Q U A T O R Z E.

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- Bia! - Divertida, ainda que ligeiramente irritada pela atípica distração da irmã, Jade evocou, provocando na mais nova um sobressalto.

- O quê? - Simultaneamente confusa e acanhada, a médica veterinária proferiu, conduzindo o olhar para a prateleira na sua frente, procurando evitar o intenso olhar da Garcia mais velha. Censurava o seu irregular alheamento pois não queria de ter justificar-se perante ela. Ou ninguém. - Perdoa-me. Estava distraída. - Murmurou, segurando uma caixa de  pimenta preta e iniciando a leitura do rótulo, em outra tentativa de não corresponder ao contacto visual que a nutricionista persistia em fazer.

- Rúbia! - Deixando transparecer a sua cólera, a companheira de André Silva evocou pela sua, também, melhor amiga, retirando-lhe o objeto da mão e devolvendo-o ao seu recôndito. - Olha para mim. - Sem qualquer humor no seu tom de voz, a mulher grávida ordenou-lhe, finalmente, conseguindo com que as dissemelhantes órbitas da irmã colidissem com as verdes suas.

- Desculpa, eu... - A mãe de Valentina preparava-se para apresentar o seu mais sincero pedido de desculpa, contudo, foi impedida pela tia da filha.

- Não quero que peças perdão, Bia. Prefiro, antes, saber o que, realmente, se passa contigo. Este teu atípico estado de espírito está, seriamente, a preocupar-me. - Jade confessou, segurando as mãos da mais velha e acariciando os seus dedos. - É por causa do final de semana que a Tina vai aproveitar fora do conforto do seu lar ou, mais concretamente, longe de ti? - Com um sorriso, a de vinte e cinco primaveras deduziu, recebendo em troca um movimento positivo de cabeça.

Mas Rúbia não se encontrava preocupada com a aventura na natureza, proporcionada pela secção de escuteiros à qual a primogénita pertencia. Depositava a sua confiança em Letizia e Ruiz, os chefes e responsáveis pelos infantes no decorrer daquelas quarenta e oito horas e conhecia o à vontade que a sua menina possuía para com o casal de jovens adultos.
Equivocava a irmã. Mais uma vez. De tantas. Estava, genuinamente, fatigada. De enganar os outros e de se enganar a ela própria. Culpava o destino pela certeira pontaria de atravessar André nas estradas da vida das espanholas.
Não queria, de todo, permanecer na situação em que se encontrava. Nunca, antes, tinha sido tão complicado.

- Não tens de estar envolvida nesse desnecessário estado de ansiedade e tu sabes-o. A princesa adora os colegas e os seus chefes e estás ciente que, qualquer coisa que aconteça ou seja necessário, serás a primeira a saber e aquela a quem irão recorrer. Além disso, o local do acampamento não é tão longe e, por essa mesma razão, conseguirás ter acesso ao mesmo. Se algo ocorrer, o que não vai acontecer, prometo que vamos buscá-la e trazê-la para casa, em segurança. - Procurando atenuar a inquietação da portadora do defeito genético da heterocromia, a futura mãe garantiu, envolvendo-a num abraço, de imediato, alvo da correspondência desejada.

- Obrigado, Jade. - Por intermédio de um murmúrio, Rúbia expressou a sua genuína gratidão, manifestamente incapaz de fazer recuar a, cada vez maior, culpa que a consumia. - O que está em falta na lista de compras? - Retomando o objetivo que as guiara àquela tarde de compras, a especializada em saúde animal inquiriu analisando, minuciosamente, os ingredientes apresentados no papel, para aquele que seria o jantar de apresentação do avançado português aos Garcia e do anúncio da gravidez de Jade, e no qual a presença da veterinária era, segundo a anfitriã, indispensável.

Procederam ao adquirir dos restantes produtos idóneos à confecção dos pratos escolhidos para a especial refeição e partiram em direção ao parque de estacionamento exterior, onde a de longos cabelos negros auxiliou a namorada do lusitano na organização dos sacos na bagageira do automóvel.

Errado | André Silva Onde histórias criam vida. Descubra agora