É tudo culpa sua

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Pip nunca teve amigos. O máximo que teve foi o rapaz que lhe ensinou a ser um cavalheiro para impressionar uma moça, na época em que ainda vivia na Inglaterra, mas nunca chegaram a ser realmente próximos.

De qualquer forma, não importava agora.

Após a morte de seus tios, teve de se mudar para a casa de um parente distante, sua prima Lorraine, que morava nos Estados Unidos. Boatos corriam na Inglaterra sobre o tipo de gente que vivia naquela terra e, até agora, pelo que o britânico pôde notar, estavam todos corretos. Seus colegas de classe eram mal-educados, rudes, não aceitavam estrangeiros e eram incrivelmente egoístas. Alguns podiam parecer legítimos, mas, na primeira oportunidade que tinham, abandonavam seus amigos em favor de ganhar popularidade, algo que se repetiu com o próprio Damien no passado.

Mesmo assim, Pip sempre tentou se manter positivo. Afinal, ninguém chega à nenhum lugar sendo negativo e medroso. Nenhuma guerra seria ganha se os soldados se acovardassem com o medo de derrota e corressem para o colo de suas mães.

Ah, como Pip gostaria de ter uma mãe.

A mulher, numa época quando era jovem demais para ter qualquer memória, faleceu junto ao marido, abandonando o loiro britânico para ser criado pelo mundo. Não se recordava de seus rostos, nem da mãe e nem do pai, mas tinha esperança, em seu coração, de que eles o amassem na época em que estavam vivos.

Então, sem seus pais, Pip não tinha mais nada além de seu sorriso e sua determinação. Estava certo de que eles não gostariam de vê-lo sofrer daquela forma. Por isso, a cada dia que passava, mesmo em meio aos insultos, golpes, machucados, dor e desprezo, Pip sorria. Ele tinha a determinação para levantar quando caía, pois estava certo que esse seria a vontade de sua mãe, que, com certeza, o amava muito quando ainda em vida.

Dia após dia, as coisas ficavam mais difíceis. A vida se provava estar disposta a transformar a vida do britânico em um verdadeiro inferno. Garotos mais velhos o atacavam em busca do dinheiro de seu almoço, seus colegas de classe o ridicularizavam pelas razões mais banais, o chamavam de francês e o esmurravam e humilhavam quando a brincadeira já não era mais suficiente, e os professores o detestavam sem nenhum motivo aparente, encontravam todas as razões para envergonhá-lo na frente de todos os seus colegas. Só não derrubavam suas notas pois ele ia muito bem nas provas, e ele estava certo que reprovar alguém apenas por não gostar dessa pessoa infringia alguma lei.

Ele não sabia o motivo de o desprezarem tanto, não se lembrava de ter feito nada contra qualquer pessoa daquela escola, mas, seja lá o que tivesse feito, precisava arcar com as consequências. Precisava continuar se levantando.

Havia dias que a vontade de desistir era grande. Dias tão difíceis que ele podia sentir sua determinação e vontade de viver escapando de seu alcance, como tudo que já amou. Dias que desejava pegar tudo que pudesse encontrar e fugir daquela cidade. Para longe da casa de sua prima. Para longe de South Park. Para longe daquele pesadelo.

Mas ele tinha esperança. Esperança de que, um dia, encontraria alguém que não o desprezasse por existir. Esperança de que, algum dia, poderia ter um amigo de verdade.

Então, por mais que soubesse o ódio que receberia por ser visto andando com alguém como ele, não podia evitar de se segurar no pescoço de Damien como se sua miserável vida dependesse disso.

Seu corpo todo doía. Aquela não era, nem de longe, a pior surra que tinha tomado, mas isso não tornava os machucados menos dolorosos. Até quando o moreno colocou-o sobre o sofá, não teve forças suficientes para conter o gemido de dor.

- Dói muito? - ouviu Damien perguntar enquanto se sentava ao seu lado.

- Para ser sincero, um pouco. Mas não se preocupe, eu vou ficar bem. - sorriu torto. - Pode ser um pouco difícil pra fazer as tarefas e o serviço de casa, mas eu dou um jeito. Já passei por isso antes, então não é como se...

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