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Rodrigo estava tentando. Por nós dois. Estava fazendo exatamente o que prometeu à Helena que faria. Me acompanhava nas noites em claro e velava os cochilos que eu tirava durante o dia. Não fazia ideia de como ele estava aguentando a rotina mórbida e desregular que estávamos vivendo e eu gostaria de ser boa pra ele também, mas eu não tinha forças. Tudo doía, absolutamente cada parte do meu corpo sucumbia à dor emocional, me fazendo passar por um desgaste físico intolerável.

Eu, que sempre me intitulei forte e preparada pra tudo, estava entregue à um estado de melancolia profunda e como se já não bastasse toda a dor, a culpa consumia-me dia após dia por ver Rodrigo com olheiras enormes, o cansaço estampado em sua face, por minha culpa.

Absolutamente tudo era minha culpa.

Lembrar do rosto de cada um dos familiares que passaram por nossa casa depois que voltamos do hospital me causava angústia. Eram feições tristes e eu não conseguia não pensar que havia decepcionado a todos. Sem exceção. Fiz minha mãe e Ana sofrerem e as crianças, por Deus, eu nunca conseguiria esquecer seus rostinhos inocentemente confusos ao tentarem entender o que havia acontecido com a prima que eles estavam tão ansiosos para conhecer.

Quando eu achei que estava forte o suficiente para encontrar a todos na casa de Ana, consegui a prova de que não aguentaria assim que ouvi Joaquim perguntando para a mãe se poderia ter de aniversário uma estrela, aquela que explicamos para ele que era nova no céu e se chamava Helena.

Rodrigo entendeu quando eu pedi para ir embora. Ele sempre entendia.

Depois eu desisti, não havia porquê tentar se eu sabia que não conseguiria.

Eu já não sabia quantos dias haviam passado por causa da escuridão do quarto e dos remédios que estava tomando, mas soube quando era o momento certo de fazer o que eu já estava adiando há mais tempo que devia.

Mais tarde Rodrigo se assustou quando atravessou a porta do apartamento e me viu no sofá. Pela primeira vez em dias vi um sorriso desenhar seu rosto.

- Como é bom te ver fora daquele quarto, amor. – Ele disse largando sua mochila e sentando-se ao meu lado. Apanhou minhas mãos e as beijou repetidas vezes. – Eu ia te chamar pra jantar fora hoje, o que você acha?

- Eu preciso conversar com você sobre uma coisa urgente. – Falei, mas seu olhar foi desviado do meu até a mala que estava a alguns metros de nós. Seus olhos transmitiam toda a confusão e dúvida que eu sabia que ele estava sentindo.

- O que está acontecendo? – Perguntou. – Por que essa mala está ali?

- É sobre isso que eu quero conversar. – Respondi com voz baixa. – Eu preciso ir embora, Rodrigo.

- Ir embora? Por quê? Pra onde? – Levantou rapidamente com o susto. – Eu fiz alguma coisa errada?

- Não, claro que não, meu amor. – Senti meus olhos marejarem, uma sensação que já me era muito familiar. – Você fez tudo certo. Eu que fiz tudo errado.

- Não fala bobagem, Agatha, nada do que aconteceu com a gente é culpa sua.

- Mas eu não consigo sentir como se não fosse. – Suspirei e me levantei também, uni nossas mãos e o olhei nos olhos. – Eu não consigo seguir em frente, Rod, e eu tô acabando com a sua vida.

- Você tá se ouvindo? Meu Deus, eu te amo, você sabe, não é?...

- Eu sei que sim! E eu te amo mais que tudo também, é por isso que eu decidi passar um tempo com minha mãe, eu preciso melhorar e eu preciso parar de fazer você sofrer. Eu preciso parar de fazer todo mundo sofrer. Me escuta, por favor. – Segurei seu rosto com todo o carinho que existia em mim. – Você é forte, mas eu não sou. Todos os dias tudo o que eu penso é em encontrar nossa filha. Tá tudo uma bagunça dentro de mim, uma tempestade que não acaba nunca.

- Eu achei que estava conseguindo te ajudar. – A dor em sua voz era quase palpável.

- Olha o que eu estou fazendo com você. – Disse enquanto enxugava suas lágrimas e deixava as minhas próprias caírem. – Você não merece isso, seu rosto combina perfeitamente com a felicidade e tudo que eu tenho conseguido fazer é você chorar. Todos os dias. E eu sei que não é só por Helena. Eu não mereço você, Rodrigo.

- Eu não vejo como isso é uma boa ideia.

- Eu estou no meu limite, Rod.

- Eu sei, meu amor, eu vejo, mas me deixa te ajudar, por favor. Você diz que eu sou forte, mas eu não consigo ser nada disso sem você. Eu prometi pra ela que conseguiria, que salvaria nós dois. Fica.

- Eu acho que eu não tenho mais salvação... – A essa altura nosso choro já era desesperado e afogado por grossas lágrimas. – E eu preciso salvar você de mim enquanto ainda tenho tempo. Eu sou um navio de carga prestes a naufragar e eu preciso que você sobreviva.

- Como você espera que eu te deixe sozinha nessa situação, Agatha? Eu jamais conseguiria, me pede qualquer outras coisa, mas isso não.

- Por favor. – Supliquei, praticamente sem voz.

Ele parecia em uma luta interna feroz. Era questão de tempo até ceder e eu sabia que não era porque não me amava. Na verdade era porque ele me amava demais. Eu entendo perfeitamente a posição a qual o coloquei, mas não existia outra alternativa. Eu estava fazendo o que era melhor pra nós dois.

- Tudo bem. – Sussurrou derrotado e eu o observei caminhar em direção ao nosso quarto. No meio do caminho, Rodrigo tirou uma caixinha de seu bolso e a depositou em cima de minha mala. Falou tão baixo que quase não escutei.

- É o seu anel de noivado. Eu ia te dar hoje no jantar. É seu, pode levar.

E então me deixou sozinha naquela sala silenciosa. Apenas eu e meu choro de solidão causado por mim mesma. Eu jamais afirmaria que essa decisão era acertada, mas algo precisava ser feito. A minha luta interna estava deixando todos doentes, começando por mim mesma e sendo seguida pelo homem dono de todo o meu amor.

Eu não conseguia trabalhar, conviver com outras pessoas, eu mal conseguia me reconhecer. Qual solução eu deveria achar para esses problemas, senão poupar a todos de me suportar? Eu me sentia uma fardo, minha alma parecia ter milhares de buraquinhos que nunca seriam cicatrizados.

Não existia vida sem Helena, concluí pela milésima vez.

...

Oi, lindonas!! Desculpem a demora, o próximo capítulo é um extra (preparem o coração) então deve sair bem mais rápido que esse. 

Não deixem de falar o que estão achando, tá? Qualquer coisa me gritem no twitter, meu arroba é alicedejour.

Beijão!!

Ain't No Sunshine ✔Onde histórias criam vida. Descubra agora