Por que eu vivo?

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Me colocaram aqui.

Surgi em meio ao caos das palavras, coisas e ações. Para tudo isso, eles deram o nome de vida.

Caminhei pela espiral das cores e formas, sorrisos falsos e incertezas, descobri que muito do que fiz já havia sido feito em algum lugar e me desapontei por não existir nada de novo ou empolgante no mundo.

Sentei no tronco de uma árvore que já não estava mais lá e senti o vento. Perguntei ao vento o sentido das coisas e ele me respondeu com o som das folhas sendo arrastadas para longe.

Não pedi para estar aqui, mas agora que estou, já não posso recuar. Não posso dizer que não vou jogar esse jogo, ou que vou adiantar o filme para os minutos finais, porém gostaria de saber porque desistir não é uma escolha.

Por que eu vivo?

Não encontro uma razão para a vida.

Nenhuma.

Quando penso no que me motiva a seguir em frente, nada aparece em resposta. É um grande, silencioso e branco mar de nada.

Não tem nada lá.

Então por que levanto da cama todos os dias pela manhã? Por que continuo repetindo uma série de ações que não me levam a lugar nenhum? Por que ainda persiste meu vício em rotina, uma rotina que não leva a nada e nem traz nada para ninguém?
Por que a sinfonia ainda toca em minha cabeça, rápida e explosiva, insistindo que eu vá?

Não sei para onde vou, já não tenho certeza do que eu fiz. Se é que fiz alguma coisa.

O som ligeiro do piano pode ser ouvido ao longe.

Outros me colocaram aqui, mas se esqueceram de pedir pra mim se eu queria. E se pediram, não explicaram o que eu devia fazer, ou porquê.

Triste som do piano, toca ligeiro no final. Como eu queria ser música, para existir na mente e tocar o coração das pessoas, perfeita, imortal.

Porém, estou mais para um som que repete, sem formar melodia e sem ter um fim. Um alarme barulhento que todos querem desligar.

Eu quero ser música.

É um ciclo que não me leva pra lugar nenhum e não consigo sair. O tempo corre e eu não faço nada.

Nada.

Não faço nada, nem sirvo pra nada, nem sei se devo fazer alguma coisa.

Assim, não sei se existo. Como pode existir uma pessoa que nada faz, pra nada serve e que nada sonha?

Pessoa perdida na estrada.

Só tenho o que invento, mas não sei se é alguma coisa.

Inútil eu, que nada acrescenta para os outros. Só consome, devora, queima. Como um fogo invisível, afeto o ecossistema equilibrado da sociedade, parasitando aqueles que sabem o que querem e sabem para onde vão.

Estou parasitando sonhos alheios, na ausência de um sonho que só eu possa sonhar.

Sou um alarme de alerta, soando uma única palavra: perigo. Um som alto, alertando a presença da chama invisível que devora.

Mas eu queria ser música.

Talvez.

Não tenho certeza.

Não tenho certeza de nada.

Dilemas, Problemas e Caixas - um livro estranho sobre qualquer coisaOnde histórias criam vida. Descubra agora