Capítulo 13

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Conde Pwenlly

O maldito verme está sorrindo. Na minha presença. Como se fôssemos iguais, esquecendo-se que não é digno sequer de usufruir do mesmo ar que um Pwenlly. Não bastasse o ultraje de desafiar-me vindo até aqui, agora pensa que poderá me enfrentar, sustentando o olhar fixo no meu, ao invés de encarar o chão.

Ele não quer se curvar. Essa escória nascida para o estábulo! Pois eu farei que se dobre, que se quebre diante de mim.

— Veio pedir para reassumir seu cargo de cavalariço nas minhas terras? — indago sarcasticamente, domando o tom da minha voz, para que saia sóbria. — Receio não poder lhe oferecer nenhuma ocupação nesta casa, faz alguns anos que substituí meu mordomo por um mais eficiente e criterioso com a contratação da criadagem.

— Não careço que se preocupe com as minhas finanças, milorde. — o impertinente diz com tom provocador. — Melhor preocupar-se com as suas.

Ele sabe.

Mordo o interior da boca, porque jamais permitirei demostrar fraqueza diante de alguém tão insignificante. Qualquer reação do meu corpo antes de ser expressa deve passar pelo meu crivo. Sempre foi assim, e continuará a ser. Enquanto penso em como ele pode ter conseguido a informação, me levanto e vou até o aparador me servir de mais um copo. Como descobriu o que aconteceu?

Não lhe sirvo da minha bebida. Uma gota do meu pior brandy vale mais que toda sua existência miserável. O cavalariço pode ter coberto a própria carcaça com roupas finas, contudo, nunca poderá mudar sua origem, a imutabilidade de sua pouca importância.

Homens emergentes como ele são o motivo de eu desprezar esta geração fraca. Culpa do pulso frouxo de alguns nobres com visões inovadoras e estúpidas, que hesitam ao impor os limites aos inferiores, negligenciando nossos direitos de nascença. Vestem-se como nós, compram propriedades circunvizinhas às nossas, porém, não passam de ignorantes farsantes. Meu pai não seria benevolente se estivesse vivo, vendo a forma indolente como esse nada me encara neste exato instante. Eu já o vi esfolar criados por menos. Muito menos.

— Ordem e tradição são os pilares do futuro glorioso da Inglaterra. — ele proclamava nos poucos segundos de silêncio que se antecediam ao estalo do chicote e aos gritos de dor que o velho lacaio rugia. — É nosso dever para com o Rei. — ele parou de bater momentaneamente e virou-se para mim, estendendo a mão. — Cumpra o seu dever, Hector.

Lembro-me perfeitamente do primeiro dia em que cumpri meu dever. Orgulho saltava dos olhos de Paul Pwenlly. Eu era seu herdeiro e não iria falhar em minhas obrigações. Meninos de doze anos fracotes e tolos teriam recuado, no entanto, não eu. Não diante do meu pai. Os primeiros gritos fizeram meu estômago revirar, mas não deixei que ninguém soubesse. Em pouco tempo, aprendi a me concentrar na tarefa, mantendo um ritmo regular, independente dos protestos do verme a quem eu castigava. Eu sempre considerei o ato de implorar a atitude mais deplorável do mundo civilizado. Desta feita, eu batia ainda mais forte quando ouvia "por favor", "clemência".

— Muito bem, meu filho. — meu pai elogiou, concedendo-me sua aprovação.

Um movimento sutil me afasta de minhas lembranças e me traz de volta ao presente.

— Preocupação é um sentimento inerente às camadas mais baixas, inseto. — digo, retomando o assunto. — Você certamente pode atestar tal fato. Afinal, ganhou seu sustento limpando estrume nas minhas baias para que sua medíocre família não morresse de fome.

Uma risada baixa escapa de seus lábios. Quero matá-lo para que o odioso som cesse.

— E, entretanto, acabei me tornando mais rico que o senhor jamais chegará a ser.

O retorno de Henrique HutlerOnde histórias criam vida. Descubra agora