Capítulo 10

5 0 0
                                    

CAPÍTULO 10

UMA HORA DEPOIS, PARAMOS NO acostamento e trocamos de lugar ao volante, e

Peter foi dirigindo até a fronteira de Indiana. Já são quase oito e meia da

manhã, e Harp ainda está dormindo no banco de trás. Não a vi se mexer

nem um pouquinho desde que se deitou, então toda hora me viro e

ponho o indicador bem debaixo do seu nariz para conferir se ela

continua respirando. O que devo fazer depois de descobrir que minha

melhor amiga encheu a cara escondida hoje? Em parte penso que isso é

só Harp sendo Harp, mas por outro lado estou meio chateada — por mais

que eu saiba que somos diferentes, às vezes é estranho pensar nas coisas

que Harp faz que eu jamais faria. Ela está passando por um período

difícil, penso, na sexta ou sétima vez que me viro para trás depois de

imaginar minha amiga morrendo sufocada com o próprio vômito. Mas

então penso, como Peter falou: Todo mundo está.

Enquanto isso, nos bancos da frente, ele e eu batemos papo durante os

quinze minutos em que consigo deixar pra lá minha preocupação com

Harp. Conversamos sobre livros, filmes, bandas e a mãe dele. Falamos

sobre o que estaríamos fazendo neste momento se o Pastor Beaton Frick

nunca tivesse existido. Peter se imagina na faculdade em Nova York,

andando pelas ruas cheias de gente, lendo no metrô, deitando na grama

do Central Park nos dias de sol. Eu estaria me preparando para o baile

de pré-formatura. Teria ido comprar um vestido com minha mãe,

rachado uma limusine com Lara e as outras, e, quando Harp chegasse na

festa tropeçando um pouco nos saltos muito, muito altos e usando um

vestido justo, curto e brilhante, eu a julgaria. Como castigo por essa

realidade alternativa, verifico outra vez a respiração dela e ajeito seu

cabelo, tirando-o do rosto.

Ela acorda quando paramos em um restaurante na estrada perto de

South Bend. Harp se senta no banco de trás, limpa a bochecha babada e

fala, parecendo confusa:

— Porra, preciso muito mijar.

Antes que eu consiga dizer qualquer coisa, ela abre a porta e entra no

restaurante. Enquanto Harp estava dormindo, Peter e eu concordamos

em ir com calma no caminho até a Califórnia. A cultura Crente parece

variar muito, indo de benigna a assustadora de repente, e então volta ao

normal. Quando Harp acordou, estávamos planejando assumir

identidades falsas na hora de interagir com estranhos, nos passando por

personagens que nos garantiriam certa proteção — por exemplo, o irmão

mais velho Crente que leva sua irmã pecadora e a amiga dela de volta

para o bom caminho. "Será como um jogo", comentara Peter, animado,

Vivian Contra o ApocalipseOnde histórias criam vida. Descubra agora