Pintura de Autor Desconhecido.
Flashback
Ouviu-se o choro de criança por alguns poucos, porém, longos dias, e mesmo que as grossas paredes das grandes salas abafassem os sons, os curiosos e interessados do palácio e da cidade conseguiam ouvir bem os cochichos das fofocas reais. O fato do rei ter um filho fora do casamento era motivo de escândalo para o país, preocupante para a nobreza e humilhante para os Merandus; que não deixariam os boatos passarem despercebidos.
Ela passava a maior parte do tempo com as mãos sujas de giz colorido, já havia pintado sobre tudo que se recordava da casa de sua tia, como as flores arroxeadas plantadas no fundo do quintal, sobre a vez em que brincou rapidamente com o enorme cachorro do vizinho e também, claro, deixou registrado no papel seu favoritismo por seu vestido vermelho bufante, comprido e cheio de babados que se movia com fluidez e graciosidade quando ela rodopiava alegremente enquanto mostrava para todos da casa. Já havia um mês que ela estava ali naquele cômodo, depois de ser deixada pela tia, a garotinha dos cabelos pretos se apegava a qualquer fiasco de lembrança que tinha de sua ex-casa, à noite os guardas em sua porta ouvia o choro pesado e agudo da menina e logo uma criada vinha tentar lhe fazer dormir, tarefa difícil essa que na maioria das vezes durava quase até o amanhecer, quando a pequena era derrotada pelo cansaço. No cômodo a menina passava o dia com uma vermelha, era ela que lhe alimentava, banhava e acalmava nos seus momentos de tristeza e fúria.
As tardes pintando na mesa já tinham cansado Lena que resolveu jogar tudo no chão e começar a traçar suas figuras novamente, deitada no piso frio. A criada que lhe fazia companhia não estava lá aquela hora, às vezes isso acontecia, mas Lena sabia que ela voltaria, pois, se não, sabia o que fazer para a trazer de volta: abriria o berreiro. Já passava do começo da manhã, seu copo de leite já estava frio e ela ia comendo, como de costume, devagar seu pedaço de bolo enquanto se divertia em seu próprio mundo.
Concentrada em sua tarefa Lena não vê o menino sair de dentro do fundo falso da parede.
— O que quê você está fazendo? Ele diz parado à sua frente.
Ela olha para ele com dúvida. — Pintando, ué.
Ela só recebe de resposta um olhar curioso dele.
— Eu não sabia que tinha uma sala para crianças pintarem. — Observando a sala cheia de pinturas e desenhos.
— Mas eu fico aqui, o dia todo. — A frase de Lena se alonga como uma canção infantil, seguido com seus braços bem abertos para demonstrar ao menino o tanto de tempo que ela passava fazendo aquilo. Ela pega seu último desenho do chão e mostra para ele. — Viu.
— Que desenho feio — Ele diz depois de analisar.
— Não é, não. — Ela esbraveja.
— Eu vou te mostrar como se faz — Ele pega algumas cores de giz do chão e vai em direção a parede da sala onde começa a desenhar alguns rabiscos, não tão bonitos quanto o de Lena, mas mais precisos.
— Olha, é assim que se faz um sol de verdade.
Lena segue acompanhando ele ao seu lado desenhando na parede, mas do seu próprio jeito.
— Porque você está aqui sozinha? — Ele solta.
Ela parou um pouquinho para pensar colocando a mão em que segura um giz azul no queixo, analisando sua obra na parede branca. — Estou esperando minha tia voltar.
— Há! — Ele exclama baixinho. — Enquanto ela não vem você podia ser minha amiga, não é?
— Sim! — Ela diz sorrindo para ele. — A gente pode brincar de pega-pega enquanto ela não chega.
— O que é isso?
— É fácil, olha eu te ensino, primeiro você corre e eu te pego daí tá com você.
— Entendi — Em um gesto rápido ele encosta no ombro dela. — Te peguei!
— NÃO! — Ela esbraveja. — Eu tenho que correr primeiro, entendeu.
Correndo os dois pelo quarto, eles brincam por um longo tempo, ele mais rápido, conseguia pega-lá mais vezes, mas não que ela se incomodasse muito com isso, a tanto tempo não brincava com qualquer criança que qualquer ato de brincar já lhe tirava um sorriso. Dos dois.
— Olha, bolo. — Ele diz olhando para o prato e imediatamente enfiando-o na boca.
— Hey, isso é meu. — Lena diz subindo e pulando no sofá. — Se você ficar aí vai ser pelo fogo.
— Eu já tô cansado, não quero mais brincar disso. Já sei, a gente poderia ir lá no meu quarto e pegar meus brinquedos, eu tenho um monte deles.
A ideia de brincar com brinquedos de verdade é tentadora demais para Lena que aceita sem demora.
— Então vamos. — Ele diz
— Mas como você passou pelo monstro — Ela sussurra para ele indicando a porta.
— Eles não me pegam, eles têm medo do meu pai. E eu não vim por ali, vim por lá. — Ele diz indo em direção a parede onde escondia uma passagem secreta de emergência do palácio. — Vem rápido, eu vou mostrar todos os meus brinquedos e...
Antes que Lena chegasse a meio caminho dele a porta se abre em um estrondo forte assustando os dois pequenos.
— Então é aqui que fica o esconderijo da rata? — Ela diz com seus olhos ferozes em cima da menina. Junto com ela também está a criada que esteve com Lena durante os últimos dias. — Pegue essa rata e suas coisinhas, e jogue ela em uma vala, de onde ela nunca deveria ter saído. — Elara pronuncia suas palavras para o Arven de plantão na porta, sem tirar os olhos da menina atônita a sua frente com os lábios quase transparentes de tamanho pavor, o menino encostado na parede ofega com o que vê, sem fazer um mínimo barulho sequer.
— Maven, venha aqui. — Ela agora encarando o menino que corre assustado para atrás da mãe.
A sentinela vai em direção a Lena que se apavora com a presença dele vindo em sua direção e grita de pavor, ela tenta se esconder inocentemente embaixo do sofá, mas é puxada pelo pé para fora abruptamente, onde ele a segura pelos braços enquanto ela se sacode tentando se livrar das mãos dele que a apertam. Ela grita, chora e luta inutilmente contra o guarda que com um gesto simples a leva para fora do cômodo.
— O que está acontecendo aqui? — Tibérias num tom alto e bravo o bastante para que todos e até quem não estavam ali ouçam.
— O que está acontecendo é que eu estou resolvendo esse probleminha que você criou de uma vez por todas. — Elara diz se voltando para ele.
— Quem decide o que fazer ou não sou eu. Você não manda em nada aqui. — Ele diz gesticulando com as mãos. — Solte a menina agora. — Ordena para o Arven, que a solta no chão imediatamente. Lena colando os joelhos no peito chora aos soluços).
— O que vai fazer então, em? Vai ficar criando as escondidas essa criança enquanto todos riem de mim? Eu não vou permitir isso. NUNCA. — Elara controla a respiração e tenta se manter mais calma o que para os olhares ao seu redor não adiantou muito. — Ou você dá um fim nela agora..., ou eu dou.
— Você que ouse descumprir minhas ordens.
— Eu só não ouso, como vou, pois, se essa ratinha — ela aponta o dedo para a menina no chão — não for eliminada — Ela diz chegando mais perto do rei e gesticulando muito bem seus lábios e cerrando os dentes. — até quando vai durar até aparecer outro bastardo de todas essas putas que você com...
A frase não chegou a ser concluída antes que a mão pesada dele estralasse em sua face. Tibérias só percebe a gravidade da cena quando seus olhos passam rapidamente pelo menino com os olhos bem fechados, agarrado às pernas da mãe. Com a confusão e a gritaria muitos guardas vieram ver o que estava acontecendo e isso adiou a retaliação imediata da rainha.
— Você ficou LOUCO? — Ela vira a cabeça devagar colocando a mão direita na bochecha que já criará um hematoma.
— Saia daqui a agora e leve seu filho. — Ele diz, se referindo ao Maven.
Não demora muito e ela pega o filho pelo braço e sai cheia de fúria e ódio, ela não esqueceria isso por muito tempo, se um dia esquecesse. Com certeza, ela iria se vingar.
— Você — ele diz para a vermelha que cuidou de Lena — pegue a menina e a acomode em lugares decentes, acabei de mudar meus planos, ela vai ficar aqui.
Vindo do fundo do corredor e de uma aula complicada com seu tio, Cal observava a briga de longe, até chegar receoso até a pai.
— Cal — Tibérias ainda sério, mas com uma voz mais amena coloca a mão nas costas do filho mais velho. — conheça sua mais nova irmã, Lena.
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A Rainha Vermelha I Fanfic A rainha Vermelha
RomanceDepois de várias gerações de Calores sem uma nascida mulher, Lena se descobre, ainda pequena uma bastarda que carega esse poderoso sangue nas veias. Em uma de suas idas e vindas Mare conhece Lena, a meia irmã dos irmãos Calore, e descobre que ela...