De Moto - Conto 01

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DE MOTO

Por Ivo Canal - (novembro/2014)

Estavam brigados. Raquel estava muito brava com Carlos, ele fora um idiota. Não precisava ter feito aquilo, infantilidades masculinas... Raquel teria de dar um jeito de arrumar as coisas, mas não sabia como. Já ele não queria nem falar sobre, acima de qualquer coisa, queria não ir naquele encontro, sabia que havia feito bobagem.

Naquela noite teriam de pegar estrada para resolver o problema em que Carlos os metera.  Bem que queria cancelar, tudo, dizer que não iria, mas ela insistia em dizer que queria resolver as coisas olhando olhos nos olhos ... Mulheres são assim, quando resolvem...

No início da noite, Carlos passou na faculdade, de moto e a pegou. Ela deixaria o carro no pátio. Teriam o tempo das aulas para irem, resolver os problemas e voltarem. Pouco mais de quatro horas para resolverem suas vidas. Ninguém poderia saber de nada. Tudo tinha de se resolver antes do fogo se alastrar. Não poderia haver acidentes, não poderiam haver falhas, ou as coisas se complicariam ainda mais para o lado de Raquel.

Capacete na cabeça, saíram. A primeira para baixo, o resto é para cima. O ronco da moto, o vento no rosto penetrando pelo capacete, o frescor daquela noite após um dia quente... Ela queria dizer algo, mas, a propósito, ele não ligou os comunicadores de capacete. Fazia não ouvir através do vento e dos capacetes. Ela gritava para ir mais devagar, mas sabia que o tempo estava apertado... não adiantava gritar...

Ficaram quietos, penetrando no silêncio da noite fria. Carlos sentia o corpo de Raquel atrás do seu, suas pernas a se envolverem. Ele colocou a mão esquerda na pernas de Raquel, mas ela a tirou gritando: - Mão no volante mocinho!!  ... mais nada de palavras...

Para quem viaja de moto sabe, existe a regram dos 150 km, ou, das 100 milhas. Isso significa que a cada 100 milhas, ou 176 km, o motociclista tem de parar e descer da moto. É uma regra fundamental. Se relaciona com reflexos e segurança. Esta regra não pode ser quebrada mesmo em casos de emergência como aquele. Assim, pararam... São quinze minutos, no mínimo.

Naquele ponto da estrada havia um lindo jardim, a direita da pista. Uma área gramada, que descia em relação ao nível da pista, onde podiam parar, descer, esticar as pernas. Já era noite e os carros passavam iluminando a pista com seus faróis direcionais. Mas o jardim ficava em uma curva, os faróis dos carros batiam do outro lado da pista. A lua os iluminava o suficiente para se verem, mas não para quem passava, mal se notava que ali estava um casal e uma moto. 

Desceram em meio ao gramado, capacete no retrovisor, ele tirou a jaqueta.  Ela já estava fora da moto. Ainda brava. Tirou o capacete e o entregou. Nada falavam. Em 15 minutos iriam prosseguir, preferiram se calar.

Ele se apoiou na moto, cruzou os braços e se calou. Carregava a culpa de seus erros.

Com as mulheres nada funciona como planejado, a surpresa o tomou naquela noite. Ela se aproximou de Carlos  dando-lhe tapas.

      - Estou com ódio de você. Ele é meu marido, você tem de aprender a respeitar a relação dos outros! Nunca mais interfira!, ela gritava, chorando.

Ele se calou. Ganhou mais tapas. Sabia que ela estava certa. Não cabe ter ciúmes do esposo. "A gente começa comendo a esposa do cara, e quando vai ver, é o marido que está comendo nossa amante! Ninguém acredita que possa se desequilibrar, mas quando vai ver, já está no chão!" Carlos  pensava...

Relacionamentos são como viajar de moto. A gente tem prática, acha que tudo estará bem, mas se distrair pode pegar uma poça de óleo e zaz, para o chão. O pior muitas vezes nem é o tombo, mas os outros... Um carro que venha atrás pode pegar o motociclista e o machucar muito mais que o tombo em si. Assim era aquele situação. Carlos  derrapara e caíra, caíra feio, e agora não sabia como se proteger de quem vinha atrás... Tinha o marido dela, sua esposa, a família a situação toda...

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