Nunca pensei que em meus 26 anos iria me sentir como uma criança de 12 anos que acabou de ser rejeitada pela sua paixãozinha.
Era estranho estar sem alguém depois de cinco anos. A cama parecia vazia, a casa parecia enorme, a dispensa parecia ter comida demais, o guarda-roupa tinha espaço demais. Tudo parecia estranho, quase desconexo.
A verdade é que não sabia viver mais para mim mesma. Eu conheci o Heitor enquanto fazia faculdade e tê-lo era reconfortante até chegar a amá-lo. Amar caiu na rotina, amar me tornou cega para não enxergar que o tempo todo estava me traindo.
Eu acho que faz parte. Minha mãe sempre me fez acreditar que nada acontece por acaso. E esse tempo com o Heitor tem alguma coisa a me contar só não sei o que e nem quando vou descobrir isso.
Nesses dois últimos dias de Fevereiro tentei arduamente juntar os meus pedacinhos, um por um, para voltar a ser a Maria Fernanda de antes. Era o que eu queria, mas sabia a verdade mesmo que estivesse enterrada no meu coração.
Eu jamais voltaria a ser aquela mulher de novo.
Não poderia ser a mesma que se apaixonei pelo Heitor. Já passei por isso. O que aprendi com toda essa zona?
Definitivamente ele me aproximou mais do divino, vamos chamar assim porque não sei no que acreditar, atiçou minha curiosidade e arrisco dizer algumas palavras para o cara lá de cima agora. A maioria das vezes é só um “obrigada” porque não sei como conversar com ele.
Além disso, aprendi a ter paciência, perdoar e a me doar — mesmo que ao extremo as vezes —, e ele me deu uma dose de amor próprio mesmo que pequena. Agora cabia a eu mesma pegar essas coisas e continuar.Depois de dois dias enclausurada em casa sem responder e nem atender ao telefone resolvi dar sinal de vida aos meus pais primeiramente.
— Você nos deu um susto, Maria Fernanda! — Minha mãe me repreendeu e só concordei porque não era hora de discordar. — Seu pai está enfurecido, mas creio que seja mais com o seu ex.
— Ele não é nada meu.
Parece bobo, mas não queria juntar o pronome meu com a palavra ex na mesma sentença. Ali tinha um sentimento de posse e eu não queria possuir ele de maneira alguma.
— Tudo bem. — Ela concordou com a minha ideia. — Foque em você, querida. Você pode se especializar ainda. Você é nova e ainda tem uma vida inteira pela frente. — Tive a impressão de que ela engoliu em seco como se estivesse prestes a chorar. — Lembra quando dizia que queria ajudar a todos? — Não respondi, apenas concordei com a cabeça já sentindo o nó em minha garganta. — Você pode fazer isso, só se lembre de quem você é.
Além de avisar meus pais, mandei mensagem para os meus dois melhores amigos, Emília e Boris. Apenas dizendo que estou bem, era isso que importava.
— Eu vou amanhã. — Comuniquei à uma Emília histérica no telefone. — Meus dias da autopiedade foram ontem e hoje. Amanhã uma nova Mafê vai surgir e por isso chegarei só um pouco atrasada.
Tinha marcado horário do cabeleireiro logo cedo. Quero me tornar a mulher que quero ser. Sem mais desculpas.
— Tudo bem. Então a gente se encontra depois do serviço, pode ser? — Propus vencida por um Boris insistente.
Ele disse que queria me ver e não ficar só trocando mensagem, ok, eu aceito isso. Ele estava viajando muito por causa da sua nova vida atlética além de aluno, era treinador também. Então fazia um bom tempo que não ficava a toa com o meu melhor amigo. E sempre foi algo que me fez bem. Por que não?
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Alguém que te transborde (Completo)
Short StoryMaria Fernanda se encontra em um novo mundo. Depois de cinco anos se doando alguém, descobre que essa pessoa se doava para ela e mais algumas outras, muitas. Juntando os cacos para ir em busca da sua vida. Viver sozinha parece algo tenebroso no com...