Oi, eu nasci

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Quatorze de dezembro de 1993.
Trinta e cinco graus celsius.
Hospital da Vila Cachoeirinha, São Paulo, Capital.

Fernanda atravessa as portas em trabalho de parto, pronta a dar à luz a mais uma menina.
Luna.
Luna dava-se fim a um ciclo de cinco gestações, três concebidas com sucesso
e duas interrompidas por um cabo de vassoura.
Calma, você não  entendeu errado, quando era solteira Fernanda interrompeu duas gestações indesejadas pressionando diversas vezes um cabo de vassoura contra seu abdômen.
Anos após o ocorrido ela decidiu prosseguir com a gravidez  e deu luz sequentemente a três meninas:
Bella, Emma e Luna.

Bella, a mais velha teve convulsões durante o primeiro ano de vida,foi internada às pressas diversas vezes, milagrosamente sobreviveu a todos as crises convulsivas e precisou respirar por aparelhos durante alguns meses.

Emma nasceu perfeitamente saudável. Luna também.
Cinco anos separam as três irmãs.

Em abril de 1994,Fernanda, seu esposo David, Bella, Emma, Luna e Esperança mudaram-se para uma cidade do interior chamada Ourinhos.
Esperança é apenas filha de David, sua mãe morreu devido a leucemia quando Esperança ainda era rescenascida. 
É importante lembrar que Vovó Vilma, mãe de Fernanda também mudou-se para o interior.

O lar  era cheio, e ao mesmo tempo vazio, era cheio de pessoas e vazio de carinho,vazio de amor, vazio de diálogo.

Aos 3 anos de idade, Luna foi diagnosticada com bronquite Severa, foi necessário iniciar o tratamento  com antibióticos. Neste momento Luna era a mais debilitada entra todas as irmãs.

Fernanda e David sustentavam o lar,
nunca deixaram faltar o pão de cada dia.
Fernanda é contadora,  David,mecânico.
David trabalhava na garagem de seu pai na Grande São Paulo, devido a isso ele ficava duas semanas na Capital e duas semanas no interior,  e por conta disso eu, representada neste livro por Luna,e minhas irmãs passávamos a maior parte do tempo com a minha mãe, onde aconteciam os espancamentos  e as humilhações diárias.
Fernanda é autoritária eu e minhas irmãs nos submetemos a obedecer não por respeito, mas sim por medo,medo de apanhar.

Aos 7 anos de idade, eu,Luna, fui curada  da bronquite, e os meus dentes podres devido à forte demanda de antibióticos estavam dando lugar a saudáveis e lindos dentes permanentes.
Também aos 7 anos,fui diagnosticada com  Hiperlordose Lombar,um problema no osso principal das costas que não te permite ficar reta, formando um "C" na curvatura da coluna.
Problema derivado a uma queda(escada)que minha mãe Fernanda sofreu durante a gravidez .

Vovó Vilma morava na rua de trás, e alguns dias da semana eu dormia na casa dela para que ela não ficasse sozinha .
Vovó me tratava bem, apesar de ter um passado de alcoolismo e prostituição.

Nessa época,aos 7 anos de idade eu fui atropelada na esquina da minha casa e milagrosamente isso apenas me proporcionou 3 meses com o braço direito engessado.

Não tive traumas causado pelo atropelamento, meus traumas surgiram sequentemente pelos fatos a seguir:
O primeiro, quando minha mãe quebrou o nariz da Bella com um soco,eu nunca havia presenciado tanto sangue até aquele momento;
O segundo , quando ela quebrou o braço da Emma com um capacete e um cabo de vassoura;
O terceiro, quando ouvi que tínhamos que nos humilhar para ter um prato de comida;
O quarto por ter que ficar de castigo de joelhos no milho com os braços para  cima,
E o quinto,por não entender o porque as minhas amiguinhas da rua não apanhavam tanto quanto nós.

Quando o papai David estava estava em casa, os ematomas pelo nosso corpo diminuíam, ele entrava no meio, levava as pauladas e mangueiradas em nosso lugar,porém os ouvidos sempre ouviam toda palavra de humilhação e maldição.
((..) vagabundas, ingratas, preguiçosas, feias,merecem apanhar que nem cachorro, só me dão desgosto(..))

Papai era carinhoso e brincalhão,nos levava para a praia, nos levava para  passeios incríveis em chácaras com piscina e salão de jogos. Ele levava todas as crianças da rua e nós ficávamos hospedados em uma casa enorme e também muito assustadora.
Papai também nos levava para o Rio para nadar e pescar, ele era muito conhecido e querido, e até os amigos dele cuidavam de nós quando estávamos na rua brincando.
Quando o papai voltava  ao trabalho, tínhamos que faxinar a casa para assim ser digna de comer,e torcer para que a mamãe  não tivesse tido um dia estressante,assim nos livraríamos  dos ematomas pelo menos por aquela noite. Ela dizia que tínhamos que nos humilhar para ter um prato de comida.

Assim que completei 8 anos de idade,comecei o tratamento para minha coluna.
Foi feito um colete de ferro do meu tamanho e fixado em minhas costas, eu só podia tirar para tomar banho.
Eu não conseguia me mexer, e minhas funções eram limitadas, algumas pontas dos ferros perfuravam minha pele.
Eu era frágil, uma simples queda na escola foi o suficiente para que eu quebrasse o braço mais uma vez, aquele colete me machucava tanto por fora, quanto por dentro.
Foram 3 anos nessa luta.

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