*Vitória*
- Ninha, tu quer que eu desmarque? – Perguntei porque apesar de achar que a Ana estava sendo uma boba, eu não queria magoá-la.
- Não, Vi. – Ela disse parecendo impaciente.
Passei minha mão em seus cabelos e ensaiei um carinho, ela se encolheu como quem não queria meu toque naquele momento.
- Vamos conversar? – Eu precisava muito que ela não me tratasse com tanta distância e frieza.
- Sobre? – Ela continuava ríspida e comecei a me arrepender de começar esse papo.
- Isso aqui, ontem, você brava assim – Falei tentando não ser grosseira com ela.
- Fala, Vitória – Ela disse se sentando na cama.
- Ninha, eu não quero brigar, tu é a coisinha mais preciosa que ganhei nessa vida adulta. Se tu me contar o que tá te aporrinhando tanto, eu prometo que tento te ajudar a resolver, mas por favor, não me machuca assim não. – Falei e meus olhos já marejavam.
*Ana Clara*
Quando percebi que a Vitória estava quase chorando, respirei fundo e quase esqueci porque eu estava agindo daquela forma estúpida.
- Ô Vi, não chora não – Eu disse já a abraçando. – Desculpa, desculpa, não chora. Eu sou é doida mesmo, Vi. Vamos ajeitar as coisas, tu escolhe minha roupa que eu vou pro banheiro.
- Ninha, a gente não terminou – Ela disse secando as lágrimas. – Sobre ontem... eu não sei se... eu nem sei bem o que te dizer, mas é que eu sempre me deixo ir e quando eu vejo, eu já fui e depois as pessoas ficam magoadas porque eu fui sendo e fazendo uma bagunça e eu não quero te bagunçar também e...
- Vi, tá tudo bem. Aliás pra quem nunca ficou com uma mulher, né, Vitória? Tu deve é estar me enganando, se fazendo de hétero pra me conquistar – Eu disse em um tom brincalhão, já me levantando da cama – Mas assim, quando tu quiser testar de novo esquece de mim não.
Dei uma piscadinha, começamos a rir e ambas sabíamos que aquela nunca seria a nossa dinâmica. Eu e a Vi tínhamos algo tão nosso que cada parte do meu corpo a sentia, ela arrepiava cada pelo da minha pele só de existir. Quando ela sorria daquele jeito bobo dela eu só conseguia pensar que deus certamente existia e se ele não existisse, passou a existir apenas para ver aquele sorriso.
Tomei um banho demorado para me lembrar que eu precisava ficar tranquila ou a Vi ficaria triste e no bolo de emoções que eu sentia a Letícia ainda ocupava algo grande em mim e Vitória me deixava sem controle do meu corpo e da minha mente. "Eita, NaClara, tu tá lascada, mulher" pensei saindo do banho e pude ouvir a movimentação na sala. Me vesti rapidinho, a Vi me escolheu um shortinho jeans e uma blusinha branca engraçada com mangas curtas com um ET, roupa básica, afinal estávamos em casa. Quando saí, de cabelos molhados e tentando sorrir, encontrei Lucas, Vitória e mais 2 rapazes, amigos do Lucas em meu sofá conversando, uma moça sorridente sentada no chão vendo os discos da estante sem tocá-los.
-Ei – Vitória foi a primeira a dizer – Ninha, esses são o Conrado, o Julinho e a Manu, são amigos do Lucas.
Cumprimentei todos com o melhor sorriso que pude, dei um abraço apertado no Lucas e na hora de cumprimentar a Manu, apenas me sentei no chão ao seu lado.
-Pode mexer nos discos. Só não pode quebrar – Falei rindo.
- A Vitória disse que eram seus, não quis ser intrometida. – Ela disse me olhando.
Peguei o LP "4" dos Los Hermanos e entreguei em suas mãos.
-Gosto muito desse. Mas gosto desse também, e desse... quando percebi eu já tinha mostrado quase todos os LPs da minha estante.
- Nossa, você tem bom gosto pra música. Eu trabalho com isso, ou estou tentando, não sei. – Ela disse sorridente.
- Eu e Vi também estamos tentando, mas demos muita sorte, o Felipe é um anjo.
-Sim ele é, anjo e meu produtor também, por isso o Lucas queria que eu viesse hoje e que nos conhecêssemos.
- Ual, que coincidência. – Agora já estávamos de pernas de chinês de frente uma para a outra conversando sobre todo o universo de músicas e sobre como é massa trabalhar com o Felipe. Eu tentava a todo custo afastar a Vitória e o Lucas da minha cabeça e visão e consegui me focar apenas na Manu por um bom tempo.
- Ninha, me ajuda aqui – A voz de Vitória ecoava da cozinha.
- Já volto – levantei dizendo para a Manu.
- Oi, Vi – Falei entrando na cozinha e observando a Vitória bêbada remexer todos os armários.
- Cadê o abridor de vinho? Eu não acho.
-Tu que abriu o primeiro, mas como sou teu anjo da guarda – Eu falava segurando o abridor que estava na bancada desde o início.
- Obrigada, Ninha. – Ela me disse rindo – Tu tá bem?
-Aham - assenti com a cabeça.
- Claro, né, tá toda toda com a tal Manu, né?
- Eu só tenho olhos pra você, Vitória Falcão – Disse rindo e piscando o olho, Vitória ria comigo.
Assim que voltamos para a sala, meu celular tocou e fiquei muito surpresa ao ver que era Letícia, desde que voltamos a nos falar, só trocamos mensagens, ou seja, desde o término essa era a primeira vez que ouviria sua voz. Meu corpo inteiro estremeceu. Fui para perto da janela, onde atendi e pude perceber que a Vitória me seguiu com os olhos.
- Cla, você tá ocupada? – Ela parecia completamente bêbada.
- Não, Lê. Aconteceu algo? – Respondi ainda confusa.
- Não, Cla, eu liguei pra dizer que eu te amo, que eu tô doida de saudade e te pedir pra voltar pra minha vida. Vem me ver, amor. Me dá uma chance só, pra gente se acertar, por favor. – A voz manhosa da Letícia me apunhalou de uma forma que eu não conseguia raciocinar.
- Lê, vai dormir. – Foi tudo que eu consegui dizer, mas meu coração estava confuso e apertado, de repente toda a minha história com a Letícia girava na minha cabeça até que senti os dedinhos de Vitória no meu ombro.
- Plincexa, tá tudo bem? – Ela disse me abraçando por trás.
Acenei positivamente e me deixei repousar naquele abraço tranquilo. Depois de uns momentos em silêncio a Vi resolveu perguntar:
-Quem era?
- Letícia.
- Tá tudo bem?
- Álcool e saudade.
-Nela ou em tu?
- Sinceramente? Em ambas. – Quando terminei essa frase senti Vitória me esmagando em um abraço quase sufocante.
Voltamos à sala e Vitória se sentou pertinho de mim onde passou o resto da noite. Até que a noite foi bastante agradável e por volta das 4:30 Lucas e seus amigos pediram um uber, mas antes de ir, Lucas disse em meus ouvidos:
- Ela só tem olhos pra você. – Em seguida ele beijou minha testa e eu apenas o abracei forte sem ter condições de pensar no que ele estava me dizendo agora.
Entramos e Vitória apenas se jogou no sofá. Tranquei a porta, quando ia me sentar na cadeira, ouvi uma voz carinhosa, sonolenta e um pouco bêbada.
- Deita aqui comigo, Ninha – Vitória me chamava com seus dois braços esticados.
Deitei em cima dela e acomodei minha cabeça em seu peito. Agora os dedos dela passeavam em meu cabelo, como quem espanta pensamentos ruins.
-Ninha, eu acho que se tu não sabe, tu deveria ir ver a Letícia. – Vitória disse e meu coração acelerou tanto.
Eu realmente não fazia ideia do que queria, mas ali no abraço dela, eu realmente não queria pensar nisso. Não a respondi, fiquei ali e me deixei adormecer naquele cheiro e com o carinho sutil dela nos meus cabelos.
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Marte e Girassóis
RomanceNarra o pouquinho que sabemos da história das duas e não tem como prevermos o fim da história. Vamos que vamos deixar a criatividade fluir e onde vai parar "fica aí a questão pro universo".