S E I S.

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A concentração de Rúbia parecia ter-se dissipado desde a ligação que partilhara com André, na anterior noite.

O cardápio que tinha em sua posse não se manifestava capaz de auxiliar a morena a abstrair-se das palavras e imagem do jovem avançado português.

Mirava o grosso papel mas não lhe prestava qualquer atenção.

Um impensado e pesado suspiro escapou-lhe por entre os lábios.

Pousou a carta dos menus sobre a mesa do restaurante e olhou o relógio de pulso, observando que o mesmo apresentava alguns minutos após a uma da tarde.

Raúl já se encontrava atrasado, para grande aborrecimento da prima, esta que, por sua vez, prezava a pontualidade.

- Bia. - a inconfundível voz do advogado de profissão penetrou os ouvidos da jovem mulher, acompanhada de um rápido beijo nos cabelos médica veterinária.

- Ao contrário de outras pessoas, existem aquelas que exercem a sua profissão por conta de outrem e, por isso, têm de cumprir horários. - num discurso demarcado pela ironia, a de longos cabelos negros alfinetou, referenciando o facto do primo ser o CEO do escritório de advocacia - cujo cargo da presidência herdara do progenitor, após frequentar a licenciatura em Direito e o mestrado em Ciências Fiscais e Tributárias, na cidade de Madrid - e, em consequência de tal, não se via impelido a submeter-se a um rigoroso expediente.

O homem de vinte e cinco anos emitiu uma alta gargalhada que, de imediato, atraiu a atenção do público feminino presente, encantando-o por completo.

Raúl dirigiu um piscar de olho para uma jovem de cabelos ruivos - que se encontrava a algumas mesas de distância - proporcionando o habitual revirar de olhos, por parte de Rúbia, aquando daquelas manifestações.

- Tu não perdes uma. - a sevilhana repreendeu o primo que, mais uma vez, riu.

- Em minha defesa, foi ela iniciou o jogo da troca de olhares. Já o está a fazer desde que entrei no espaço. - intercedeu a favor das suas ações, visivelmente satisfeito com a atenção que despertava nas mulheres.

- Não achas que, já não tens idade para andar a brincar? Devias começar a pensar assentar e tentar um relacionamento sério. - Rúbia censurou a forma como o moreno abordava o público feminino e como, tão facilmente, o descartava, após aprazer os seus desígnios.

- Por favor, Bia, já basta a minha mãe. - notoriamente apoquentado pelas palavras da rapariga, o de olhos azuis procurou findar o tópico.

A incómoda interação entre eles fora interrompida pelo funcionário do estabelecimento de restauração que, educadamente, exigiu conhecer as escolhas dos Ruiz.

- Durante o tempo de espera, não foste capaz de decidir o que comer? - com o seu já típico timbre trocista, Raúl questionou Rúbia que não conteve um sopro. - Tu estás bem? Pareces desconcertada. - o semblante do advogado modificara por completo, ao notar a atípica quietude da veterinária. Deixava transparecer a sua preocupação pelo estado da prima, estes que - desde crianças e em virtude da proximidade de idades - partilhavam uma forte ligação.

Ao invés de conceder-lhe uma resposta imediata, a portadora do defeito genético da heterocromia optou por escolher um qualquer prato - dos muitos - que tinha à sua disposição, permitindo - daquela forma - que o empregado recolhesse ao interior do edifício e os deixasse a sós.

Errado | André Silva Onde histórias criam vida. Descubra agora