Capítulo 1

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How many times do I have to tell you, even when you're crying you're beautiful too.
- John Legend, All of me.

Não há nada no mundo que me chamasse mais a atenção do que uma manhã de domingo. Eu amava o canto dos pássaros que eram ouvidos há quilômetros de distância, no silêncio que era possível ouvir apenas nesse horário do dia quando Seattle deixava de ser uma cidade caótica e movimentada.

A tensão que rolava na cozinha poderia ser sentida mesmo que eu estivesse em outro continente. Matias e Donna estavam na cozinha discutindo como sempre faziam, — talvez esta fosse a pior parte do meu dia — como se ninguém mais pudesse ouvi-los. Era sempre a mesma coisa, mamãe argumentando o quanto o meu melhor amigo, Noah, era um garoto festeiro e que não ligava para seu futuro. Não que ela o odiasse, Noah era o filho que ela nunca teve, talvez por isso as reclamações eram tão frequentes. Seu pai sempre o defendia, o que tornava a discussão praticamente eterna; Nenhum dos dois jamais irá ceder ao seu oponente.

Nessa manhã eu senti a necessidade de fazer as coisas de maneira diferente. Fui até a cozinha e como de costume, peguei uma maçã e cumprimentei os dois que naquela discussão continuariam até a hora do almoço. Naquele momento, decidi que o dia seria entediante e que aquela intriga havia se tornado bastante interessante.

Após poucos minutos, um ruído meio estridente veio das escadas fazendo com que todos olhassem em sincronia. Marcus descia os degraus restantes enquanto nos analisava com uma expressão que com certeza sentenciaria nossa morte ali mesmo. Instantes depois ele percebeu que estava apenas com uma camisa e sua roupa íntima, o que o fez subir rapidamente as escadas e voltar para seu quarto. Mamãe e eu nos entreolhamos e cedemos as gargalhadas. Em poucos segundos foi possível ouvir papai nos xingar do alto das escadas o que nos fez rir mais ainda.

O clima na casa já era outro, papai era o mediador entre Jeremiah e Donna. Rose e Donna eram melhores amigas, assim como Jeremiah e Marcus. Todos se conheceram no colegial, talvez por isso eram unidos do jeito que são. Sabe aquele negócio de muita história pra contar? Então. Rose havia falecido a pouco menos de um ano; o câncer havia ganho. Edward nunca mais foi o mesmo, o garoto responsável que chega sempre no horário, havia se tornado um dos que chega em casa às sete e meia da manhã e não é após uma longa noite de trabalho.

Nós estávamos no último ano do colegial, o que praticamente fez com que Jeremiah ignorasse a situação de seu filho. Algo que eu posso dizer, é que nossos pais nunca foram mal de grana. Não direi que somos ricos, porque isso seria mentira e outra história começaria a ser contada; Pinóquio.

Jeremiah era um cara bem sucedido, que apesar de seu esforço, — algo que devemos reconhecer — praticamente 78% de suas posses eram herança de família, não usarei como desculpa para seu descaso com seu próprio filho, mas ele era um homem extremamente ocupado. Domingos assim às vezes até eram revigorantes, já que ele raramente estava por perto. Graças à Rose, Jeremiah era um homem humilde e repleto de caráter, algo que tornou sua vida empresarial um tanto mais fácil. Mas tudo isso é outra história.

Durante meu devaneio, a discussão havia cessado e já estava quase na hora do almoço. Edward também já estava aqui, o que é algo incrivelmente raro, porque como eu já havia dito, ele só aparece depois das três da tarde.

Parei para analisar a cozinha e naquele momento percebi quanto tempo eu havia perdido em meus pensamentos. Jeremiah já estava muito longe de casa à essa altura, mamãe já estava a preparar o almoço e papai estava sentado na ponta da bancada lendo as notícias em seu laptop.

Desavenças do CoraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora