Torto nariz do mal

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Quiseram  me  sovar
Quebrar meus  dentes Arrancar-me  a  língua
Porque  falei  sobre  monstros
No meio  dos  gritos  sabe  alguém  que  me  ouviu:
Que  só tinha  começado a  escrever no chão:
Há  monstros.

Diga  você.
Se  há  na  minha  ou na  sua  vida.
Olhe  para  o mundo e  resolva:
Como  pode  ser assim  sem  que  haja  algum  tipo  de  monstro?

Não dá.
Nem  eu, nem  você.
Para  arrastar ele  ao universo  da  inexistência, apenas  negando que  existem.
Pois  há  vorazes  deles, que  nunca  recusam  o melhor  tipo de  ignorância.

Se  há  um,  como negar  vários?
De  todos  os  tipos, qual  dizer  ser impossível?
E  nenhum  dispensa  o melhor tipo  de  covardia.

Uns  homens  dizem  que  monstros  não  existem.
Uns  desistem  de  se  forçarem  a  acreditar  nisso, e  andam  armados, sujos  de  fedor.
Como  se  agradar com  sua  vinda?
Quando chegam, o odor é  inconfundível.
Negar o odor é  negar que  também  estão ali.
E  isso é  loucura.
Mais  fácil  é  tomar  eles  pelos  monstros  em  si.
Mas  como se  exala  perfume, se  se  vive  de  matar monstros?

“Não! Fedem  porque  são imundos. Como  matam  monstros, se  absolutamente  monstros  não existem?”
Os  ignorantes  desconhecem
Os  covardes  negam
E  assim  vão robustos, pesados, gordos.
Muita  comida.
Não lhes  faltam  almas.
Seus  dentes  e  entranhas, seus  pelos  e  garras, se  existissem, como  poderiam  cheirar bem?

Os  matadores  são odiados  não pelo  fedor.
Mas  por seu fedor implicar  que  monstros  existem.

E  só tinha  começado  a  escrever isso.
E  quiseram  me  sovar.
Melhor  assim.
Você  quis  me  fazer numa  mutação, segundo sua  criatividade.

E  quiseram  arrancar-me  a  língua.
Melhor  assim.
Você  me  dizia  que  eu era  livre  para  falar,
mas  me  proibia  de  conhecer qualquer palavra  que  você  desconhecesse.

E  quiseram  quebrar  meus  dentes.
Mas  você  me  forçava  a  ver um  mundo  de  paz,
e  me  ensinou a  me  culpar, com  vergonha  e  medo, fazendo-me  crente  que  o caos  que  sentia  no mundo, vinha  de  nenhum  lugar, senão  de  mim.
E  com  tanta  culpa, com  tanta  vergonha, com  tanto  medo, como  ter paz?
E  sem  paz, como  sorrir?
E  sem  sorrir, para  quê  os  dentes?

Quiseram  me  sovar.
Você  quis  me  fazer acreditar, naquilo que  não  é.
Quiseram  me  sovar.
Você  se  envergonhou do que  escrevi  no chão.
E  nem  quis  ver.
E  quis  me  esconder  do mundo.
Quiseram  me  sovar.
Porque  não  fiquei  em  silêncio.
Você  barganhou seu amor, pelo  meu silêncio.
E  foi  assim  que  eu  descobri:
Existem  monstros.

Você  me  teme.
Eu  cheiro mal.
Você  diz  que  me  ama, e  diz  que  odeia  os  matadores  de  monstros.
Mas  eu sou hoje  um  matador  de  monstros.
Um fedido.

Quer minha  presença,
desde  que  eu use  seus  perfumes.
Você  se  perfuma  e  teme.
Teme  esses  monstros.
Enquanto chacoalha  a  cabeça  repetindo a  si: “Monstros  não existem!”

Teme  esses  monstros,
porque  estão na  sua  sombra.
Teme  esses  monstros.
Porque  sabe  o que  é  um  monstro.

Um monstro  é  você.

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