Ressurreição

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O ser humano tem muitas faces, nem sempre todas elas vão aparecer durante o curto espaço de tempo que temos de vida.

Podemos ser Montros

Podemos ser Deuses

Podemos ser Anjos

Todos habitando a mesma carne.

E foi exatamente isso que ela foi, quando me tirou de dentro daquele carro.

Ela era um anjo, mesmo com a neve densa caindo sobre nós e o frio tão cortante quanto os pedaços de vidro grosso que perfuravam minha pele.

Os olhos verdes, os cabelos rosados...não existiam muitas mulheres de cabelos cor de rosa no mundo, e se a dor alucinante não estivesse levando meus sentidos, me perguntaria o que levava uma mulher, pequena demais para um homem como eu, fazer de tudo para me arrancar pela janela quebrada daquele carro devido a violência do impacto que sofreu.

Ali ela foi uma deusa, pois somente com uma força fora do normal para retirar uma pessoa semi inconsciente de forma tão impávida do veículo capotado.

-Está tudo bem...

Pude ouvir os finos lábios dizerem

-Vai ficar tudo bem.

Quando a brisa da noite soprou sobre mim e os flocos finalmente atingiram minha pele que seu rosto se tornou uma luz em meio as trevas.

-Eu sou médica.

Foi a última coisa que ouvi antes de apagar por completo.

Não, ela era um anjo.

Eu tinha certeza!

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Você conhece o sabor da morte?

Nunca refletimos sobre isso porque aprendemos que é errado pensar na perda.

Mesmo sabendo que morrer é a única certeza que teremos na vida.

Morrer é errado.

Não devemos morrer!

Essa é uma das principais leis sociais que quebramos, pois morremos, todos os dias, das mais diversas formas, seja por doenças, guerras, no trânsito...

Eu sabia que ia morrer quando senti o impacto, quando o carro derrapou sobre a pista escorregadia.

Meu coração acelerou e minha primeira reação foi xingar, muito, as porras das correntes não haviam funcionado!

Depois veio o desespero, e por fim a dor. Quando o vidro perfurou minha carne eu soube.

Eu tinha a certeza!

Morreria ali, sozinho na neve, de tanto sangrar, ou congelado.

O gosto da morte...era aterrador.

Afogando-me em meu próprio sangue, com o sabor ferroso do liquido vermelho ao inundar minhas vias aéreas.

Meu corpo seria meu próprio carrasco, meu executor.

Não sei se era porque estava sobre a neve, mas ela também era fria e solitária.

E a solidão é o maior frio que se pode sentir.

Pensei em minha mãe em como ela ficaria em saber de minha morte, o filho mais novo, tão moço...com toda a vida pela frente.

Talvez eu devesse ter feito como nos outros anos e simplesmente ignorado os insistentes pedidos dela em ir passar o final de ano naquele fim de mundo.

Louca PaixãoOnde histórias criam vida. Descubra agora