Capítulo 4- Acusação e falsidade

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Mariane, Alfredo e eu estávamos caminhando na rua. Era uma manhã ensolarada de quinta-feira. Nossa mãe nos conduzia até o colégio naquele instante. Quando chegamos em frente ao portão da escola, Alfredo e eu nos despedimos de Mariane. Ela foi embora em seguida. Nós dois entramos naquele lugar deprimente. Outras crianças chegavam ao local também. Alfredo adentrou em uma sala e eu continuei andando no corredor até entrar na minha. Eu tomei assento em uma cadeira nos fundos da sala. Meus colegas que chegaram junto comigo passaram a conversar entre si. Eu era o único que estava calado naquele momento. Enquanto eles tagarelavam, eu pensava no programa de desenhos que eu deixei de assistir para estar naquela escola medíocre e isso me atormentava. Ir para aquele lugar era uma provação para mim e um desafio a ser superado dia após dia. Minha mãe achava que eu me tornaria mais civilizado se eu estudasse em uma escola cheia de pessoas brancas.

A professora Kaylane chegou à sala depois de alguns minutos. As outras crianças se sentaram em seus lugares. Logo, começamos a assistir à aula-merda daquela bruxa. Em um momento, eu escutei um murmúrio de vozes que pareciam vir de dentro do cômodo. Eu olhei para os lados e percebi que nenhum dos meus colegas estava cochichando; o som cessou de repente.

Às 9 horas e 30 minutos da manhã, a campa soou. O recreio havia começado. A professora bruxa e os meus coleguinhas saíram da sala. Eu fiquei sozinho no local. Passei a fazer desenhos no meu caderno.

De repente, eu escutei sussurros misteriosos que pareciam vir de fora da sala de aula. Logo após, escutei um barulho de porta que se abre. Olhei adiante e vi João, um dos meus colegas, que estava entrando no local. Nesse instante, estranhei o fato de o menino ter entrado na sala durante o recreio. O que ele quer aqui?

O menino abriu a mochila de Maicon. João retirou um caderno e uma caneta e se sentou na cadeira. Eu pensei: o que esse babaca está fazendo?

De repente, ele começou a riscar as folhas do caderno. Fiquei em choque quando o vir fazer isso. Aquele patife está cometendo um ato de vandalismo naquele momento. Por que ele faria isso? De repente, escutei uma voz profunda que disse: "Maicon vai me pagar por ter me batido".

Eu sempre considerei João um garoto idiota, mas nunca pensei que ele fosse um vândalo até então.

Depois de alguns minutos, o cretino guardou o caderno e a caneta na mochila. Em seguida, ele se levantou e foi embora da sala como se nada tivesse acontecido. Pensei que Maicon e João fossem grandes amigos, mas eu estava enganado.

O recreio acabou depois de alguns minutos. Todos os meus coleguinhas voltaram para a sala de aula. Entretanto, a professora Kaylane anda não havia regressado naquele momento. Às vezes, ela demorava cerca de 20 minutos após o fim do recreio para voltar à sala.

Maicon começou a conversar com João e outros dois meninos no canto da sala assim que entraram.

De repente, Maicon se afastou de seu grupo de amigos e se sentou em sua cadeira onde sua mochila está. O garoto abriu seu caderno e começou a ver as páginas riscadas. Maicon estava de costas para mim. Nesse momento, o menino me olhou e se levantou de ímpeto da cadeira. O garoto começou a andar em minha direção. Ele ainda segurava seu caderno. O semblante de Maicon estava igual ao de um louco enfurecido. Eu nunca o vi assim antes. Fiquei com medo naquele instante.

Maicon se aproximou de mim e falou em alta voz:

— Você riscou meu caderno, seu índio veado! Olha o que você fez, seu merda!

Ele me mostrou uma página riscada. As outras crianças pararam de conversar e uma multidão se ajuntou em volta de Maicon e eu. Em seguida, falei:

— Eu não fiz isso. Sou inocente.

— Mentira! O caderno não estava assim há minutos atrás. Você foi o único que ficou aqui durante o recreio. Você fez isso, seu veado! Eu devia te arrebentar agora! — disse Maicon

— Quem riscou teu caderno foi ele — eu disse.

Nesse momento, apontei meu dedo indicador para João. Maicon olhou surpreso para o garoto que eu indiquei. João falou:

— Ele está mentindo, Maicon. Eu nunca faria alguma coisa contra você. Nós somos amigos. Não acredite nesse índio estúpido. Ele quer destruir nossa amizade.

Eu fiquei impressionado com a frieza de João. O garoto fez aquele ato de vandalismo e ainda negou tudo. O mentiroso não titubeou e nem tremeu enquanto jogava a culpa em mim. João era um grande ator. Eu falei:

— Como você pode negar, João? Eu vi tudo.

Varias crianças começaram a me vaiar. Alguns até jogaram bolas de papel em mim. Maicon olhou para mim novamente e disse:

— Você vai escrever tudo o que havia nessas páginas riscadas, letra por letra.

Ele jogou o caderno em cima do braço da minha carteira. Eu falei:

— Eu não vou fazer o que você me mandou, pois não risquei seu caderno. João é quem deve fazer isso.

— Se você não fizer o que lhe mandei, eu... — disse Maicon

Nesse momento, Maicon cerrou o punho da sua mão direita e o aproximou de minha face como se estivesse a ponto de dar um soco.

Algumas outras crianças começaram a falar: "briga. briga". Olhei para João que estava dando um sorriso maquiavélico.

Droga! Eu fui acusado por algo que eu não fiz. João decidiu me transformar em um bode expiatório, afinal de contas, eu era o único que permanecia na sala de aula durante o recreio. Eu levei a culpa porque eu estava no lugar errado e na hora errada.

Nesse momento, a professora Kaylane entrou na sala para minha sorte e se deparou com aquela situação na qual eu me encontrava. As crianças olharam para ela. A Sra. Kaylane perguntou:

— O que está acontecendo aqui?

— Hugo riscou meu caderno. Quero que ele pague por isso — disse Maicon.

Kaylane olhou para mim e perguntou:

— Você fez isso?

— Eu não fiz isso. Quem riscou o caderno foi João. Sou inocente — falei.

— Esse bicho do mato está mentindo. Ele é o culpado — disse João.

A professora bruxa disse:

— Hugo, o que você fez é muito feio. Como você pode fazer uma barbaridade como essa?

— Mas eu não fiz isso — falei.

Ela olhou para os meus colegas e falou:

— Crianças, não o levem a mal. O que se pode esperar de um índio? Pessoas da espécie dele são selvagens por natureza. Ele não é uma pessoa civilizada.

— Hugo devia ser expulso da nossa escola. Aqui não é lugar para esse selvagem — disse uma menina que estava no grupinho.

— Eu quero que vocês voltem para seus lugares.

Em seguida, a professora olhou para Maicon e falou:

— Aqui não é ringue de boxe. Se vocês querem brigar, façam isso fora da escola.

As crianças se sentaram em seus lugares nesse instante. Maicon me olhou com ódio durante a maior parte do tempo.

Naquele dia, eu aprendi uma coisa importante que eu levaria comigo por toda a minha vida: a maioria dos brasileiros é fácil de ser enganada por natureza.

Maicon nunca investigou para saber se eu havia feito aquilo. O idiota acusou o primeiro que ele viu na frente. Maicon era um Neandertal nato. Eu estava cercado de pessoas burras naquele colégio de merda.

Eles não tentavam ver as coisas por outro ângulo e procurar a verdade. Os otários sempre se deixavam enganar pelas aparências. João me ensinou a ser falso e dissimulado naquele dia.

O  Segredo de HugoOnde histórias criam vida. Descubra agora