Realidade

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Acordo. O quarto ainda está escuro.
Henrique está deitado com a cabeça escorada em uma das mãos. Está traçando os contornos do meu rosto suavemente, quase sem me tocar. Está perto o bastante para beijar, então tomo a iniciativa. Não está mais tão quente.

—Oi.

— Oi — beijo-o novamente.

— Você não tem um gosto muito bom de manhã.

Afasto-me dele e cubro a boca.

— Recuperou-se o suficiente para ser malcriado. Gostava mais de você quando estava fraco.

Dou um beijo em sua cabeça. Ele levanta o rosto e alcança minha boca.

– Não está com um gosto muito bom também.

— Que tal escovarmos os dentes?

Corro para o banheiro. Tenho uma escova de dente e outras coisas na bolsa por causa do concerto. Escovo meus dentes rápido. Meu cabelo está um horror, mas não tenho tempo para ele. Encontro a escova do Henrique em um estojo de barbear na pia, coloco a pasta de dentes, encho um copo de água, molho um pano em água morna, torço e volto para perto dele.

Encontro-o desconectando o tubo que vai para o estômago. Fico parada com o pano pingando enquanto ele termina.

— Você faz isso sozinho?

— Fiz isso metade da minha vida — puxa o lençol para cobrir a porta de plástico no estômago. — Antes eu tinha que enfiar um tubo pelo nariz até a garganta. Isso aqui é fácil.

Vou até ele e ponho a escova em sua boca.

Ele a tira da minha mão.

— Não estou paralisado — aperta um botão e a cabeceira da cama levanta até que ele esteja sentado. Leva um tempo enorme escovando os dentes. — Onde devo cuspir?

Pego um copo plástico na mesinha e entrego a ele. Ele me devolve a escova. Vou ao banheiro para enxaguá-la, assim não preciso vê-lo cuspindo. Não seria muito estimulante. O furo no estômago também não é. Nem a seringa colada ao peito.

Quando volto, ele está enchendo a boca com um último gole de água limpa. Pego o pano de lavar — que bom que ainda está morno — e limpo seu rosto. Devagar. Isto é muito excitante. Compensa todo o resto.

— Isso é muito gostoso.

Desço até o pescoço, passo em um dos ombros.

— Sobre aquele banho de esponja...

Ele me puxa e nossos lábios se juntam. Consigo subir na cama sem interromper o beijo. A cabeceira da cama abaixa, lentamente, enquanto sua língua entra com suavidade em minha boca.

Estou deitada meio de lado, com metade do corpo em cima dele. Tento ser cuidadosa. Ele ainda está tão fraco, e eu não quero bater naquela seringa que fica conectada à veia o tempo todo através de uma porta oculta sob a pele.

— Você é muito bom em dar amassos em camas de hospital.

— Vantagem do anfitrião — sua boca prende a minha outra vez. Sua mão entra debaixo da blusa solta que estou vestindo e acaricia minhas costas. Não dormi de sutiã. Saboreio a sensação do toque dele em minha pele, beijo-o com mais força, deito de costas sem cair da cama e fico esperando-o.

Ele deita de lado e faz carinho na minha barriga. Fecho os olhos... Cada parte do meu corpo está concentrada em seus dedos ternos e vibrantes.

— Você morreria se fizéssemos isso hoje?

A Bela e a FeraOnde histórias criam vida. Descubra agora