Capítulo 8

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As muralhas não te protegem, te isolam.

Richard Bach

O Tenente

Ele vai voltar, você sabe disso!

Dei um passo hesitante em direção ao quarto de Amber e regredi no mesmo instante. Eu não tinha o direito de invadir ainda mais sua privacidade, mas me sentia compelido a ficar. Não conseguiria partir ciente de que a qualquer momento aquele desgraçado poderia vir a fazer algum mal a ela. O simples pensamento gerava em mim uma repulsa cortante.

Eu tinha visto nos olhos daquele velho a sensação de poder sendo drenada lentamente. Havia vigor em suas pupilas, ele queria revidar. Queria desferir uma ordem ao seu capanga. Queria me ensinar a não cruzar seu caminho. E eu, mais que tudo, queria que ele ao menos tentasse. Precisava da oportunidade, de apenas um motivo para quebrá-lo de dentro para fora. Mas como um animal traiçoeiro, ele preferiu aguardar o momento certo para contra-atacar e eu estaria esperando por ele.

Talvez Amber não tivesse ciência do perigo que corria, mas eu tinha. E aquilo era o suficiente para me colocar em sua defesa. Afinal, eu devia a minha vida a ela e poderia apostar que naquele momento ela reconsiderava todas as opções, protegida dos meus olhos atrás da porta de seu quarto.

Escorei-me na parede da cozinha que tinha um tom azul-celeste vivo. Torci os lábios ao constatar que ela foi extremamente literal quando disse que cada cômodo da casa era tingido de uma cor diferente.

Naquele ambiente, diferente da sala, o azul predominava. Uma bancada pequena de tampo branco e corpo azulado, em um tom mais claro que a parede, ficava disposta no canto da cozinha. Um conjunto de quatro quadros mostrava uma vista para uma praia ensolarada e desconhecida que deixava o ambiente mais calmo. Os itens da cozinha também seguiam a linha das tonalidades azuis e eu deveria admitir, era relaxante olhar para eles.

Meus olhos recaíram sobre o piso, que como na sala, era o único que destoava da cor escolhida para o cômodo e encontrei um par pequeno de olhos pretos cravados em mim. O cão não rosnava, assustadoramente também não se movia. Parecia me vigiar como um sentinela.

Amber abriu a porta de seu quarto em um rompante. Ela ainda estava agarrada ao casaco que cobria grande parte de seu corpo. Seus lábios discretamente crispados me indicavam que estava nervosa. Ela segurava uma toalha nas mãos e quando deu um passo em minha direção, eu senti que um batalhão marchava, prestes a passar por cima de mim.

— Já que decidiu ficar — ergueu as sobrancelhas — vai precisar de outro banho. — vociferou irritadiça. — Você ficou desmaiado por dois dias.

— Obrigado. — Tentei soar gentil enquanto retirava a toalha de suas mãos, mas minha voz surgiu fria como uma pedra de gelo.

— Fique à vontade. — Virou as costas, prestes a sair e fugir mais uma vez do meu campo de visão.

Uma necessidade incessante de mantê-la ali, sob meus olhos, começou a incendiar minha garganta e quando me dei conta, já havia começado um assunto que eu não tinha a intenção de continuar.

— Você organizou isso sozinha? — Ela retornou os olhos brilhantes em minha direção mais uma vez. Ponderou a resposta por alguns segundos e quando cruzou os braços sobre o peito eu soube que tinha vencido. Ela continuaria ali, comigo.

— Gastei todas as minhas economias para deixar essa casa com um toque que me fizesse sentir em... casa. Quer dizer... — Olhou de um lado a outro. — Em um lar de verdade. E escolhi cada detalhe. — Ergueu as sobrancelhas, tentando parecer desinteressada, mas pude ver o cintilar sobre suas íris claras. Ela tinha orgulho de sua obra, e não era para menos.

O Tenente - Um espião, um amor, uma escolhaOnde histórias criam vida. Descubra agora