oito.

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"Love is the most exquisite form of self-destruction"

— Jungkook está aqui. - Nayeon atestou, no instante em que a mensagem do mais novo fez brilhar a tela de seu celular, iluminando a penumbra em que ela e Taehyung se encontravam, usando das sombras para ocultar dos olhos o que, eles sabiam, não era possível esconder de seus poros, que se arrepiavam à presença um do outro - Eu volto já. - avisou, saindo do consultório para abrir a porta que levava à sala de espera.

— Ei, doc. - o sorriso de Jungkook era largo e a postura relaxada quando a trouxe para um abraço de urso, beijando seus cabelos. Era como se toda a tensão do encontro anterior houvesse se dissipado junto do sangue que ele fizera escorrer em algum beco escuro de Incheon, e agora ele agia como se a visse pela primeira vez. Aquilo fez do abraço um lugar hostil, e Nayeon precisou respirar fundo para controlar a vontade que tinha de gritar o quão disfuncional era o comportamento de todos naquela família. Calou-se, no entanto, porque aquele não era mais um problema seu. Afastara-se dos Kim, correndo para o mais longe possível, até que suas pernas e seu coração doessem, até que convencesse a si mesma de que todo e qualquer laço fora quebrado. Seria o bastante, se não carregasse eternamente uma parte deles consigo.

— Ele está bem. - Nayeon deu um passo para trás, esfregando o próprio rosto enquanto a verdade daquelas palavras crescia dentro dela: depois de uma noite de angústia, Taehyung estava bem. - Você vai precisar levar ele ao hospital, em Seul. Viajar com esse dreno vai ser... Uma insanidade. - ela massageou as têmporas, odiando mais uma vez aquele cenário de improvisos perigosos em que fora forçada a agir por eles, mais uma vez - Mas vai... Vai ficar tudo bem. - suspirou, sussurrando aquela verdade não para ele, mas para seu próprio coração aflito.

— Eu sei que sim. - Kookie abriu um sorriso de canto, mas que nem por isso mascarava sua alegria - Você sempre cuidou dele como ninguém, Moon. Esse idiota... Ugh, Deus! Você não imaginaria o tipo de merda que ele fez desde que... - ele parou, baixando os olhos um instante, e quando os ergueu novamente havia ali uma semelhança pálida com o olhar triste do irmão. Nayeon, por sua vez, sentiu os seus queimarem com novas lágrimas e estava prestes a interrompê-lo, porque ouvir aquilo dolorido demais para alguém que testemunhara tão de perto o quão auto-destrutivo Taehyung podia ser - O que eu quero dizer é que ele realmente sente a sua falta. - Kook exalou, com um sorriu, beijando os cabelos negros da mulher com tanto carinho, que seus braços se tornaram novamente aqueles dos quais ela se lembrava: feito irmão mais novo que, mesmo lhe ultrapassando no tamanho, ainda era um garoto.

— Eu posso te ouvir, sabia? - Taehyung surgiu na soleira da porta, apoiando-se nas beiradas com cuidado para não as sujar de sangue. Não queria que Nayeon precisasse olhar para aquilo depois. Um sorriso miúdo brincava em seus lábios como sempre que estava junto de Jungkook, naquela simbiose assombrosa e magnética que fazia deles yin e yang. O sorriso de mais novo era o oposto, largo e aliviado, enquanto se aproximava do irmão, e Nayeon chegou a iniciar o gesto de impedi-lo de pegar Taehyung no colo - como ele parecia prestes a fazer - mas o rapaz se conteve um segundo antes.

— É melhor que você nunca mais faça isso, ou eu mesmo mato você. - prometeu, a rispidez dos lábios contrastando com o riso no olhar.

Taehyung revirou os olhos, socando fracamente o ombro do caçula, e Nayeon sentiu um lampejo de sorriso cruzar seus lábios: ela quase se esquecera do quão bela era a relação deles: um verdadeiro diamante, inestimável e indestrutível, tingido de vermelho por aquele rio de sangue.

— Está tudo certo para voltarmos a Seul. - a voz de Jungkook adquiriu novas cores, um tom prático e conspiratório que fez o estômago de Naeyon revirar: eles eram as víboras, novamente - Tem um jato esperando. - continuou, e Taehyung acenou como se não prestasse realmente atenção, visto que tinha os olhos sobre a mulher que, a alguns passos de distância deles, naquele momento parecia tão distante, como num sonho tão real que era quase cruel - Eu vou... deixar vocês. A sós. - Kook coçou a nuca, voltando-se para a ex cunhada e sorrindo gigante no instante em que ela deixou escapar um suspiro de desistência frente a suas próprias barreiras, abrindo os braços para recebê-lo.

— Se cuida, por favor. - Nayeon murmurou contra o couro da jaqueta de Jungkook, implorando sem constrangimentos - E cuida dele, Kook.

— Foi pra isso que eu nasci, doc. - o rapaz piscou, beijando a testa dela com cuidado antes de se despedir.

E então restaram apenas os dois, ali. Taehyung, Nayeon, e toda tensão tácita que pairava entre eles na iminência do adeus.

— Obrigado. - Taehyung quebrou o silêncio, sua voz tão grave que a mulher a sentiu ressoar dentro do peito, bagunçando todos os sentimentos guardados ali.

— Não precisa agradecer. - ela maneou a cabeça, vacilando antes de dar o primeiro passo na direção dele, para então cobrir o restante da distância olhando para tudo menos para o rosto de Taehyung: checou os curativos e a oscilação do dreno, fungando de quando em quando para conter as lágrimas que nublavam sua visão, protegendo-a da nitidez da verdade: era hora de se despedirem, uma vez mais.

— Nayeon... - Taehyung chamou, sorrindo fraco quando ela respondeu um "hm" pouco convincente, mexendo no selo do dreno que, mesmo sem entender nada disso, ele sabia estar funcionando perfeitamente - Deixa eu olhar pra você. - pediu, e o instante que ela demorou para encará-lo pareceu longo demais, por isso Tae levou uma das mãos até o rosto dela, e enquanto o polegar descansou sobre o queixo da mulher, os dedos alcançaram parte de seu pescoço, fazendo Nayeon cerrar os olhos diante da sensação da mão dele ali, encaixando-se em seu corpo com a propriedade de quem ainda era o único.

Taehyung controlava a respiração, como se aquilo fosse prolongar o tempo que tinha ali, em seu paraíso particular. Ele prestava atenção cada milímetro de sua pele em contato com a de Nayeon, enquanto seus olhos decoravam os detalhes da cena aterradora que era tê-la sob seus dedos mais uma vez: os olhos fechados e a respiração falha, os cabelos que tocavam o dorso de sua mão com leveza o suficiente para lhe levar à loucura, lábios que faziam sua boca secar diante da vontade insana que o corrompia.

Para evitar adicionar mais um erro à sua lista, ele inclinou o rosto, pousando um beijo sôfrego na testa da mulher, que precisou engolir um soluço quando segurou a blusa dele com ambas as mãos, permitindo que as lágrimas que segurou até ali marcassem seu rosto como os lábios de Taehyung faziam com sua alma. No instante seguinte, ele a envolvia no abraço mais apertado que Nayeon se recordava de receber na vida, as mãos se enterrando nos cabelos dela enquanto a trazia para tão perto quanto era possível, para dentro de si. Permaneceram naquele abraço por um infinito que pareceu curto demais, mas quanto tempo é suficiente para aqueles que amam?

— A única coisa que eu consigo pensar em dizer... - ele murmurou contra a pele dela, a voz se partindo em um riso amargo - É a coisa mais cruel que eu poderia fazer com você. - o murmúrio saiu feito um lamento contra a pele da mulher.

Então não diga. - Nayeon implorou num sussurro, porque ela sabia. Céus, sabia sem que ele precisasse dizer uma palavra, porque sentia o mesmo. Sentia tanto, que seus ossos doíam, seu coração se apertava, sua garganta ardia.

Quanto sofrimento cabe no amor?

As palavras proferidas por seus olhos nunca deixaram seus lábios. E quando se despediram, em um silência devastador, só o que se podia ouvir era o som de seus corações partidos.

VIPERS - Kim TaehyungOnde histórias criam vida. Descubra agora