Escutando essa voz vindo de trás de mim meu coração gela. Aquele perfume, o mesmo perfume que eu senti na casa de Rana. Era ele, o ruivo estava parado na minha frente, suas feições eram de tristeza, porém, com um ar de desconfiança. Tudo nesse momento congela, é como se o tempo parasse e só eu e o garoto pudéssemos nos mover. Fito os olhos dele como se soubesse o que ele quer comigo mas mesmo assim o deixo falar.
- Eu vi você com aquele garoto loiro do médio artístico hoje. Tem algo sério rolando entre vocês dois? - diz Guilherme enquanto me olha de cima a baixo. Percebo meu celular tremendo em minha mão mas não dou muita atenção a ele no momento.
- Não sei o que temos exatamente. Confesso que posso ter alguns sentimentos por ele mas só o conheço a uma semana. Prefiro apenas deixar as coisas acontecerem com calma. - respondo mantendo o tom de voz para ele não perceber o quão nervoso eu estava com toda essa aproximação.
Ele chega mais perto de mim e eu encosto as minhas costas na pia, merda, não tem mais para onde fugir.
- Me diz, Guilherme. Por que veio atrás de mim? - minha voz sai falhada mas o garoto apenas ignora. Realmente, esses garotos dessa escola tem um dom de me tirar o fôlego. Ele era bem bonito, um pouco mais alto que eu e seus cabelos ruivos bagunçados caem em sua testa deixando ele muito mais atraente do que já é.
Ele apoia o seu braço na pia e encosta seu nariz no meu. Consigo sentir a respiração calma e confiante dele. Enquanto observo nossos lábios grudarem percebo que eu realmente sou atraído por esse garoto. Apenas continuo o beijo e deixo que ele tome as rédeas. Ele me põe sentado na pia do banheiro e se coloca entre as minhas pernas. É um beijo calmo porém com vontade. Ele explora minhas costas com suas mãos geladas.
Depois de um tempo assim escutamos a porta abrir.
- Theo, está tudo bem? Você não estava responde...- antes que o garoto loiro pudesse terminar de falar ele observa o que está acontecendo e no exato momento sua expressão vai de preocupação para tristeza em segundos. Ele desiste de continuar sua frase e sai do banheiro, com as mãos em seu rosto.
Eu me retiro rapidamente dos braços de Guilherme e começo a caminhar na direção dele, porém, sinto uma mão agarrando meu braço. Me viro com fogo em meus olhos e o ruivo percebe que fiquei irritado com essa atitude dele.
- Eu gostei muito desse beijo, mas nunca mais me agarre assim. Eu não tenho nada com ninguém. - o garoto sorri para mim como se entendesse o que eu estava falando.
- Isso so faz eu me encantar mais por você, Matheus. Mas acho que deve conversar com o garoto. - ele diz enquanto segue seu rumo a sala.
Eu me viro para tentar encontrar Bruno, porém sem êxito. Pego meu celular e vejo as quatro mensagens antes enviadas pelo garoto. Agora quem vai enviá-las sou eu.
- Bruno, a gente precisa conversar. - depois de digitar e perceber que o garoto leu e não respondeu, apenas abaixo a cabeça e vou até a sala de Danilo.
Bato em sua porta umas três vezes antes de escutar a permissão para entrar.
- Entra. Matheus, é você! - meu tio abre um sorriso quando me vê- como estão as coisas? Está gostando da escola.
Não quero transparecer que estou chateado com o que acabou de acontecer.
- Tudo bem sim, só estou um pouco enjoado- minto - queria saber se posso ir para casa, não estou mesmo me sentindo bem aqui.
Danilo se preocupa. Fico com pena de o deixar assim atoa, mas, preciso repor minhas energias.
- Claro, sobrinho. Eu entendo que é muita coisa acontecendo na sua cabeça, as vezes nosso corpo não sabe como reagir. Quer que eu te leve? - nego com a cabeça agradecendo logo em seguida.
Passo na sala para buscar minhas coisas e tento chamar o mínimo de atenção possível, sigo em direção a mansão. Novamente sinto toda aquela brisa do dia no meu rosto enquanto ponho uma música para tocar em meu celular. Chego em casa e noto algo de diferente. Decido ignorar esse pensamento e corro para o meu quarto com o objetivo de achar um short. Queria dar um mergulho na piscina. Acho um show que fica curto em mim pois eram de quando eu tinha 10 anos, porém, como desde lá eu não cresci tanto assim eles cabem. Corro até o primeiro andar e o tempo que eu tenho para por minhas coisas na cadeira é o mesmo que eu tenho para me jogar naquela piscina.
A água sempre me trouxe calma, vou até o fundo da piscina, perdendo bem minha respiração. Lembro quando minha mãe me levava a praia, como nem sempre tínhamos condições financeiras de ir, quando íamos era uma alegria só. É aqui, no fundo da piscina que eu consigo por meus milhões de pensamentos em ordem. Cada linha de raciocínio se conectando uma a outra. Percebo que meu ar está acabando então dou um impulso para superfície. Quando eu chego até a mesma tomo um susto pois noto que Lucas está ali, parado na minha frente todo molhado. O garoto apenas com seu short de piscina me encara e da um sorriso de canto.
- Decidiu fugir da escola hoje também, M? - diz o garoto chacoalhando sua cabeça para dar uma secada em seus cabelos.
- Primeiro, como você chegou aqui e eu não percebi? Segundo, minha cabeça tá tão cheia no momento que eu não tava com paciência para aulas de filosofia. - decido me sentar na escada da piscina e o garoto se aproxima de mim.
- Primeiro, você estava tão perdido lá em baixo d'água que nem me viu entrar. Segundo, se quiser conversar sobre qualquer coisa eu to aqui tá? - ele ri e senta do meu lado enquanto pega um copo com um suco que ele tinha deixado do lado da piscina.
- Lucas, você? Sendo gentil comigo? Ontem você queria me matar e hoje tá se preocupando comigo. - sorrio para ele.
- Fica se achando mais que daqui a pouco volto a ser o escroto- nos dois soltamos uma gargalhada e logo depois minha feição retorna a algo mais relacionado a confusão.
- Eu beijei o Guilherme e o Bruno viu - solto como soltaria o ar na expiração. As palavras saem tão rápidas e os olhos do garoto se arregalam.
-E eu achando que você era santinho- ele ri- mas qual é o problema? Você é o Bruno namoram? - ele pergunta e eu faço que não com a cabeça. - você e o Guilherme namoram? - novamente repito com a cabeça. - então você não tem que se preocupar com o que eles acham ou deixam de achar. Você é solteiro e pode beijar quem quiser. Se um dia tu quiser assumir um compromisso, assuma e fale. E aí sim, traição é péssimo. Se você tivesse namorando com um deles e tivesse feito isso provavelmente eu estaria te batendo agora. Mas entenda o seu momento. Mas também entenda que Bruno vai ficar chateado. Claramente ele gosta de você. - me assusto com a sensatez desse garoto e agora sou eu quem arregalo os olhos para ele.
- e se você quiser algo com um deles agora, fale. Não é bom guardar essas coisas para você - ele termina de falar e da um tampinha nas minhas costas, seguindo seu rumo até a cozinha.
- Quer comer alguma coisa, Mat? - o garoto antes de sair do meu campo de visão grita.
Eu saio da piscina me secando um pouco numa toalha que havia trazido e sigo o garoto até a cozinha. Lá, ele prepara um macarrão com molho branco e eu preparo um chá gelado para nós. Ele faz uma cara de nojo quando vê o chá.
- Você vai gostar eu te juro. - digo enquanto ele assente com os ombros.
Depois de um tempo, o macarrão já pronto e o chá também, começamos a comer. Estava começando a apreciar a companhia do Lucas. Quem diria que ele sem toda aquela carcaça de ferro seria uma pessoa tão legal.
- Tá, você vai ter que me passar a receita desse macarrão. Tá maravilhoso - as palavras saem da minha boca ainda um pouco cheia e ele ri com a cena.
- Só se você me ensinar a fazer esse chá. Eu amei. - eu sorrio e trocamos nossos ensinamentos.
Depois de comer eu lavo a louça enquanto ponho uma música em uma das caixas de som da sala. O garoto me ajuda secando os pratos. Depois disso Lucas me chama para jogar videogame no quarto dele. Eu vou e ficamos a tarde inteira fazendo isso. Confesso que eu sou péssimo nesses jogos e era tão engraçado ver o jeito que ele ficava quando ganhava. Era uma cena muito fofa.
- Porra, Lucas, me deixa ganhar só uma vez- ele faz que não com a cabeça, sorrindo e me dá um tapinha no braço.
Sem perceber o tempo passando, escutamos a porta da sala sendo aberta.
- Merda, Mat. Danilo vai ver que não estamos mal. Corre pro teu quarto, vai! - o garoto me empurra da cama e eu saio correndo em direção ao meu quarto, me jogando em baixo dos cobertores.
Escuto as portas do meu quarto se abrirem e depois fecharem. Recebo duas mensagem no meu celular .
- Quase que nos ferramos - é uma mensagem de Lucas com um sorriso nervoso no final.
Apenas mando um emoji de volta e vou ver de quem é a outra mensagem: Bruno.
- Está aí? - ele pergunta.
- Sim, só peguei meu celular agora. Está tudo bem? - respondo.
- Mais ou menos, não queria ter surtado tanto hoje, me desculpa. Você tem o direito de ficar com quem quiser enquanto está solteiro. - ele digita bem rápido.
- Está tudo bem, ia até te falar isso mesmo. Mas confesso que estou criando algo por você. Só não sei definir o que é ainda. O que acha de amanhã irmos na praça tomar um sorvete? - digito para o garoto.
- Ótimo plano, até amanhã então, Theo - e depois dessa frase um rosto sorridente.
- Até amanhã, Peter Pan- vejo que depois de ler essa mensagem o garoto fica off-line.
Ligo a televisão do meu quarto e deixo um canal de desenhos animados passando enquanto vou até o banheiro para fazer minha higiene noturna antes de cair na cama para dormir.
Sinto a brisa por conta da janela que deixei aberta e caio no sono.
Mais uma vez aquele pesadelo. Está muito mais recorrente do que era. Não queria que fosse assim, Nicolas. Eu te amava tanto. Você foi o único que teve meu coração e o que mais o quebrou. Hoje está difícil me recompor e você foi um dos motivos dessa derrota.
Esqueça pra sempre de mim que tentarei esquecer de você.
Acordo com um pulo com todas essas palavras em minha cabeça, olho para o despertador e vejo que ainda faltam quarenta minutos para ele tocar. Decido desliga-lo e fico um tempo na cama. Olhando para o teto e contando quantas vezes minha vida teve uma reviravolta. São tantas que se eu ganhasse um real a cada vez que algo mudou, eu seria milionário igual o Danilo. Talvez até mais.
Escuto algumas batidas leves em minha porta e a abro.
-Lucas, o que está fazendo essa hora aqui? - digo enquanto ponho minhas mãos em meu rosto sinalizando total sono.
- O que eu devia ter feito desde o início. - o garoto me empurra, me fazendo cair no chão e eu tento gritar, mas nada sai da minha boca. Eu me rastejo até a porta do banheiro, ou ao menos tento. Sinto alguns socos atingindo meu rosto e uns chutes no meu estômago. O garoto que no momento se encontrava em cima de mim estava com o rosto completamente limpo. Não havia expressão naquele rosto. Apenas raiva.
- Isso é pra você aprender a não roubar a família dos outros, seu merdinha. - no momento vejo seu punho chegar perto do meu olho com uma velocidade absurda.
Dou um pulo da cama e percebo que tudo aquilo não se passava de um pesadelo. Estou um pouco suado e ainda tentando controlar a minha respiração. Sigo até o banheiro tomando um bom banho gelado para dispersar e esquecer o que acabou de acontecer.
Término o banho e ponho o uniforme da escola. Depois que o faço, escuto as mesmas batidas em minha porta. Decido ignorar, porém, as batidas retornam.
Abro a porta e lá está ele de novo. Lucas.
- Ei, bom dia, Mat. - diz ele- Danilo pediu para avisar que seu pai chegou mais cedo e está te esperando lá em baixo - ele se vira mas antes que vá ele me olha- boa sorte com ele. Toma cuidado.
Eu esqueci completamente que a sexta feira tinha chegado, e com ela meu pai. Ainda com tantas perguntas na minha cabeça, decido finamente tomar a coragem e descer as escadas.
Danilo se encontra na frente da porta o que me impede de ver quem está na frente, talvez seja até melhor que eu não veja por enquanto. Queria poder me esconder nesse exato momento. Ando até Danilo, porém, no meio do caminho minha mente se desliga do meu corpo e me encontro dando meia volta. Antes que eu pudesse continuar uma voz grave chama meu nome.
- Matheus? Filho?
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Até quando?
RomanceMatheus se acostumou com sua rotina, seus amigos e sua casa. Porém, o que o mesmo não sabe é que de repente, tudo vira do avesso e o medo do amanhã passa a ser recorrente. O garoto, de apenas 17 anos terá que entender como é viver em um mundo comple...