CAPÍTULO NOVE

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ACORDEI COM ÁGUA FRIA E A VOZ SUAVE DE UMA MULHER.

- Você está bem - ela dizia. - Você vai ficar bem.

Não sei quem ela pensava que estava enganando com aquela doce besteira, mas com certeza não era a mim.

Eu a deixei levar a toalha mais uma vez até meu rosto, saboreando seu calor conforme ela se aproximava. Ela tinha cheiro de alecrim e coisas do passado. Por um instante, só um, sua mão descansou contra a minha e foi mais do que eu poderia suportar.

Eu não estava em casa e essa mulher não era minha mãe. Comecei a engasgar, desesperado para manter tudo dentro de mim. Não conseguia chorar, não na frente dela nem de nenhum dos outros adultos. Não lhes daria esse prazer.

- Você ainda está com dor?

O único motivo pelo qual abri meus olhos foi porque ela os abriu. Um por vez, brilhando uma luz intensa em cada um. Tentei levantar as mãos para protegê-los, mas eles tinham me amarrado com tiras de velcro. Era inútil lutar contra as amarras.

A mulher estalou a língua e deu um passo para trás, levando consigo a fragrância floral. O cheiro de antisséptico e peróxido inundava o ar e eu sabia exatamente onde estava.

Os sons da enfermaria de Thurmond surgiam e desapareciam em ondas desiguais. Algum garoto chorando de dor, botas batendo contra o chão de piso branco, o ranger de cadeiras de rodas... Senti como se estivesse em um túnel, com a orelha contra o chão, escutando o murmúrio dos carros passando embaixo de mim.

- Isaac?

A mulher vestia avental azul e um casaco branco. Com sua pele pálida e cabelo loiro branco, ela quase desaparecia na fina cortina que fora puxada ao redor da minha cama. Ela me pegou olhando e deu um belo e largo sorriso.

Ela era a médica mais jovem que eu já vira em Thurmond - embora eu pudesse contar numa mão minhas viagens à enfermaria. Eu fui para lá uma vez com diarreia e desidratação, depois do que Rob chamou de meu Espetáculo de Vômito das Tripas, e outra por causa de um pulso torcido. Ambas as vezes, eu me senti muito pior depois de ser apalpado por duas mãos enrugadas do que me sentia antes de chegar. Nada cura um resfriado mais rápido do que a ideia de ser examinado por um velho pervertido, usando perfume de álcool e sabonete de limão nas mãos.

Essa mulher - ela era irreal. Tudo a respeito dela.

- Meu nome é dra. Begbie. Sou voluntária da Leda Corporation.

Eu mexi a cabeça, olhando para a insígnia de cisne dourada no bolso de seu casaco.

Ela se inclinou mais perto.

- Somos uma empresa que faz pesquisas e envia médicos para ajudar a cuidar de vocês nos acampamentos. Se você se sentir mais confortável, pode me chamar de Cate e deixar de lado essa coisa de doutora.

Claro que eu me sentia. Olhei para a mão que ela estendeu na minha direção. Um silêncio pairou entre nós, pontuado pelo pulsar na minha cabeça. Após um instante constrangedor, dra. Begbie enfiou a mão de volta no bolso de seu jaleco, mas não antes de passear sobre a amarra que prendia minha mão esquerda à grade da cama.

- Você sabe por que está aqui, Isaac? Você se lembra do que aconteceu?

Antes ou depois da Torre tentar fritar meu cérebro? Mas eu não consegui falar em voz alta. Quando se tratava de adultos, era melhor não falar. Eles tinham uma forma de escutar uma coisa e processá-la como se fosse outra. Não havia por que dar motivo para machucarem você.

Fazia oito meses desde a última vez em que eu usara minha voz. Não sabia se me lembrava de como fazê-lo.

A doutora, de alguma forma, adivinhou a pergunta que estava na ponta da minha língua.

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