Aquela palavra fica em minha cabeça mesmo depois de eu ter saído correndo da sala de Danilo. Pai. Não pode ser ele. Como que uma pessoa passa dezessete anos da sua vida sem nem conhecer o filho e tem a coragem de aparecer no hospital onde minha mãe está? Danilo me disse que meu suposto pai estará vindo para São Paulo na sexta-feira com o objetivo de me conhecer. Hoje ainda era segunda. Eu tinha dito a Danilo que não queria vê-lo na minha frente, sei que irei falar muita besteira a ele mas Danilo disse que teríamos que conversar. Eu apenas deixei uma lagrima cair e agora estou aqui, novamente chorando em meu quarto. Eu não sei o que falarei com ele, nem o que ele falará comigo.
Todas essas dúvidas correm em minhas veias e as esquentam. Deixo minhas coisas na cama e decido distrair a minha cabeça com um mergulho na piscina. Ponho um short de banho e desço as escadas da casa sem fazer muito barulho para que não notem a minha presença ali, noto que, ao passar pela sala vejo a pequena Sophia vendo desenhos com sua babá. Sou um leve sorriso e vou até o quintal da mansão.
Deixo meus chinelos perto da piscina e sento em sua borda. Minhas pernas em contato direto com a água faz com que meu corpo inteiro fique arrepiado, decido entrar de uma vez. Uma curiosidade sobre mim? Consigo ficar minutos em baixo d'água. Sinto como se fosse o meu refúgio. Fico sentado no fundo da piscina enquanto sinto toda a pressão da água sobre o meu corpo e ali, onde não escuto nem meu próprio pensamento, entro em paz comigo mesmo. Essa paz dura poucos segundos quando escuto um barulho de corpo batendo na água. Abro os meus olhos e ando até a superfície.
Era ele, o garoto que não me suportava. Percebo que o mesmo não sabia que eu estava aqui por conta de estar completamente submerso por bastante tempo.
- Imaginei que você estaria aqui, vi seus chinelos na beira da piscina. - diz ele com um sorriso meio torto no rosto- estou sabendo que acharam seu papaizinho. Irá sair daqui logo né então? - o garoto solta uma risada e começa a nadar para longe de mim.
Eu realmente não tinha pensado nessa opção. Não sei se aguentaria mais uma mudança, ainda mais por uma pessoa que nunca deu as caras para saber como era seu filho.
Vejo Lucas sair da água e passar as mãos pelos seus cabelos, isso me causa uma sensação diferente.
-Lucas, posso te perguntar uma coisa?
Vejo o garoto estranhar com a minha pergunta, mas ele assente com a cabeça e vem até a minha direção. O garoto para a poucos centímetros de mim.
- Por que você me odeia? Sabe, desde o primeiro dia que eu cheguei você me trata com tanto desprezo. Eu nunca fiz nada pra você.
Ele solta uma leve risada.
- Ai, pequeno Matheus - ele bagunça meus cabelos falando em um tom irônico- Você não entende nada das coisas da vida né? Meu pai simplesmente tirou toda a atenção dele de mim para que você tivesse o melhor momento da sua vida aqui nessa casa. Isso me causa certo incômodo. Confesso que no dia que meus amigos estavam aqui eu fui muito escroto com você, talvez um dia eu até peça desculpas por isso. - vejo uma expressão amigável se formar no rosto dele mas logo em seguida ele diz- Mas não sou uma pessoa que faz amigos facilmente.
Nessa semana que eu estive aqui, notei que Lucas sempre tenta chamar a atenção de seu pai de alguma forma, mas Danilo sempre está ocupado demais com seu trabalho e com a escola. Não deve ser fácil para ele também.
- Talvez tenhamos muitas coisas a mais em comum do que você pensa, Lucas- digo baixo para que o garoto dos cabelos escuros não escute.
Decido sair da piscina, e ir tomar um banho, minhas costas doem e eu sei que o dia não está sendo fácil para mim, talvez meu corpo necessite de um descanso. Atendo a seus pedidos e depois de um longo banho quente, ponho um pijama bem confortável e caio na cama, sentindo aquele colchão acolher meu corpo como um abraço longo da noite.
Deixo as janelas abertas para que meu corpo sinta a brisa fria que essa cidade traz junto com sua atmosfera pálida.
Meu corpo finalmente cede ao cansaço e de repente acordo com o despertador tocando, hoje decido que o dia vai ser diferente, tentarei ao máximo me manter firme. Levanto da cama e vou até o banheiro, começo um banho rápido só para me acordar. Saio do banho com a toalha enrolada na minha cintura e vejo Lucas parado na frente da porta.
- Danilo disse que temos que sair mais cedo em 15 minutos o carro sai- ele ia sair do quarto mas para, vira pra mim e diz- pelo menos dessa vez você não esqueceu a toalha.
Eu solto uma risada e fico me perguntando se o garoto que a dois dias estava sendo um completo imbecil comigo, agora estaria tentando ser amigável. Deve ser apenas coisa da minha cabeça mas me visto rápido, pego minha mochila e saio do quarto andando rápido, até que encontro todos já no carro. Entro junto com Sophia no banco de trás e mais uma vez fazemos o mesmo caminho, deixando Sophia primeiro até que chegamos na escola de Danilo.
Vou até o meu armário quando Mariana me para do lado do mesmo. Ela chega com seu namorado, que era mais alto que ela. Ela me dá bom dia e segue comigo até a nossa primeira aula do dia, que pelo visto era Sociologia.
Tento ficar um pouco mais atento nessa aula, pois, além de eu gostar da matéria, não quero pagar o mesmo vexame de ontem ao não saber o que a professora havia me perguntado. Percebo que ver o professor ditar toda a matéria e passar um quadro para copiarmos, o tempo tem passado mais rápido, e minha cabeça, ocupada.
Sem perceber o quanto estávamos entretidos no assunto, o sinal do intervalo toca, e a menina que me trouxe até a sala me chama para ir com ela até a cafeteria para comprarmos algo para ela e o namorado comerem. Eu decido comprar algo também já que Danilo deu dinheiro a todos nós de manhã para que comêssemos na escola, já que não deu tempo para o café da manhã.
A cafeteria era um lugar muito agradável com seu ar mais vintage. Vou até o balcão e peço um chá verde com um sanduíche de queijo. Vejo o olhar de nojo de Mariana quando me vê pedindo chá e solto uma risada. Ao pegar o copo que o barista entrega, faço com as mãos para a garota experimentar.
- Porra isso é bom demais, vou voltar na fila para pedir um também.
Eu fico rindo sozinho por uns minutos até que voltamos para o pátio. Lá, sentamos junto de Manuela e Helena.
- Então, Matheusinho - começa Mariana- vi você na festa ontem. Pena que teve que sair correndo, o clima entre vocês dois estava quente- ela ri e percebo que todos da mesa entendem o que ela quer dizer.
- Clima? Eu e quem?
- Deixa de ser sonso, Matheus. Você e Bruno, óbvio - grita Helena do outro lado da mesa. Eu fico vermelho na hora e lembro da dança na festa.
Eu e Bruno estávamos dançando juntos mas eu não percebi que ele estava dando em cima de mim. Será que o que a Isa e Paula diziam sobre minha lerdeza para saber se as pessoas estavam dando em cima de mim era real?
Eu já tinha ficado com um menino uma vez, e foi tão rápido que eu nem senti nada, só não foi tão rápido para que o namorado da minha mãe na época não visse. Ele me chantageou depois da cena e disse que se me visse de novo com um garoto contaria tudo para minha mãe. Minha mãe nunca foi uma pessoa preconceituosa, mas como sempre foi eu e ela, não queria que nossa relação mudasse. Apenas deixei de lado toda essa história de garotos pro lado.
Eu solto uma risada para as meninas e nego com a cabeça. Continuo comendo meu sanduíche e escutamos o sinal da escola tocar, isso significava que nossa próxima aula iria começar.
- Falando no Bruno, não o vi o dia inteiro - diz Helena.
Verdade, o garoto até agora não deu as caras. Será que ele ficou chateado com a minha "fuga" ontem? Pego meu celular no bolso para ver se tem alguma mensagem dele e nada. O garoto nem mandou oi.
- Ai, estou com tanta preguiça dessa aula de Inglês. Vamos para o lugar de sempre? - diz Mariana enquanto todas as meninas riem e a seguem.
- Você não vem, Mat?- diz Manuela e eu pergunto onde estávamos indo enquanto pegava minhas coisas.
- Quando tem uma aula chata dessas, ficamos atrás da arquibancada dos meninos do basquete. Eles nem ligam e ninguém nunca acha a gente lá, é só irmos bem escondido.
Eu fico rindo por um tempo. Será que Danilo iria ficar muito bravo se me visse matando aula? Mas realmente, a aula de inglês até que era legal, mas o professor era um chato, só de ouvir a voz dele já me dava sono. Sigo as meninas até atrás da arquibancada do outro lado do campo de basquete. Sentamos no chão e todos começam a falar sobre as fofocas da escola. Me lembra muito Alice e aquela capacidade dela de saber todas as fofocas de todos os famosos.
E lá os meninos estão treinando para os jogos regionais. Todos os meninos lá jogando, incluindo Lucas.
Confesso que ver todos aqueles meninos jogando me deu uma sensação diferente. Mas quando meus olhos encontravam um deles, meu coração dizia algo para mim. E esse era Lucas. O que? Matheus. Para com isso. Você não pode gostar mesmo desse garoto, ele vai fazer o mesmo que...
Antes que eu pudesse terminar meu pensamento com memórias obscuras do passado, percebo que lá estava ele, o menino ruivo. Ele sabia que estávamos todos atrás da arquibancada, e não parava de me olhar.
Encaro-o e ele faz o mesmo. Merda. Achei que ele desviaria o olhar. Agora o garoto de cabelos laranjas vem até a minha direção e para na minha frente. Meu coração só faltou pular pra fora do meu corpo.
Ele se ajoelha ficando quase na minha altura.
-Oi, meu nome é Guilherme e o seu?
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Até quando?
RomanceMatheus se acostumou com sua rotina, seus amigos e sua casa. Porém, o que o mesmo não sabe é que de repente, tudo vira do avesso e o medo do amanhã passa a ser recorrente. O garoto, de apenas 17 anos terá que entender como é viver em um mundo comple...