33. Sangue por toda parte
GAVIN
Alguém me deu um tapa forte na perna e eu acordei de um transe. Estava em uma festa, havia música alta e muitas pessoas dançavam no meio do salão. Eu estava sentado em um sofá no canto do salão junto com mais três amigos, Nate, o que bateu na minha perna, negro com tranças no cabelo, Kat, também negra menos retinta, que mexia em seu cabelo liso, e por último Ian, um garoto branco com o cabelo raspado.
- Para com isso! - disse Nate para mim, se referindo por eu ter ficado muito tempo no celular, me desligando do mundo.
Naquele momento eu percebi o quanto nada daquilo estava me fazendo bem. Eu sempre me cobrei tanto para ser alguém dentro daquele pequeno grupo. Finalmente meus pais estavam me deixando sair, isso fazia dois meses, mas a nossa amizade estava completando dois anos, então pensei que tinha perdido muito tempo, só fazendo parte de verdade do grupo no horário da faculdade.
Nate, sempre muito forte e às vezes grosseiro. Kat sempre querendo ser a voz da razão e uma líder por ser inteligente e, na cabeça dela, a mais madura. Eu arrastei Ian para o nosso grupo e não podia mentir que as coisas não ficaram tão bem quando fiz isso.
As coisas vêm e vão pela minha cabeça, mas acho que consigo encontrar uma ordem.
O primeiro dia de faculdade foi estranho. Um novo lugar para se acostumar, novas pessoas para conhecer. Deste pequeno eu tenho pânico social, e sempre fico desconfortável em lugares com muitas pessoas. Ambientes como o colégio eram os que eu me acostumava com o certo desconforto que eu havia, mas quando ia a algum lugar novo o desconforto me matava e eu queria vomitar tudo que havia comido de manhã.
Nate se apresentou para mim no segundo dia de aula, querendo saber de um trabalho de pesquisa que um professor já havia passado e ficamos conversando até a sala, e ele se ofereceu para se sentar do meu lado e é claro que aceitei, pois alí ele parecia muito legal. Passamos vários dias conversando, e logo no segundo dia de amizade eu contei sobre a minha bissexualidade para ele, que pareceu aceitar de boas, mesmo não tendo nada para aceitar.
Kat veio quase um mês depois. Depois de uma aula, ela e o seu grupo de amigas se reuniu comigo e Nate e por algum motivo Kat grudou na gente. Confesso que ela era engraçada e seu posicionamento sobre certos assuntos eram maravilhosos, mas ao longo daquele mesmo ano, as coisas foram desmoronando aos poucos.
Nate se descobriu bi enquanto conversa com a gente, já que Kat também era, e no começo foi legal, até ele me falar uma certa coisa quando disse que achei uma garota da faculdade bonita.
- Tira o olho que você é bicha!
Aquele comentário me ofendeu muito, tive que aturar pessoas ditando a minha sexualidade e não queria isso agora, mas meses depois ele pareceu ter aprendido a lição e nunca mais falou nada daquilo, pelo menos não perto de mim. Nate também era meio grosso às vezes, e se ele era assim, porque eu não poderia ser também?
Sempre fui esse tipo de pessoa que se adapta dentro dos grupos. Então se os integrantes do grupo são grossos, eu também vou ser grosso. Quites. Kat não ficava nem um pouco atrás de Nate, sempre se unindo a ele para me diminuir e mandar eu fazer coisas como se fosse um empregado. No começo agia como se fosse uma brincadeira e realmente não poderia reclamar, mas aquilo passou dos limites e ficou chato. Além disso, eles sempre zombavam do meu corpo e eu ficava calado.
Meus pais, nesse primeiro ano de faculdade, não me deixavam sair para lugar nenhum, então sempre que Nate e Kat saíam, eu ficava sobrando nas conversas sobre. Eu me sentia cada vez mais deslocado em relação aos dois, e por algum motivo não conseguia conversar com eles sobre isso, já que sempre me interrompiam, falavam em cima de mim, pareciam não me ouvir ou não ligavam para o que eu falava. Então era assim, eu me cobrando para ser alguém, pensando muito antes de falar, saindo sempre que possível, mesmo quando não queria, para estar presente ou porque eles insistiam que eu fosse. Queria fugir, mas não sabia como.
No último dia do primeiro semestre da faculdade, eu já havia passado em tudo, mas meus amigos ainda tinham algumas notas para recuperar, então mesmo assim eu cheguei lá na faculdade e fui recebido com um:
- O que você tá fazendo aqui? - dos dois.
Achei que eles iriam gostar de me ter do lado deles, principalmente porque era o último dia antes de algum tempo de férias, mas eu pensei errado.
No ano novo queria passar com Kat na praia, que aceitou e não falou nada de negativo sobre a idéia. Mas então alguns dias depois ela deu uma desculpa para eu não poder ir, mas quando soube que ela ter comprado as passagens de metrô e que passaria a noite na casa de um amigo da mãe dela era tudo mentira, fiquei puto da vida. Fui ver com ela dias depois da virada e ela disse que por eu não sair muito, não queria ter que ficar cuidando de mim.
Era assim que eles me viam, como uma criança, que não sabia andar na rua ou coisa do tipo. Na primeira vez que saímos pelo bairro da faculdade, fiquei olhando tudo em minha volta e eles agiram como se eu fosse um bebê a ser vigiado. Tiravam suas próprias conclusões sobre a minha vida e falavam que eu era imaturo, mesmo não sabendo todo o abuso que sofria em casa, e tudo que já passei no colégio. Poderia ser bem mais leve do que eles passaram, mas isso não invalidava o que eu já passei, tanto porque nunca coloquei os meus problemas na frente dos deles.
No semestre seguinte eu tentei ainda mais ser alguém dentro do grupo, falhando mais uma vez e me sentindo notado só quando estava somente com Nate ou Kat, mas nunca quando estávamos os três juntos. Além disso tinha que ficar aturando os dois falando mais da aparência de pessoas que eles não conheciam, julgando meus outros amigos de outros turnos e o ódio deles por certos professores só porque não gostavam de certas coisas na forma que eles davam aula.
Conheci Ian e nos aproximamos muito, conversando literalmente todo dia até às quatro da manhã, e para poder ficar mais tempo perto dele, o chamei para o meu grupo. E aconteceu com ele o que aconteceu no semestre passado, onde chamei alguém novo para o grupo, uma pessoa que saía mais e por isso se aproximou mais do grupo do que de mim. Ian e eu paramos de nos falar todos os dias e ele me trocou completamente por Kat.
Aos poucos fui ficando muito mal, me sentindo cada dia mais péssimo e saindo da faculdade com um peso enorme no peito, um peso que nunca passava. Fui me afastando aos poucos, de forma que nem eu percebi. O pior foi quando Ian disse que eu deveria criar mais intimidade com Nate e Kat, sendo que éramos amigos há dois anos e quem deveria criar intimidade no grupo era ele e não eu.
Às vezes eu só me desligava, olhando para o nada, outras eu pegava o celular. E é nesse momento que percebi que não estava bem, quando Nate pediu para eu parar com aquilo, não pedindo para eu me aproximar deles e nem perguntando como eu estava, se estava mal ou coisa do tipo, não, ele só estava incomodado com aquilo. Bebi o máximo que pude naquela noite, fumei cigarros de pessoas desconhecidas, cheguei em casa e dancei no escuro enquanto meus pais dormiam. E quando estava ficando sóbrio, montei um texto, falando como em sentia mal, como não estava conseguindo sair da cama e sobre meu pânico social, e sobre tudo que Nate e Kat faziam que me deixavam pior, e mandei para eles, que viram aquilo como uma ofensa. Eu disse que não queria brigar, que eu só queria resolver as coisas, mas eles não ligaram, usaram a minha grosseria e piadas sobre suas inseguranças, essas que só fazia por eles fazerem comigo, e invalidaram o meu mal estar, e uma mensagem de Nate me fez mais mal ainda, quando eu falei que não queria discutir.
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Lavanda (Fanfic Melita)
Mystery / ThrillerMelanie pensava que tudo iria bem em uma viagem com a família para se acalmar de tudo, mas quando é sequestrada e levada para um hotel rodeado por um campo de lavanda, onde todos agem de maneira estranha, ela terá que se unir á Elita e amigos para f...