13- Lúcida sensatez.

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INADEQUADAMENTE EXCEPCIONAL

Por Gabriela Vidor

Capítulo treze.

Mãos enluvadas deslizaram pelo mogno negro, massageando a madeira ornamentada com certo carinho.

— Eu me sinto atraído por músicas infantis de uma forma... Eu não consigo explicar. É necessário algumas adaptações, devo admitir, mas "Eeny Meeny Miny Moe", não é incrivelmente sintomático? — Dedos magros rolaram pelo recosto de uma cadeira, vagando tão logo para a outra, dedilhando cada suco com maestria e uma atenção duvidosa. — Afinal, é só pega-la pelo dedo...

— Desculpe, Behar. Mas o que isso tem a ver com tudo?

Kapllani estagnou, os olhos presos ao nada, excessivamente opacos, e ao mesmo tempo tão profundos quanto porcelanato. Insanamente vidrado, era como se definiria. Seu lábio inferior tremeu, e só então conseguiu organizar o frenesi incessante que sambava por cada neurônio mergulhado em noradrenalina.

Aquilo seria o paraíso? Se perguntou. Só poderia ser a porra do paraíso.

A sua massa pensante estava tão ligeira, correndo e percorrendo, rastreando e se agarrando. O êxtase momentâneo o havia tomado, e o delírio da dopamina quase cegado. Queria ter ficado. Seria ainda mais maravilhoso a caçada de gato e rato. Seria divertido. Seria novo. Algo inusitado. Algo i-nes-pe-ra-do.

— Freeman, certo? — Kapllani não aguardou sua resposta, seus mocassins batucaram de encontro ao chão com inquietude, e todos assistiram o homem sapatear pelo piso laminado. Seria a loucura novamente? — Eu sei. Eu sei! Todos estamos desesperados o suficiente para matracar, certo? Acredite... — batuque, batuque. — Eu também estou. Quero matracar, mas prometo que não irá demorar.

— Tem uma puta vadia grudada em nosso cangote, tão fodidamente sedenta, que consigo sentir a droga do bafo de merda a cada passo que dou... O que garante que você irá salvar os nossos malditos pescoços? — O homem deu um longo suspiro desleixado, estava incisivamente irritado, ainda que temeroso. — Você é apenas um louco.

— Não! — Seu sapateado já havia se sessado, deixando assim, a sala ser tomada pelo ecoante e gradativo estalar de sua língua pelo céu da boca. — Eu não sou louco. Não, não. Não mesmo. Eu não sou não. — Seu sussurro frenético mostrou o exato contrário daquilo que tanto negava, mas como uma voluptuosa onda, a sombra nublada se fora da mesma forma que viera, muito inusitadamente. A lucidez havia voltado parcialmente e uma fraca risadinha se reverberou pela sala; arrastada, entrecortada, melancólica. — Acredito que estamos constantemente percorrendo caminhos. Gradativamente seguindo... Direções. Uma linha contínua, onde devemos cuidadosamente malabarizar para chegar ao ponto que pretendemos... A mesma coisa acontece com a socialização humana. Devemos percorrer com cuidado, pôr assuntos gradativamente sobre a mesa. Gosto da sutiliza em seus aspectos... Em alguns momentos, é claro. — Suas íris, e somente elas, se voltaram para Freeman, e sua posição petrificada não era exatamente favorável a isso. — Eu tenho uma história surpreendente. Vocês vão gostar realmente. Prometo!

O movimento foi rápido e inesperado. Em um momento Kapllani estava ali, e no outro, não estava mais.

Couro enegrecido fora resvalado pela cara veste que escondia ombros ossudos. O aperto que se seguiu, apesar de não passar hostilidade, fora completamente firme, e enquanto dedos massageavam a pouca carne existente ali, o sorriso duvidoso e tão conhecido fora tomando seus caminhos, parando cada qual ao seu canto. Kapllani levou um milissegundo ajeitando o fio solto em sua testa, e então se curvou. Lábios contra ouvido, praticamente roçando a pele recém-eriçada.

Inadequadamente Excepcional (EM REFORMA)Onde histórias criam vida. Descubra agora