Admirável chip novo- PARTE II

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       Eu não sabia se respondia e muito menos o que falar para uma desconhecida. Meus pais me ensinaram a não falar com estranhos, mas passados alguns segundos olhando para a tela já não a via como uma estranha, apenas estava com uma estranha sensação de que ela poderia ser minha esperança, algo novo, ou melhor, alguém nova. Então respondi ironicamente:

Eu: Sim, as pessoas de Brasília são frias e moram perto dos políticos?

Fiquei esperando a resposta, mas a cada minuto que aguardava, um pedaço da minha crença se tornava ilusão. Parece pouco, porém só piorou meu estado mental.

Me sentia perdida, minha mãe e meu namorado sempre foram as placas que me orientavam para onde seguir, mas nesse momento tão decisivo, eles me levavam a um labirinto e não mais a um destino.

Finalmente levantei da cama para encarar mais um capítulo da ruína que minha família se fez, ou quem sabe sempre foi e não percebi. Meus pais estavam na mesa tomando café-da-manhã, ainda pareciam se importar em manter a família unida nas refeições, porém cada um estava sentado no canto e no lado oposto da mesa retangular, logo sentei no centro, no centro esquerdo que estava mais próximo de meu pai.

"Meu amor, fala o que você quer comer para a empregada", disse minha mãe como se eu tivesse 5 anos, mas isso já se habituava a todos da casa.

"Eu estava pensando em comer algo doce hoje...faz tempo que não como um chocolate"

"Mas filha, você pode engordar, ter estria, ou uma espinha aparecer, é melhor comer essas castanhas, ou...pão integral. Vai Jussara, pegar um prato para ela", determina Paula, alternado o tom entre eu e a empregada.

Meu pai olha para minha mãe, sem emitir uma palavra, pois seu olhar deixa transparente o que queria dizer.

"O que foi?! Eu ainda sou mãe dela, e provavelmente vou continuar com ela perto de mim"

"Você diz filha, mas deve dizer para si bebê, pois a trata como tal" , diz meu pai sem tirar os olhos do jornal digital.

"Isso é carinho"

"Isso é superproteção"

" Quem é você para me dizer isso? "

" A pessoa que já julgou vários casos familiares, e posso ainda posso falar que o que você faz com ela é alienação parental"

"Chega Marco, cansei. Vem filha"

Levantei com o pão integral na mão e o celular no bolso, fui atrás de minha mãe. Quando saí de meu prédio senti o calor que é morar no Nordeste por alguns segundos, afinal, ao entrar no carro o ar condicionado me proibiu de saber como é isso, e ao chegar ao shopping, ar condicionado novamente. Por muito tempo minha vida foi dessa forma, todavia, não só pelo ar condicionado de todos lugares que pisava, mas por tudo, vivia nessa bolha que impossibilitava conhecer outras realidades e situações.

Eu não gosto de lembrar das idas ao shopping, naquele lugar ficava mais visível o tipo de pessoa das quais eu convivo, do mesmo ou maior nível econômico. Foi um dia importante, mesmo que no final de tudo as coisas acabaram igualmente.

Ao chegar na loja de roupas vi uma blusa preta com uma estampa em preto e branco da ponte de São-Francisco. Vesti, e talvez pela primeira vez quando vesti uma roupa me senti parte dela, como se ela fosse feita milimetricamente a mim, representando o que sou, sendo assim a peguei e deixei que minha mãe escolhesse quantas roupas quisesse para mim, pois aquela blusa trazia a minha boca o mesmo gosto que senti pela manhã, uma esperança ilusória. Após isso, deixei que minha mãe palpitasse sobre todas as outras coisas que ela gostaria que eu vestisse. Porém tudo acabou quando chegamos ao caixa e estávamos passando as roupas:

Por Um InstanteOnde histórias criam vida. Descubra agora