VIII

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Chegaram finalmente as festividades de Santos Reis. A festa foi ainda maior naquele ano, a escola havia sido entregue com o adicional de uma linda biblioteca doada por Tonho. As prendas das barracas estavam magnificas e podia se ver uma clara competição entre o dono do Pouso Santa Cecilia e o Coronel Pedro. Se um doava um bezerro  rapidamente o outro mandava uma vaca, se havia cachaça por parte de um , frangos eram mandados pelo outro. A disputa provocou uma fartura gigantesca e o boato se espalhou entre as cidades e fazendas da região, a festa estava duas vezes maior que o usual.

   Os dias de festa  passaram , não houve incidentes. A surpresa estava no tímido filho do Coronel  Pedro e D. Lucinda, o menino franzino estava ganhando todos os duelos. Ele era uma atração e tanto, o rapaz que parecia recém saído das saias da mãe vencendo violeiros tarimbados que  passariam fácil por jagunços perigosos. Na ultima noite em todos as barracas, sacadas , bancos e esquinas o comentário era de que o anel, o premio e o titulo iriam para o rapazola.

  O sino batera meia noite e, apesar de não haver muitos concorrentes para o rapaz, havia muitas pessoas no coreto para ouvir os duelos. As disputas começaram cedo, os embates foram longos , causavam duvidas até que se chegasse a uma decisão de quem havia ganho. Na ultima disputa , quando se teve certeza que o menino Antônio saíra vencedor, o relógio batia três horas. 

   Um silêncio tremendo se fez no coreto e arredores e ouviu-se os cascos de um cavalo. Aproximando-se do coreto vinha um sujeito montado em um alazão e com um saco de viola nas costas. Vestido com roupas de tropeiro logo viu-se que era Tonho. Coronel Pedro fechou a cara, Matoso levantou-se do banco atrás do coreto e juntou-se ao patrão, eles não podiam acreditar no que viam. O mulato atrevido voltara a Don Inácio. Muitos ouvintes deram boa noite ao violeiro, ele apeou do cavalo e os filhos do cocheiro de Dr. Calixto tomaram as rédeas de Currupio.

– Boa noite. – Tonho fez uma mesura com o chapéu para os presentes.     – Espero não ter chegado atrasado para o duelo. Quem restou? – Pedro se adiantou , parou a frente de Tonho.

– Devo estar tendo um alucinação! Veja , Matoso se não é o empregadinho petulante de minha esposa? Parece que ele enfim voltou a cidade.

    Matoso olhou para as mãos dele e viu os dedos em perfeição.

– Oxi, patrão. Deve de ser não, aquele lá ficou aleijado, esse moço  tá perfeito que só.

– Boa noite pra vosmecês. Pois ninguém tá enganado não. Sou eu mesmo. Engraçado como o tempo cura, não é?

– Tá procurando trabalho , Tonho? Por isso que veio? – Pedro limpava as unhas enquanto falava.

– Não, – respondeu o mulato. – careço de emprego não. Minha fazenda tem trabalho por demais, vosmecê já deve ter ouvido falar dela, Pouso Santa Cecilia.

  O rosto de Pedro ficou como muro caiado. Então aquele mulato indecente havia voltado e ela era o tal Tonho dono do pouso, o grande tropeiro. O rosto passou para um vermelho de raiva, subitamente.

– Fico feliz que tenha se dado bem na vida. – mentiu Pedro.

– Agradecido. Mas ninguém me respondeu , ainda há com quem duelar?

– Oxi, – respondeu Matoso. – até tem , só duvido que tu consiga ganhar, visse? Se teu pontilhado não te salvou antes , né mesmo?

   Tonho estava firme como uma estátua. Observou Pedro, Matoso e o rapaz com a viola branca . Com um movimento firme tirou o saco com a viola. Pedro, Matoso e mais dois homens sacaram pistolas. Tonho sorriu.

– Que isso, estão com medo de uma viola agora ? – continuou retirando o instrumento do saco. – Se vosmecês querem mesmo continuar com isso é melhor olharem pra trás.

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