Capítulo 1 - O GRANDE MESTRE

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Meu trabalho é uma obra de arte, mas há quem o deturpa. Eu fico extremamente ofendido porque só eu sei o valor daquilo que realizo com minhas próprias mãos. É um trabalho árduo, duro, que exige extrema capacidade de concentração, autocontrole, disciplina, objetividade, foco e, principalmente, entrega total.

Vocês que me julgam. Saibam que eu deveria ser pago simplesmente por tentar explicar a essas suas cabecinhas medíocres — para não dizer estúpidas — a natureza do meu trabalho.

Não é obra de um preguiçoso nem de um funcionário público, que passa horas do seu dia pensando apenas no momento em que chegará a sua casa, para poder, enfim, sentar-se no sofá, diante da televisão, e comer sanduíche de carne processada com queijo gorduroso, bacon, maionese, mostarda e catchup. Ah! Não vamos esquecer as fatiazinhas de tomate e outra de picles, além da folhinha de alface, que servem somente para dar à sua consciência suína a ilusão de que aquele sanduíche é, de fato, nutritivo. Mesmo que esteja acompanhado de um litro de refrigerante, arrotado, prazerosamente, após cada mordida.

E eu me pergunto o que podemos esperar do trabalho de um sujeito como esse. Mas tenho certeza que, apesar de porcalhão, o trabalho dele será infinitamente mais valorizado que o meu. Ainda que o meu agregue incontestável expertise!

Quando realizei minha primeira obra, eu tinha apenas catorze anos. Catorze anos! E, hoje, eu ando pelas ruas e vejo esses moleques que só pensam em computador, celular, seja para satisfazer seu minúsculo membro fálico, seja para vomitar para garotas idiotas as canalhices que aprendem nos filmes, seja para se entreter, enquanto deveriam encher suas cabeças ocas com um pouco de conhecimento.

Mas, outra vez, sem sombra de dúvida, quando estes merdinhas crescerem, serão advogados, doutores, médicos, engenheiros, políticos, empreendedores. Seus nomes aparecerão em jornais e revistas, estampados em reportagens, realizadas por renomados jornalistas, os quais exaltarão suas competências admiráveis, seus grandes feitos, sua incontestável eloquência. E, por mais medíocres que tenham sido a vida inteira, serão considerados mais bem sucedidos que eu. Eu! Que aos catorze anos de idade enforquei a cadela da Deise Mancini, uma adolescente estúpida que com dezesseis anos já pesava oitenta quilos!

Vocês fazem ideia de como é difícil enforcar alguém com esse peso, ainda mais quando se é um moleque magricela e pequeno para sua idade?

Por causa da incapacidade de meus pais e parentes, para cuidar de uma criança como eu, passei minha infância sendo jogado de orfanato a orfanato, instituição a instituição, lar adotivo a lar adotivo. Lar? Apenas burocratas, filhos de outros burocratas limitados ou hippies alienados, poderiam chamar de lar as casas que recebem crianças órfãs ou abandonadas...

É um inferno! Um submundo amaldiçoado, onde precisamos cuidar de nós mesmos se não quisermos ser engolidos pelo demônio. Lar...

Foi no último "lar" que conheci a porquinha que deveria considerar minha irmã mais velha. Deise Mancini, catorze anos na época, e já parecia que tinha engolido uma melancia. E, por mais que não conseguisse subir um lance de escadas ou correr até o portão ou carregar a própria mochila, sem quase colocar o coração boca afora, seus adoráveis pais olhavam para ela como se vissem uma princesa de contos de fada. Enchiam-na de mimos, de beijos, de brinquedos, de abraços e, claro, comida. Será que não viam que estavam condenando aquela criatura a uma vida de eterna chacota?

A garota vivia pelos cantos da escola, aos prantos, porque todos a chamavam de Deise Rolha de Poço, Deise Mabel, Deise Porky Pig. E, para aliviar toda a tensão e estresse, ao qual estava submetida, enfiava mais toneladas de comida naquela bocarra.

OFICINA 666 - DOS OLHOS E DA FOICEOnde histórias criam vida. Descubra agora