É tanto amor por esse menino que nem cabe no peito!
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Capítulo 1
Javier.
2000.
6 anos/ depois de julho.
Espanha.
Eu gostava muito do meu pai, da forma como sorria para mim, de como me olhava quando me buscava na escolinha ou das duas batidinhas que dava no sofá quando queria que eu me sentasse ao seu lado no domingo para assistir a um filme. Amava como ele era disposto, como jogava bola comigo depois do trabalho mesmo que estivesse cansado, de como ele costumava trabalhar na carcaça que achou no lixo e que depois de muito trabalho se tornou uma bicicleta.
Eu amava o meu pai, amava que ele tivesse pintado de preto os pedais cor de rosa que havia encontrado em um terreno baldio a caminho do trabalho, amava que ele tivesse cortado tiras e pendurado em cada lado do guidão, amava como ele havia pintado o quadro dela, com chamas vermelhas porque ele desenhava bem pra caramba, amava tudo o que ele criava, amava tudo o que ele construía, eu amava ele e ele morreu.
E eu estava pensando nisso, pensando no quanto sentia falta do meu pai, porque naquele momento, Miguel, o novo marido da minha mãe, estava apontando o dedo no meu rosto e me dizendo o quanto eu era imprestável, o quanto de tempo que eu perdia alisando "aquele pedaço de merda" que aliás era a única coisa que meu pai me deixou, além da facilidade que eu tinha para desenhar.
Eu ergui meus olhos para o homem a minha frente, sentindo vontade de gritar para o céu e suplicar para que meu pai, Pablo, voltasse ou que ao menos ele tocasse o coração — ou a bunda — do homem a minha frente porque eu não conseguia suportá-lo e a forma como ele me chamava de menino só me fazia sentir ainda mais falta do que eu mais amava no meu pai, que era exatamente a forma como ele me chamava.
Cariño.
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Javier.
2002.
7 anos/Antes de julho.
Espanha.
Eu me sentei em um canto da sacada do apartamento da patroa da minha mãe. Desde que me lembrava, ia junto ao trabalho dela, e desde que lembrava também, era o mesmo lugar, a mesma patroa, as mesmas coisas. Eu adorava Elisabeth, a forma como ela me tratava, como insistia que eu andasse pelos cômodos do apartamento mesmo que minha mãe ameaçasse cortar meus dedos se eu saísse do lugar durante as quatro horas que ela levava limpando.
Mas, sobretudo, eu adorava que ela era professora e que falava dois idiomas, a forma como Beth falava tão bem o nosso idioma, espanhol, mesmo que fosse brasileira. Eu sempre amei isso nela, até que minha mãe se casou com Miguel e eu o ouvi falar português pela primeira vez. Ele insistia que eu repetisse as palavras dezenas e dezenas de vezes, exigindo que eu decorasse, assim como fazia com minha mãe, que só falava espanhol e então eu me perguntava por que é que ele não havia ficado no Brasil e nos deixado em paz se ele gostava tanto de lá?
Eu impulsionei meu quadril usando os pulsos contra o piso, erguendo meu corpo para cima, então me apoiei na grade branca da sacada, olhando a vista daquele bairro de rico, pensando se talvez um dia eu teria uma vida daquela. Poder tomar um banho quente de verdade, usar um perfume gostoso, ter uma televisão no meu quarto, poder abrir a geladeira e poder escolher o que comer.
Opções.
Ao pensar em comida, meu estômago ronca, apesar de que fazia pouco tempo que havíamos chegado e eu teria almoçado de verdade se não tivesse deixando a mesa e corrido para os fundos da casa para chorar depois de Miguel encher meus ouvidos com tantas informações desnecessárias sobre o Brasil.

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JAVIER/ Amazon
RomanceQuando Javier, o menino novo da turma, entrou pela porta, Milena se viu encantada pelo garoto extraordinário, envergonhado, perdido e falando outro idioma. Em um par de dias, os dois se tornaram melhores amigos e conforme cresciam, o sentimento o fa...