Capítulo 3

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"1997

Foi no início de março de 1992 que decidimos ter um filho, mas a ansiedade era tanta que só em agosto desse mesmo ano consegui engravidar.

Os primeiros três meses foram muito complicados, enjoos, vómitos... não comia nada, estava sempre deitada, até que fui internada e estive ligada a soro para não desidratar e alimentar o bebé. Quando essa fase passou, regressei a casa. A partir daí foi muito engraçado; eu estava bem, o bebé também, a barriga começou a crescer e o bebé a mexer. Até que chegou o dia de sabermos o sexo do bebé e ficámos a saber que era uma menina.

Ficámos muito contentes, embora o teu pai quisesse um menino e dissesse 'E agora? O que faço às canas de pesca e às motas?' Mas tu quiseste tudo isso, eras uma maria-rapaz.

Tudo correu bem até ao final da gravidez, até que naquela noite de 13 de maio às 2h e 30m da manhã acordei com uma dor nas costelas que não aguentava mais nem sequer me conseguia dobrar para me levantar. O teu pai levou-me logo para o hospital. Tu ias nascer.

Foram muitas horas de sofrimento e de dores, nasceste 16 horas depois de começar o trabalho de parto. Trazias os olhos muito abertos e vinhas esfomeada. O teu pai ainda te viu nesse dia e eu passava horas a olhar para ti.

No dia seguinte, na hora da visita, ele olhava para ti, olhava para mim e dizíamos 'É tão linda'...depois, com uma lágrima nos olhos, 'É a nossa princesa'."

Tinha sido assim, há cerca de duas décadas, que Eva tinha vindo ao mundo. Poucos anos depois, farta de brincar sozinha, começou a martirizar os pais; queria um irmão ou irmã à força toda.

Em alturas de desespero costumava dizer que queria um mano, nem que fosse de barro ou da loja dos trezentos.

Na verdade, os pais tinham tentado durante imenso tempo um segundo bebé, mas por qualquer motivo nunca acontecia, chegando ao ponto de a mãe de Eva se questionar se Deus não a achava merecedora de criar e amar mais uma criança.

Triste e talvez até um pouco revoltada com a falta de resposta às suas preces durante tanto tempo, decidiu deixar de tentar engravidar, entrando assim num processo de adoção. Levou algum tempo, mais do que deveria, mas o Pedro apareceu.

Não foi por ser rapaz e o pai querer um menino, foi algo mais, como amor à primeira vista. Pedro era um bebé recém-nascido que entrou no sistema de adoção mal saiu do ventre da mãe. Precisava de uma família que o desejasse e acima de tudo, que o amasse. Essa família seria Eva, que tanto implorara por um irmão, e os seus pais, Isabel e Francisco, desgostosos pelas tentativas falhadas de uma segunda gravidez.

Apesar de ser adotado, nunca houve distinções entre filhos e quando Pedro tinha idade para saber e compreender de onde tinha vindo, não se chateou nem procurou saber mais... pelo contrário, para ele, aqueles dois seres humanos à sua frente eram os seus pais verdadeiros, de sangue ou não, tinham-no criado, educado e amado.

Embora não fossem uma família de grandes posses, nunca faltou nada realmente importante aos filhos, muito menos amor e carinho. Desde esse dia o assunto nunca mais tinha sido referido. Para qualquer efeito, Pedro pertencia à família. Se mais tarde ele quisesse saber informações dos pais biológicos, seria uma decisão sua, mas o rapaz não pensava minimamente nesse assunto.

Aqueles eram os seus pais, a sua família. E isso bastava.

Poucos meses depois de Pedro ter chegado à família, no início do ano seguinte, numa noite gelada, Eva, com olhos brilhantes e sorriso largo, recebeu com entusiasmo a notícia que a mãe estava grávida. Afinal Deus tinha escutado as suas preces, talvez apenas tivesse demorado algum tempo a respondê-las da forma que eles queriam.

Quando o Coração Não PerdoaOnde histórias criam vida. Descubra agora