Deixar estar

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Vegeta engoliu em seco quando passou pela porta do elevador. Bulma o encarou e perguntou, novamente:

– Tem certeza?

– Já disse que sim – ele quase rosnou, bruto, e Bulma entendeu que não devia mais perguntar nada.

Ele batia nervosamente o dedo sobre o braço da cadeira conforme os andares iam se sucedendo até o térreo. Ele havia trabalhado bastante com Whis na terapia e aprendera que seu pânico maior tinha traços de agorafobia, o medo de espaços abertos, e sabia que a parte mais difícil a enfrentar seria sair do prédio para a rua e, dali, até o parque, mas aquilo tinha que ser feito, sob pena de jamais curar-se, mesmo com todos os remédios e terapia, aquele era um momento em que dependia apenas dele enfrentando o seu próprio medo.

A portaria envidraçada com vidros escuros era a última fronteira segura, o ponto sem retorno. A partir dali, ele estaria enfrentando a sua própria escuridão, que, paradoxalmente, surgia diante da claridade daquela manhã pálida de outono.

O sol quase o cegou, desacostumado que estava com a claridade direta depois de tanto tempo de luz controlada ou artificial e ele sentiu-se inseguro quando passou pela porta de vidro. De repente, Bulma segurou-lhe a mão e disse:

– Eu estou aqui, Vegeta.

O contato com a mão firme e macia dela o encorajou, e ele desceu a rampa rumo a calçada, com ela ao lado dele, os dois em um silêncio cúmplice. Vegeta sentia medo, era verdade, de refazer o trajeto até o lugar onde fora abandonado por alguém que ele imaginara que seria uma companheira, mas, agora, sentia-se cada vez menos inseguro, porque Bulma garantira que não o abandonaria.

Quando chegaram ao parque, o movimento das crianças em torno da praça fez com que ele se sentisse inseguro e começasse a tremer, e Bulma adiantou-se e postou-se diante dele, abaixando-se à sua altura para perguntar, olhando diretamente em seus olhos:

– Está tudo bem com você, Vegeta?

Ele engoliu em seco e apenas acenou com a cabeça. Ela perguntou:

– Quer voltar? Eu vou entender se você quiser...

Ele não queria. Dominando a vontade de gritar, o medo e a frustração por ainda se sentir abalado, ele avançou lentamente com a sua cadeira de rodas até o centro da praça, exatamente onde Andy tinha dito que não tinha mais estrutura psicológica para ficar com ele, e então, ele soube.

Estava livre. Não havia porque ter medo. Ele havia superado seu inferno particular chegando até ali, ele havia vivido e sobrevivido, e ele olhou para o lado e seus olhos encontraram os de Bulma, que o miravam, apreensivos. Ele então disse, ainda sem sorrir:

– Eu estou bem, Bulma.

Ela abriu um sorriso radiante, e aquilo iluminou sua alma. Ela abaixou-se e o abraçou pelo pescoço, dizendo:

– Eu estou tão feliz, Vegeta, tão feliz por você!

Ele sentiu seu perfume, a maciez dos seus cabelos de encontro à lateral do seu rosto, a maciez da sua pele, roçando no seu rosto recém barbeado e, pela primeira vez desde o acidente, encontrou dentro de si o desejo por uma mulher. Bulma era a primeira mulher que, de fato, o fazia querer descobrir como sentir prazer novamente, como superar as sequelas de sua lesão. Ele pôs os braços em volta dela, e apertou ligeiramente num abraço, dizendo com a sua voz rouca e embargada:

– Obrigado, Bulma! Por tudo.

Ela se afastou, ergueu-se e ficou segurando as mãos dele, sorrindo antes de dizer:

– Fico muito, muito feliz por você, Vegeta!

– Eu... eu também – ele tinha um sorriso autêntico no rosto, talvez o primeiro que ela realmente reconhecia como tal, desde que o conhecera.

As Paredes do AquárioOnde histórias criam vida. Descubra agora