CAPÍTULO 8

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       Fiquei as primeiras duas semanas na casa de Rafael, ele preferiu que eu ficasse lá. Eu não estava decidida ainda.
       Eu estava conversando com Joana no whatsapp quando Rafael bate na minha porta. Eu me levanto e abro.
      - Oi. - digo.
      - Oi! Está fazendo alguma coisa importante? - indaga ele.
      - Não, por que?
      - É q...que eu queria saber... - gagueja - Eu... vou sair... com o Lobinho... E queria saber se quer passear com a gente.
       - Ah... tudo bem. - digo encolhendo os ombros - Só vou colocar meu tênis e já saio.
       - Que bom! - o ânimo fez ele levantar a postura.
       Coloquei a mesma roupa de ontem, é calcei um All Star vermelho de cano longo e saí.
                             •••
       Passeamos com o cachorrinho enquanto conversávamos sobre os negócios. Mas, ele mudou de assunto.
       - E o seu irmão? - pergunta - Vejo que gosta muito dele, mas não toca muito no assunto.
       Isso fez meu coração acelerar. Não queria falar no assunto. Mas não sei o porque de ter falado.
       - Ele tem câncer. - digo encolhendo os ombros.
       - Ai, caralho! - ele se constrange - Desculpa, eu não... eu sou um imbecil!
       - Tudo bem. - digo com sinceridade - Gosto de falar dele.
       Ele se interessou pelo assunto, e contei a ele sobre a promessa que tive que fazer. Disse que em parte me arrependo de ter prometido ao meu irmão que não o veria mais. Sentamos em um banco e Rafael soltou a guia do cachorro para ele andar um pouco.
       - Ele fez isso porque ama você. - disse Rafael - Acho que quer te proteger.
       - Também acho. - admito - Mas quero vê-lo. Não sei o que ele faria se fosse o contrário.
       - Não conheço ele, mas... Ele atenderia o seu pedido. - aconselha - Mas o que importa, é o que você vai fazer.
       Nunca alguém havia me dado um conselho. Senti que minhas ideias foram se clareando, e me senti mal de não tê-lo visitado antes. Senti o arrependimento dominar o meu corpo, fazendo uma lágrima cair de um dos meus olhos.

PERSPECTIVA DE RAFAEL
       Ela aparentou ficar impactada com o meu conselho, fazendo com que uma lágrima rolasse em seu rosto. Ela secou-a rapidamente, na tentativa de esconder o que estava sentindo.
       - Eu devia ter ido vê-lo. - ela abaixa a cabeça, para esconder o rosto com os cabelos.
       - Ei... calma! - tento acalmá-la.
       A coisa mais sensata a se fazer foi puxá-la levemente para perto de mim, envolvendo seu corpo com meu braço. Ela retribuiu colocando um braço em minha cintura. Mesmo sentados, nos viramos de frente e nos abraçamos forte, de maneira que eu pude sentir a tristeza dela em mim.

PERSPECTIVA DE DÉBORA
      
       Senti uma conexão forte ao nos abraçarmos. Isso me deu tal conforto que me fez chorar, de maneira que não chorava há tempos. Chorei baixo, e ele me abraçou mais forte, e esfregou uma das mãos em minhas costas, e com a outra, me fez cafuné nos cabelos. Senti que nos seus braços estava segura, como nunca me senti antes. Esse abraço durou cerca de vinte e cinco segundos. Quando nos soltamos, eu estava com uma das pernas em cima do banco, fazendo ele colocar uma mão em minha panturrilha, e a outra em minha coxa.
       - Por que não tenta ligar para ele? - aconselha.
       - Boa ideia. - me animo - Mas... não sei.
       - Por que? - indaga carinhosamente.
       - Não sei se consigo.
       - Quer que eu ligue com você?
       - Faria isso? - a forma como ele se importou comigo me fez levantar a cabeça.
       - Claro! - falou.
       Eredin voltou com a guia pendurada. Pula no banco, entre a gente. Rimos com a atitude do cachorrinho. Ele lambeu meu rosto e, gargalhando, passei a mão em seu pelo. Rafael riu também.
                           •••
       Ao chegarmos em casa, Rafael entrou e meu quarto comigo. Abri o Skype. Olhei para a tela e em seguida para Rafael.
       - Vamos? - disse ele.
       - Vamos. - falei
       Abri o perfil do meu irmão. Chamando. Alguém atende.
       - Oi! - a voz está oscilando por causa do sinal - Débora?
       Eu fiquei sem palavras . Ele estava muito magro, já havia perdido parcialmente os cabelos. Um nó na minha garganta surge. As palavras não saem, por mais que eu tente. "Fala alguma coisa" , digo a mim mesma. Não consigo. Um segundo. Dois. Três. Quatro. Cinco...
       - Fala aí, cara! - Rafael o cumprimenta e olha para mim- Tudo bem?
       - Coé, mano! - cumprimentou Paulo
       - O... oi! - consigo falar - Que saudade!
       - Quem é esse, que você não me falou nada? - diz Paulo
       - É o Rafael, ou Cellbit. - falo sorrindo, consigo finalmente descongelar - Estou editando para ele.
       - Cellbit? - meu irmão se surpreende - Parabéns, mana!
       - Obrigada! - agradeço .
       - Vou deixar vocês a sós - diz Rafael, enquanto se levanta e sai do quarto.
       - Como está aí? - pergunto a Paulo
       - Vou fazer a  décima terceira quimio amanhã. - ele disse
       - Décima terceira. - repeti decepcionada - Meu Deus!
       - Eu sei. Mas você prometeu.
       - Por que me fez prometer isso? Sinto sua falta. - disse chorando.
       - Você não é entende. Só não venha. Está feliz aí. Promete?
       - Não posso, eu...
       - Você tem que prometer pela sua vida! - falou alto.
       - Eu...
       - Prometa!
       - Eu... - não queria que a palavra saísse - Prometo.
       - Isso. - ele falou com lágrimas no rosto - Estou orgulhoso de você. Eu te amo muito, você sabe disso, né?
       - Eu sei. - eu chorava copiosamente - Eu também te amo. Mais que tudo.
       -  Você é tudo pra mim, quero que saiba disso. - disse - Outra coisa... meu último pedido a você.
       - O que quiser. - disse com a cabeça meio abaixada
       - Perdoe mamãe, por favor! - esse pedido me fez levantar a cabeça - Eu sempre quis ver vocês duas se amando. Pode fazer isso por mim?
       Eu hesitei, mas falei:
       - Por você, sim.
       - Te adoro.
       - Também te adoro.
       Ele desligou. Eu chorei. Deitei na cama e enterrei meu rosto no travesseiro para abafar meus gritos de desespero. Talvez eu nunca mais consiga vê-lo. Mas ele ainda tem umas semanas. Eu preciso abraçar ele. Mas prometi não ir. Promessa é dívida. Talvez eu ligue pra ele amanhã depois da décima terceira quimioterapia. Talvez.

editora de vídeo | rafael langeOnde histórias criam vida. Descubra agora