Cap. 9: A Esperança

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A luz da manhã filtrava-se timidamente pelas janelas da cabana, onde o silêncio era quebrado apenas pelo som da água corrente. Johnny, com as feridas já curadas, mas ainda carregando o peso da noite sem sono, levantou-se lentamente. Os músculos doíam, não apenas por causa das contusões, mas por um cansaço que parecia consumir sua alma. Ele se arrastou até o banheiro, o espelho refletindo um rosto marcado, desfigurado e perdido.

Com as mãos tremulas, lavou o rosto, tentando afastar os vestígios de dor e confusão que o acompanhavam. Ligou a televisão, um eco distante de vozes se tornando sua única companhia. As imagens na tela mudavam rapidamente, mas todas pareciam contar a mesma história de tragédias e assassinatos, as manchetes pintadas em um tom sombrio e cruel. Ele observou por um momento, antes de murmurarem em um tom de desânimo:

— Só passa coisa ruim na televisão, nada de cura de doenças ou coisas boas. Só desgraça e tragédia.

Sem querer ouvir mais, desligou o som e deixou as imagens fluírem, um retrato do mundo lá fora que ele tentava entender. O olhar fixo no relógio da sala, que marcava 8h23min, trouxe uma decisão inesperada. Ele não iria se esconder atrás da máscara e das luvas hoje. Respirou fundo e, mesmo com a vestimenta manchada e rasgada, tomou coragem para sair.

Johnny, encapuzado, fez seu caminho através da porta da frente, os passos ecoando na solidão da manhã. Queria evitar que alguém visse seu rosto desfigurado, um lembrete constante do que havia se tornado. Ao abrir a porta, o ar fresco da manhã o envolveu, mas não trouxe alívio. As árvores que cercavam sua cabana pareciam observar seu movimento, cúmplices silenciosos de suas dores.

Enquanto isso, no outro lado da cidade, uma menina de oito anos chamada Wendy caminhava em direção à escola. Com sua mochila surrada nas costas, ela se sentia como uma sombra entre as crianças que entravam pelo portão, rindo e correndo, despreocupadas. Wendy, no entanto, buscava um refúgio nas árvores que cresciam ao redor da escola, um lugar onde podia se esconder do barulho e da confusão.

Ela contornou a escola até encontrar seu local secreto, onde uma caixa de papelão se tornara seu abrigo especial. Com um brilho de expectativa nos olhos, bateu palmas baixinho, mas não houve resposta. Bateu palmas novamente, e a espera se dissolveu quando um filhote de cachorro, com raças misturadas e um rabo abanando de alegria, emergiu da caixa.

— Bob, como você está?! Tudo bem com você? — Wendy perguntou, enquanto se agachava para acariciar o filhote, seu coração aquecido pela presença do pequeno amigo. Ao olhar para dentro da caixa, viu que a comida dele havia acabado.

— Vou pegar mais comida da escola e trazer para você, fique aqui como sempre! — prometeu, dando um último carinho em Bob antes de partir para a escola.

A inocência de Wendy era um farol de esperança em meio à escuridão que cercava Johnny. Enquanto ela seguia seu caminho, despreocupada e cheia de amor, Johnny se perdia em pensamentos sombrios sobre o que a vida se tornara. Dois mundos, duas realidades distintas, mas com um destino prestes a se cruzar em um momento inesperado.

Johnny caminhou por três longas horas, até que finalmente chegou a uma praça no meio da cidade, um oásis de árvores e bancos desgastados que contrastava com o tumulto urbano ao seu redor. Ele se escondeu atrás da única árvore frondosa, o capuz cobrindo seu rosto desfigurado, sentado de maneira discreta, pois ficar em pé só levantaria suspeitas entre os moradores que passavam. De lá, podia ver a "Escola Municipal Padre Martin Madrazo", um lugar que carregava memórias — tanto boas quanto ruins. Ao lado, uma quadra de esportes exibia sinais de vida, com crianças e adolescentes se reunindo para as aulas de educação física.

O sol ardente do meio-dia começou a esquentar o ambiente, e Johnny, sentindo o calor sufocante sob seu casaco, decidiu abrir o zíper e deixar o capuz cair, revelando um rosto que, apesar de suas cicatrizes, ainda mantinha uma essência de pureza e inocência. Ele observava com atenção as crianças que chegavam, ansiosas pelo sinal que as deixaria entrar na escola.

Noites Sombrias: Volume IOnde histórias criam vida. Descubra agora