Dia Cinco: Desmoronar

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Quando era pequeno, Keith sempre sentiu que era excluído dentro de sua própria casa.

Ele poderia ser muito novo, mas sentia claramente o desprezo de seu pai por ele. Conseguiu ver pela forma como ele agia com Shiro que o tratamento que recebia não era o mesmo. Ele notava que o homem, por vezes, apenas o percebia nos cômodos quando entrava, sem interagir realmente, apenas recebia um acenar de cabeça, como se fosse qualquer funcionário. Ele sentia aquilo por anos. Ele estava acostumado. Keith pensava que aquilo era por ele ser adotado. Shiro ainda era filho de sua falecida esposa, mas ele não possuía qualquer laço com o homem. De qualquer forma, ele ainda o havia adotado, certo? Ele ainda sentia amor por ele. Era seu pai!

Mesmo que fosse distante e frio, Keith achou que era seu jeito.

Mas… vê-lo abraçando Lance na frente de tantas pessoas naquela noite, a forma como falou e descreveu momentos preciosos de pai e filho… Aquilo foi como receber um tapa e perceber o que era óbvio, mas que ele se recusava ver ou aceitar.

Não era por ser o filho adotado que era tratado tão friamente por Zarkon, era por ser justamente ele, Keith.

— QUAL A SUA RELAÇÃO COM AQUELE GAROTO? — Gritou ele, batendo a mão na mesa de Zarkon, olhando para o rosto impassível do homem em busca de qualquer resposta ou coisa que explicasse o que estava acontecendo.

— Isso não é da sua conta, Keith. Agora saia. Eu não vou repetir. — Falou cruzando as mãos em cima da mesa e na frente do rosto ao apoiar os cotovelos no tampo.

Keith deu um passo para trás, irritado. Sua cabeça estava nublada, não conseguia pensar, não conseguia se acalmar. Ele tinha perdido o controle.

— Por que você está trazendo ele para dentro de casa? O QUE EXATAMENTE VOCÊ PRETENDE? — Questionou elevando a voz mais uma vez e Zarkon se levantou da mesa.

A imagem imponente do homem se colocou sobre a luz, jogando Keith nas sombras. O garoto deu um passo hesitante para trás, os olhos arregalados quando a  mão grande e escura se ergueu acima de sua cabeça e virou o rosto apertando os olhos.

No entanto, a dor não veio. Keith prendeu a respiração e encarou o rosto de Zarkon pelo canto dos olhos, percebendo que ele o olhava com um aborrecimento tão grande, que beirava o desprezo.

Aquilo foi como se realmente o tivesse acertado com aquele golpe.

— A casa está cheia de repórteres e, apenas por isso, eu não vou punir você por sua falta de respeito. Mas saiba que se você erguer o tom de voz para mim de novo como fez agora, não será um tapa que receberá. — Avisou o homem abaixando a mão devagar e erguendo o queixo. — Agora saia da minha frente, antes que eu me arrependa. — Comandou apontando para a porta e Keith engoliu em seco saindo de perto do pai a passos duros e sentindo o coração disparado no peito.

Assim que conseguiu fugir dos repórteres depois do discurso, ele se viu marchando em busca do escritório do pai e de respostas. As coisas não poderiam ser como ele havia dito no palanque. Não podia ser verdade!

Seu pai e Lance? Não! Eles não eram próximos. Eles nem se conheciam! Lance o odiava e temia! Não! Não! Não!

Ele não pensou, assim como nunca pensava quando tinha a cabeça muito cheia de questões ou incertezas. Ele simplesmente havia invadido o escritório, assim que teve chance e começado a fazer perguntas. Ele tinha se exaltado com o silêncio do homem. Ele não pensava, ele queria saber e que o explicassem. Não podia ser daquele jeito!

Mas ele apenas conseguiu deixar Zarkon furioso.

E ele sabia, passou dos limites.

Ele nunca tinha se exaltado tanto, nunca tinha erguido a voz para seu pai ou coisa parecida. Nunca o havia respondido, mas ele não pôde evitar naquela situação! Seu mundo, no instante em que o homem começou a falar de seu passado com Lance, desmoronou como um castelo de blocos.

Guillotine (NOVO)Onde histórias criam vida. Descubra agora