitir quando comecei a me fazer essas perguntas nas

semanas seguintes à conversão dos meus pais, era que eu não os

conhecia muito bem. E, quando eles passaram a Crer, eu nunca mais

teria essa chance, a não ser nos raros momentos em que as máscaras de

devoção, usadas com muito cuidado, acidentalmente deixassem

transparecer um vislumbre das pessoas por trás delas.

Sei a data exata em que eles aderiram oficialmente à Igreja

Americana porque foi no domingo seguinte ao meu aniversário de

dezesseis anos. Era início de março, e faltavam pouco mais de três

meses para o fim do meu primeiro ano do ensino médio. Eu tinha

convidado algumas amigas para ir lá em casa — Lara Cochran, minha

melhor amiga nos anos pré-Harp, Corinne Brocklehurst e uma garota

quieta da aula de artes chamada Avery Tooher. Comemos pizza e bolo e

compartilhamos as fofocas habituais, pequenos rumores entreouvidos

sobre festas para as quais não havíamos sido convidadas. Elas foram

embora prontamente às 21 horas, depois de me darem pequenas cestas

de presentes contendo brilho labial e desodorante, todas da mesma loja

do shopping. Éramos amigas por causa da proximidade alfabética dos

nossos sobrenomes, das notas altas e da falta de habilidade para chamar

atenção. Se fiquei entediada naquela festa, não percebi.

Quando acordei, na manhã seguinte, meus pais estavam sentados à

mesa no primeiro andar. Não era muito tarde, mas dava para perceber

que eles já tinham saído e voltado — estavam bem-vestidos, e no centro

da mesa havia uma travessa de bagels, em maior quantidade do que nós

três conseguiríamos consumir de manhã. Estavam sentados bem

próximos, absortos em uma conversa que interromperam de repente

quando entrei. Na mesma hora, pude sentir a inquietação que eles às

vezes exibiam antes de me dar más notícias. Quando me sentei e peguei

um bagel, me ocorreu que talvez alguém tivesse morrido.

— Conta como foi a festa — pediu minha mãe.

Eles estavam em casa na noite anterior, mas ficaram no quarto para

Vivian Contra o ApocalipseOnde histórias criam vida. Descubra agora