Matéria Escura

Capítulo 2 - Barco à deriva

Em algum ponto do espaço entre Plutão e a nave Yuri Gagarin, uma cápsula migratória se movia à deriva na esperança de encontrar o caminho de volta:

– Missão para controle! Alguém na escuta? Repito, missão para controle! Alguém na escuta? Aqui é Marcos falando da cápsula migratória espacial BGBR-97. Já deixei o posto de monitoramento em Plutão e necessito das coordenadas para retornar à nave.

Já era a quarta mensagem que Marcos deixava para seus companheiros de equipe, e mesmo que o sistema de comunicação das naves registrasse os recados que não fossem lidos ou entregues, o simples ato de falar o ajudava a se manter tranquilo e focado.

Nativo de uma vila no interior da Itália, Marcos De Angelis havia tido uma juventude turbulenta, caracterizada por confusões constantes no colégio em que cursou o ensino fundamental. A partir do momento em que ingressou no ensino médio, focou suas energias nos estudos e conseguiu ingressar na agencia espacial terrestre onde seu espírito arruaceiro foi canalizado em ações de campo. Acabou por se tornar o melhor explorador de que se tinha conhecimento, adentrava planetas sem se preocupar com o que o esperava, ganhando a fama de inconsequente e egoísta, pois não pensava no restante da equipe que trabalhava com ele. Mesmo assim, era sempre o primeiro escalado para as missões quando disponível.

Agora cruzando a imensidão negra dos céus de Plutão, havia começado a se preocupar com a ausência de resposta por parte de sua equipe. Havia a possibilidade de fazer o retorno sem o auxílio da base de controle, e embora fosse uma manobra razoavelmente fácil, não queria correr um risco desnecessário. Poderia esperar um pouco mais pelo estabelecimento do contato.

– Marcos, aqui é Tsu. Contato restabelecido. Há um problema com os leitores do painel, então tente fazer a subida o mais rápido possível. Estarei enviando as coordenadas de seu retorno para o computador de bordo da cápsula. Boa viagem, Dorothy, te vejo no Kansas.

Apesar do comportamento egoísta de Marcos, Tsu e ele mantinham uma relação de extrema amizade. Ela era o equilíbrio para o ego incalculavelmente inflado do explorador. Trocar referencias de filmes e livros clássicos era uma brincadeira que os dois adoravam fazer, devido aos gostos parecidos dos dois. Era impressionante como as verdadeiras obras de arte do cinema e da literatura mundial tinham o poder de perdurar por notáveis períodos de tempo.