TEMA: Carnaval
Zé sentia o frio na barriga se intensificando à medida que se aproximava de São Paulo. O mapa mostrava que restavam 42 minutos até a rodoviária e perceber que faltava pouco fez suas entranhas revirarem mais ainda.
"Isso é uma loucura" — pensou enquanto observava os prédios mais altos que vira na vida, margeados por um rio que ficava ao lado da avenida em que o ônibus passava.
"Fica calmo, cara!" — pensou. Curtindo esse Momento de Lara M. começou a tocar no Spotify. Batendo o pé no chão do ônibus, no ritmo da música pop farofa, Zé respirou fundo e fechou os olhos.
Em poucos minutos se encontraria pessoalmente com Cláudio pela primeira vez.
Cláudio surgiu no Twitter em uma noite aleatória de dezembro do ano anterior. Zé comentou como a última temporada de Survivor tinha sido ruim e um cara muito bonito o respondeu, falando que tinha gostado, mas que tinha sido a primeira temporada que ele assistira do reality show. Como havia 35 temporadas, Zé indicou a esse rapaz algumas outras edições específicas que ele gostava muito. Cláudio começou a assistir ao que foi indicado por Zé e comentar os episódios com ele pelo Twitter. Em poucos dias trocaram o WhatsApp e a conversa evoluiu organicamente de episódios de Survivor para a vida um do outro.
Cláudio morava em São Paulo e amava a cidade. Trabalhava em uma multinacional, acordava cedo, pegava metrô para o trampo, ficava até tarde da noite, do trabalho ia para academia, depois pegava o metrô para casa. Tinha uma vida com ritmo alucinante. Nos finais de semana ia para as baladas, beijava muitos caras, às vezes levava alguns para seu pequeno apartamento, às vezes dormia na casa de outros. Tinha muitos amigos gays. Usava aplicativos para sexo quando estava entediado. Segundo Claudio, transar não era difícil para ele. São Paulo oferecia homens de todos os tipos, cores e sabores. Cláudio começou a falar sobre as aventuras dele, deixando Zé excitado com as histórias. Os diálogos começavam com um "olha quem estou conversando no app hoje" seguido por uma foto de um cara que deixava Zé louco. Cláudio sumia por umas três ou quatro horas e voltava com um "menino, trepei gostoso demais, olha só uma foto do cacete dele". Zé se masturbou tanto com as histórias de Cláudio...
A conversa só não era agradável quando o amigo perguntava como estava a vida de Zé.
Ele vivia numa cidade muito pequena no interior de Minas Gerais chamada Piumhi. Filho de fazendeiro, após terminar o terceiro ano, ficou cuidando com o pai da fazenda de café. Ele tinha jeito nos negócios e se dava muito bem com seu pai. Precisava fazer um curso de administração, mas seu progenitor, com um pensamento retrógrado, achava que ele conseguia manter a fazenda sem precisar dessa "bobagem de faculdade", o que fazia Zé adiar sua tentativa de começar um curso superior.
Por viver em uma cidade pequena e ser filho de um homem conhecido e influente na cidade, o rapaz tinha medo de sair do armário e ser expulso de casa, por isso ficava com mulheres com uma frequência acima do que ele desejava. Pelo menos uma vez a cada dois meses era necessário pegar uma mulher no PTC, que era um dos únicos lugares que os jovens de Piumhi tinham para se divertir.
"Mas você já tem 27 anos, está na hora de arrumar uma mulher e ter filhos", Zé ouvia de algumas pessoas de sua família volta e meia quando almoçava na casa de sua avó. "Seu irmão mais velho na sua idade já estava casado, com um filho e outro a caminho" comentava sua mãe que não conseguia esconder o desejo de ter mais netos. Isso o irritava muito. Ele jamais se casaria ou teria filhos, no máximo pegaria uma mulher na boate e transaria com uma ou outra, mas se casar e viver uma vida de mais mentiras não era o que o estava em seus planos. Zé já estava fazendo muito em não se assumir ou não ficar com outro cara na cidade para que ninguém descobrisse que o filho de João e Ana Vilela e irmão de Edgar era viado.
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Contos LGBT
Short StoryCapa bem preguiçosa mesmo Aqui você encontra todos os contos criados por mim que foram publicados no LGBTemas