Hurted

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A maior vontade de Sahar era a de saltar da cama e gritar o mais alto que podia, exigir respostas, mas o que isso traria pra ela? Vicente só precisava acertá-la com um único soco para deixá-la nocauteada.

Ela continua imóvel até ouvi-los desistir e sair do quarto. No mesmo instante que o barulho de porta se fechando ecoa, Sarah se senta, tirando a chave de dentro da calcinha e aguardando-a até depois da ausência de qualquer barulho vindo de dentro do quarto deles.

Pegando a mochila da mesa da cozinha, ela a sente pesada demais, eles haviam colocado a comida da casa dentro dela e aparentemente planejavam deixá-la sem nada também. A alma de Sarah se remoeu de rancor, e o diabinho que sussurrava em seu ouvido finalmente havia vencido a batalha contra o anjinho. Mentalmente ela agradecia esses dois filhos da puta por isso. Com Sarila embaixo do braço, ela vai até o primeiro piso e tem uma ideia. Se agachando atrás do balcão, tateia suas laterais e fundo até encontrar o que torcia para achar.

Puxando da trava, uma pistola carregada surge e dentro da registradora havia mais uma caixa com munição. Quem morava aqui a esqueceu e Sarah agradecia por isso.

Quase saindo do lugar, ela ouve seu nome sendo chamado com desespero.

- Sarah! - ela se vira e dá de cara com Vicente e Elise. - Onde vai sem a gente?

Apontando a arma, Sarah vê a surpresa nos olhos de ambos os desgraçados.

- Eu sabia que era um pau mandado Vicente, mas não que era burro desse jeito. - nega ela quando ele faz menção de andar em sua direção. - Um passo e eu encho você de bala.

Saindo da loja às pressas, Sarah corre meio cambaleante até o carro.

Dando partida e deixando um dedo do meio para trás, ela segue até a autoestrada novamente. Pensando sobre tudo que vem acontecendo e como vai conseguir se virar sozinha nesse mundo, Sarah se sente terrivelmente desamparada e sozinha, era óbvio agora que ninguém podia ser digno de sua confiança, não mais. Ela pensava em Augusto, e ponderava se ele não conseguiu mesmo chegar até o condomínio.

Eis a questão que só pensou agora. E se ele estivesse lá o tempo todo?

Fazendo meia volta e indo em direção ao seu lar, Sarah percebe que o tanque está quase seco. Ela não havia abastecido no dia anterior ao inferno na Terra e muito menos depois dele. Acariciando Sarila, que está confortavelmente deitada no banco carona, ela vasculha sua mente na tentativa de achar uma saída para seu problema.

Talvez fosse melhor parar em um pequeno posto na beira da rodovia, pensou ela. Haviam algumas casas rodeando-o, mas pela ausência de veículos duvidava que poderia haver algum doente vagando por ali.

Parando o carro e testando se a bomba ainda funcionava, primeiro Sarah se foca em colocar o máximo que pudesse de gasolina no tanque. Não havia sequer uma nuvem no céu durante aquela noite, nem barulhos de grilos ou cigarras, só o silêncio e a lua reinavam, dando um ar extremo de sinistralidade ao ambiente.

Depois de conferir se já era o suficiente, ela vai para dentro da loja de conveniência. Os faróis do automóvel eram a única luz que cortava a escuridão, iluminando fracamente o interior do local.

Caminhando por entre as prateleiras surpresa, Sarah constatou não restara quase nada dentro da pequena loja, levaram a comida e outros suprimentos, mas não toda a gasolina. Ela vê um único pacote de absorvente barato e o pega, apesar de não menstruar mais há muitos anos, nunca se sabe do que se pode precisar. Um barulho de lata rolando pelo chão chega aos seus ouvidos, imediatamente obrigando-a a olhar para cima.

Um doente vinha em sua direção, a boca se remexendo de forma animalesca de um lado para o outro, os dentes se batendo e fazendo um "creck-creck" alto e seco, metade do rosto coberto por esporos verde, olhos cheios do que parecia ser pus se desfaziam a cada passo dado. Ele fora parcialmente escalpelado, não era um corte limpo mas sim o topo de seu crânio fora arrancado por mãos, a brutalidade e irregularidade do ferimento denunciavam isso.

Pé ante pé ela tenta fugir, mas a criatura - porque sequer poderia dizer que aquela coisa era um ser humano, solta um grunhido e se lança sobre seu corpo consideravelmente menor, agarrando sua perna esquerda e a levando ao chão.

A força com que sua cabeça bate no piso de concreto polido é tanta que a faz praticamente quicar, a deixando quase apagada. Seu nariz dói tanto que não duvida que esteja quebrado. Procurando com as mãos algo para acertá-lo, Sarah não o queria nem perto de seu corpo, uma vez que não sabia como essa doença era transmitida. Porém ele não se dá por vencido, se jogando em cima dela e ansiando por qualquer parte de pele que estivesse ao seu alcance, parecia que quanto mais próximo ele vinha, mais violento se tornava, como se o cheiro do corpo fresco e vivo atiçasse cada instinto seu. 

O doente urra próximo ao rosto de Sarah, derrubando pus de seus olhos e sangue putrefato em sua boca e bochechas.

Desesperada, ela derruba uma prateleira próxima de si com a mão, escorregando de leve até um de seus arames que se desprenderam dela. Uma dor lacerante a atinge na mesma hora em que crava a ponta mais afiada do metal em sua cabeça, fazendo seu corpo podre tombar sobre ela.

Saindo de baixo dele com esforço, Sarah sente o local latejar infernalmente.

Mancando de volta até o carro, ela está completamente desnorteada. Vê mais deles chegando, um perigosamente perto de si, e quando este se lança ela se abaixa, quase ficando pelo chão mesmo, fazendo-o cair desajeitado. Havia uma mulher na frente da porta do motorista, louca para que a deixasse tirar um pedaço de sua carne quente, e imaginando que já não tenha mais nada a perder Sarah a empurra com força para longe, sentindo-a arranhar meus braços.

Entrando no carro e saindo dali cantando pneus, ela vai ziguezagueando em alta velocidade para o caminho de casa.

Em determinado momento é fadado seu destino, ela simplesmente não aguenta mais, e tem a sensação de estar completamente submersa em um tanque com profundidade maior que a das Fossas Marianas, o cérebro deveria de estar inchado, até mesmo com hemorragia, fora uma pancada em tanto.

Tocando a traseira de sua cabeça ela encontra sangue.

- Ai... - sussurra ela para si mesma ao procurar a origem da dor e achá-la.

Estava mole e pastosa aquela parte, quebrada eu diria, mesmo pequena já faria um grande estrago, seus dias poderiam estar contados. Sarila emitiu imediatamente um som baixinho de tristeza, olhando para Sarah com os olhos brilhantes e orelhas baixadas, ela parecia saber de tudo isso também.

Foram poucos segundos de desvio de atenção do volante até erguer novamente a visão, mas foi o suficiente para condenar ambas.

Os pneus cantam quando ela pisa no freio com força, puxando até mesmo o freio de mão junto. Haviam três deles no meio da estrada, e a última coisa que Sarah lembrava antes de apagar fora o som que Sarila fez ao se chocar contra o para-brisas.

Para sempre Sarah - A zombie novel ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora