UMA PEQUENA VIAGEM (1951)

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Havia duas coisas importantes - uma, que ela era velha demais; outra, que o Sr. Thirkell a estava levando para Deus. E ele não tinha dado um tapinha na mão dela e dito: "Senhora Bellowes, vamos partir para o espaço em meu foguete e encontrá-Lo juntos".

E era assim que ia ser. Ah, este era diferente de qualquer outro grupo de que a Sra. Bellowes já havia participado. Em seu fervor de iluminar um caminho para seus pés delicados e hesitantes, ela havia acendido fósforos ao descer becos escuros e encontrado seu caminho para os místicos hindus cujos bruxuleantes cílios, estrelados, pairavam sobre bolas de cristal. Ela havia trilhado os caminhos relvados com filósofos indianos ascéticos importados por filhas cm espírito de Madame Blavatsky. Ela havia feito peregrinações às florestas de gesso da Califórnia para caçar o vidente astrológico em seu hábitat. Havia até mesmo consentido em abrir mão do direito a uma de suas casas a fim de ingressar em uma ordem de incríveis pregadores gritalhões que lhe haviam prometido fumaça dourada, fogo de cristal e a grande mão macia de Deus vindo carregá-la para casa.

Nenhuma dessas pessoas jamais abalara a fé da Sra. Bellowes, mesmo quando ela as viu serem levadas na noite, ao som de sirenes, em um camburão preto, ou viu suas fotos, deprimentes e sem romantismo, nos tablóides matutinos. O mundo as havia oprimido e mantido em isolamento porque sabiam demais, era tudo.

E então, duas semanas antes, ela havia visto o anúncio do Sr. Thirkell na cidade de Nova York:

"Venham Para Marte! Hospedem-se no thirkell repousorium por uma semana e depois, vá para o espaço na maior aventura que a vida pode oferecer! Pegue o panfleto gratuito "mais perto de ti, meu Deus". Preços de excursão. Viagem de ida e volta com desconto."

- Viagem de ida e volta - pensava a Sra. Bellowes. - Mas quem ia querer voltar depois de vê-Lo?

E, então, ela havia comprado uma passagem e voado para Marte e passado sete dias agradáveis no Repousorium do Sr. Thirkell, o prédio com a placa que piscava: foguete de thirkell para o paraíso! Ela havia passado a semana se banhando em águas límpidas e apagando a dor de seus pequenos ossos, e agora estava inquieta, pronta para ser carregada no foguete espacial particular do próprio Sr. Thirkell, como uma bala, a ser disparada lá fora no espaço, para além de Júpiter e Saturno e Plutão. E assim - quem poderia negar? - ficar cada vez mais perto do Senhor. Que maravilhoso! Não é que se conseguia senti-Lo se aproximando? Não é que se conseguia sentir Seu hálito, Seu olhar, Sua Presença?

- Aqui estou - disse a Sra. Bellowes, "um elevador antigo em frangalhos pronto para subir pelo poço. Deus só precisa apertar o botão.

Agora, no sétimo dia, enquanto galgava com elegância os degraus do Repousorium, um monte de pequenas dúvidas a assaltava.

- Particularmente - ela disse em voz alta para ninguém, - aqui em Marte, não é bem a terra de leite e mel que eles disseram que seria. Meu quarto parece uma cela, a piscina é na verdade bastante inadequada e, além disso, quantas viúvas que parecem cogumelos ou esqueletos querem nadar? E, finalmente, o Repousorium inteiro cheira a repolho cozido e tênis!

Ela abriu a porta da frente e deixou-a bater, com certa irritação.

Estava espantada com as outras mulheres no auditório. Era como perambular pelo labirinto de espelhos de um parque de diversões, sempre se deparando consigo mesma, o mesmo rosto empoado, as mesmas mãos de galinha e as pulseiras tilintantes. Uma após outra, as imagens de si mesma flutuavam diante dela. Estendeu a mão, mas não era um espelho; era uma outra senhora sacudindo seus dedos e dizendo:

- Estamos esperando pelo senhor Thirkell. Shh!

- Ah - cochicharam todas.

A cortina de veludo se abriu.

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