seis.

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"a mind in love is a violent place to be"

— Você teve outros filhos, depois de tudo?

A pergunta veio tão inesperadamente que foi feito um golpe seco, atingindo Nayeon em cheio e a deixando fora de órbita por alguns segundos. Os dedos da mulher se apertaram em torno do equipo de soro que segurava, ao mesmo tempo em que seu estômago se contraía em repulsa. Ela sentiu todas as suas fibras musculares também se contraírem, colocando-a em alerta, porque aquele assunto revirava seu interior como nenhum outro. E ele sabia.

— Taehyung, não. - a voz da mulher saiu fragmentada, quase como se também se recusasse a participar daquilo. Não era a resposta à pergunta dele, mas uma negativa à tentativa de entrarem naquele assunto, o ponto nevrálgico de suas vidas e que, era fácil perceber, ainda parecia um nervo exposto e doloroso feito o inferno - Nós não vamos falar sobre isso. - as palavras tinham potencial para serem incontestáveis, mas foram traídas pelo quão trêmulas soaram ao saírem de seus lábios.

— Nayeon, nós nunca mais falaremos sobre isso, mas... - ele começou a argumentar, mas o sofrimento nos olhos dela era tão palpável que ele não teve coragem de continuar. Não poderia. Já fora algoz de muitas das penas impostas àquela mulher, para penitenciá-la com mais uma - Me desculpa. - ele cobriu o rosto com uma das mãos, a mandíbula tensa enquanto tentava lidar seus próprios demônios. E, céus, eles eram muitos - Eu espero que sim. - a voz dele vacilou, embargada pelo nó em sua garganta - Você é uma ótima mãe.

Nayeon não soube ao certo o que a fez chorar.

O quão carinhoso Taehyung soou dizendo aquilo, o quão maltratado por cada palavra ele parecia, ou o fato de Tae usar o presente para falar do filho que nunca chegaram a ter juntos. O fato é que foi apenas depois de ouvir um soluço dolorido escapar de seus próprios lábios, que Nayeon notou o choro diluvial que lavava seu rosto, e também sua alma.

— Por favor, não faz isso. - havia raiva em seu tom, pois ele não tinha o direito de dizer aquilo, mas também uma dor imensurável. Porque não havia nada que pudesse reparar o passado, e mexer naquelas memórias trazia à tona sentimentos que ela precisava enterrar todos os dias de sua vida - Por favor, Tae...

— Eu sinto muito. - ele arfou, tentando dosar suas palavras para que elas saíssem como deviam, pelo menos uma vez - Porra. - silenciou, correndo os dedos pelos cabelos com força suficiente para fazer doer, e apertando os dentes para tentar manter o tom de voz estável, com muito esforço - Eu sei que dói. Mas eu também sou o único que sabe o quanto dói, Moony. - explicou, e aquela foi a segunda vez que Nayeon o viu chorar, mas a primeira em que não tentou ocultar as lágrimas. Taehyung era, de fato, o único que podia compreender sua dor, porque a sentia exatamente igual - Eu perdi meu filho sem que ele tivesse nome.

Choraram em silêncio pelo que pareceu uma eternidade, separados pela distância de um toque - que naquele momento parecia intransponível. Naquela noite fatídica, perderam um filho. E também a si mesmos, e todo o sonho de uma família. De um futuro.

— Taeyang. - a voz de Nayeon não passava de um murmúrio ao dizer o nome há tanto guardado para os ouvidos de Taehyung, tal qual o enxoval que fizera outrora - O nome dele seria Taeyang.

QUATRO ANOS ATRÁS

— Dra Moon, pode vir aqui um momento?

O olhar da enfermeira era carregado de tanta consternação que Nayeon se colocou de pé no mesmo segundo, a despeito da barriga que já carregava o peso dos quase nove meses. Era uma quarta feira tranquila em que os ponteiros do relógio já corriam em direção às 19h, e não havia como prever tudo o que aconteceria dali em diante. Nayeon revisitou aquela noite uma centena de vezes, e sempre se impressionava com o fato de o tempo, apesar de uma grandeza precisa, ser tão relativo: faltavam 47 minutos para seu turno terminar. Quarenta e sete minutos para ela ter sua vida terminantemente transformada.

VIPERS - Kim TaehyungOnde histórias criam vida. Descubra agora