October

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É Outubro mas o inverno parece não ter nos abandonado ainda.

Olhando para além da paisagem na sacada, Sarah se remexe desconfortável na cadeira de descanso. Tem uma sensação que incomoda em estômago já fazem alguns dias, uma queimação chata, quase um sentimento de que algo iria acontecer. Dizem que os bebês nascem apenas com seus instintos primitivos, o necessário para garantir sua sobrevivência, e o resto é socialmente construído e aprendido.

Seria esse um daqueles instintos?

Sarila, o cãozinho de pelagem clara, rodeia ansiosa para pular em seu colo, implorando por atenção. Ela tem aquele sorrisinho bobo, sorriso de cachorro claro, mas ainda sim um sorriso, de quem está louca para ganhar um carinho.

- Quem é o bebê da mamãe? - pede Sarah manhosa, típico de uma grande babona. 

Ela pula sem pensar duas vezes, aconchegando-se em seu colo como uma perfeita bolinha de pelos cinza e branco.

Era fim de tarde, todo o condomínio curtia a quadra poliesportiva enquanto os últimos raios de sol saiam no horizonte. Mães conversavam e deixavam as crianças andarem de bicicleta e brincarem nos parquinhos instalados ao pé de cada prédio, esporadicamente um e outro carro chegava, mas sempre de vidros baixados, distribuindo vários sorrisos e buzinas de cumprimento.

Uma cena típica de filme dos anos 90, algo romântico e extremamente apelativo ao sentimento de pertencimento a algo.

Morar ali era como viver no paraíso, os vizinhos são companheiros e gentis, o lugar é lindo e sempre bem cuidado, faziam-se festas para todas as datas comemorativas do ano, uma pequena comunidade muito unida. Quando Sarah comprou o apartamento 504, nunca imaginou que estaria tão satisfeita quanto agora, cada detalhe do projeto pensado com exigência e carinho, combinando com um gosto moderno e atual.

Porém sempre tem algo que nos faz falta, e esse algo tem nome, sobrenome e endereço. Seu ex-namorado, Augusto. Eles eram o típico estereótipo de higschool sweethearts, o casal que se conhece no ensino fundamental e segue junto para sempre, só que o para sempre deles teve um fim. Começaram a namorar na oitava série, agora depois de formados e com dez anos de relacionamento, cada um seguiu para lados opostos. A aquarela que o céu forma lembrava Sarah dos milhares de momentos que ambos passaram juntos naquela mesma sacada nos infinitos dias de verão.

Ela se sentia tão só sem ele, a vida nunca pareceu tão linda quanto no dia em que começaram a se conhecer, e jamais pareceu tão feia quanto na hora em que se despediram.

Quem era Sarah sem Augusto?

Não saberia responder. Nunca houve Augusto sem Sarah, nem vice-versa.

Sarila levantou a pequena cabeça, com os olhos brilhantes apenas observando o rosto magro da sua amada dona. Ela parecia saber tudo que Sarah sentia, no exato momento em que suas emoções viravam. 

Com aquele algo conflitando dentro de si, Sarah pega o celular e confere seu perfil nas redes sociais mais uma vez, ainda tinha o status de relacionamento sério nele. Aquilo servia para criar uma angústia estúpida dentro dela.

Com os contatos aberto, busca o nome dele, ainda escrito como o apelidara no dia em que salvara o número dez anos atrás, e prestes à efetuar a ligação algo tira seu foco. Um grito alto ecoou por todo o condomínio, parecendo vir dos portões da frente, foi impossível para ela não correr para a outra sacada a fim de verificar do que se tratava aquilo. 

No chão de calçamento havia uma mulher caída no chão, bem em frente ao portão de entrada do bloco E, ela gritava e se retorcia enquanto as pessoas se acumulavam aos montes para poderem vê-la. Sem pensar duas vezes, Sarah saiu apartamento a fora, tomando as escadas para chegar até o térreo o mais rápido possível.

Para sempre Sarah - A zombie novel ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora