Ato 03.

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Alice logo percebeu que nada seria tão fácil quanto parecia. A julgar pelos danos que podia perceber pela cidade estivera inconsciente por muitas horas, talvez dias. A premissa de que a prefeitura fosse um local seguro e talvez uma base onde sobreviventes do caos que se instalava estivessem reclusos logo se desfez. A linda mulher loira de olhos azuis viu-se diante de mais de dez zumbis logo ao abrir o enorme portão de ferro que guardava majestosamente a entrada do prédio. Ao que parecia aqueles eram os pobres sujeitos com a mesma ideia que ela.

Alice já estava com a pistola empunhada quando ouviu o som de disparos que lhe pareciam ser de uma metralhadora. Os zumbis diante dela caíram instantaneamente e então ao olhar para sua direita a mulher viu o jovem de cabelos castanhos e pele bronzeada que utilizava o uniforme negro de soldado empunhando a arma que ouvira atirar. O mesmo sinalizou para ela e gritou.

—Hey, você, dê a volta pelo corredor lateral, nos encontre nos fundos se quiser viver. Eles estão por toda parte, podemos nos ajudar!

O rapaz estava claramente assustado e nervoso, não era para menos naquela situação. Quase ao mesmo tempo em que ele falara com ela uma outra voz gritou ao longe. O sotaque não era americano e sim claramente era um russo que estava gritando. “Venha cá! Vamos sair logo daqui!” – disse o outro homem. O jovem de cabelos castanhos correu seguindo a voz e desapareceu atrás de uma moita de arbustos nos jardins da prefeitura. Contudo, antes que o mesmo desaparecesse Alice pode ver o logotipo que conhecia perfeitamente em suas costas, o logotipo da Corporação Umbrella, a empresa para a qual ela mesma trabalhava e que também aparentemente a havia deixado na cidade para morrer. Acima do logotipo havia um nome escrito em letras brancas: Oliveira. Era um agente da U.B.C.S., um dos grupos de contenção da Umbrella. Diferente dos agentes da U.B.C.S., outros agentes não eram identificados, como os aqueles que pertenciam à U.S.S., por exemplo, os mais habilidosos, audazes e temíveis em suas áreas. Encontrar alguém da U.S.S. era a última coisa que Alice desejava.

Não havia dúvidas, os momentos finais da cidade de Raccoon haviam sido declarados. A Umbrella jamais enviaria aqueles agentes se não tivesse a intenção de recolher algum objeto ou arquivo da cidade antes da “esterilização” começar. Com certeza a cidade tinha poucas horas e se a mulher não fosse capaz de dar o fora logo, com certeza iria fazer parte das ruínas que logo tomariam todo o lugar. A mulher pensara em seguir por onde o jovem da U.B.C.S. fora, mas sabia que eles não tinham ordens de levar qualquer civil com eles e ela não podia se identificar como membro da corporação, afinal, dada a situação em que acordara, seu posto provavelmente já deveria ter sido rebaixado, isso se ela não fizesse parte da lista de alvos a serem eliminados pela própria equipe que acabara de encontrar.

Alice já pensava em como entrar quando o clarão dos faróis de um carro em alta velocidade a fizeram pensar mais rápido que nunca. Tudo aconteceu em poucos segundos. Com um salto rápido para frente e mulher foi parar nos pés da enorme porta dupla de entrada da prefeitura enquanto um carro desgovernado se chocava contra o portão onde ela estivera próxima. Agora tudo estava mesmo mais complicado. O veículo explodira de imediato e o barulho e o clarão logo atraíram a atenção dos diversos mortos que caminhavam pelas ruas por centenas de metros. Vendo o perigo que se aproximava Alice colocou-se em pé e atirou três vezes contra a fechadura, mas aparentemente os tiros de pistola não abririam aquela porta. Dando a volta para o lado a mulher atirou em uma janela, estava um pouco alta, mas apoiando-se em uma estátua do jardim a mesma conseguira saltar e agarrar-se na borda. Ao olhar para baixo a visão revelara um perigo muito maior do que ela imaginava. No mesmo jardim onde estivera poucos segundos antes, mais de vinte canibais rosnavam com fúria, furiosos pela incapacidade de saltarem e a agarrarem para então devorá-la. Por um breve momento a mulher deu graças aos céus pelas funções motoras daqueles seres ser tão limitada.

Dentro da prefeitura estava o caos completo. Se o inferno existisse certamente seria aquilo – pensou a mulher. Haviam corpos por todas as partes pelo chão, muitos deles com tiros na cabeça, outros simplesmente mutilados até a morte, faltando membros, órgãos ou simplesmente em pedaços. As paredes e o piso estavam banhadas em sangue e a julgar pelas roupas a maioria ali eram funcionários ou civis. Havia corpos de alguns poucos policiais, mas ao que parecia não demorara a perderem o controle da situação. Certamente não haviam sobreviventes.

Mesmo assim a mulher vasculhava todas as gavetas sem trancas e corpos de policiais por onde passava, qualquer munição seria útil. De repente algo diferente lhe chamara a atenção, era um rastro de sangue pelo chão do corredor, um rastro longo, como se alguém tivesse sido arrastado por um longo caminho por ali. Aquilo era estranho, não era o padrão dos meio-vivos que ela vira antes. Eles simplesmente atacavam e devoravam o que podiam das vítimas, aquele era um padrão de caça, como um predador que arrastava uma vítima para se alimentar sozinho ou utilizá-la como isca para abater outros posteriormente. As pupilas de Alice se contraíram com o pensamento que lhe viera à mente e ela sentira um arrepio que tremera de sua nuca aos pés. Aquele monstro que a atacara na loja de armas claramente era uma das armas bioorgânicas da Umbrella, mas aquilo diante de seus olhos naquele momento era algo totalmente diferente. As cobaias – pensara – as cobaias que eram mantidas aprisionadas no laboratório subterrâneo, o mesmo laboratório que ela deveria proteger a entrada. As cobaias haviam provavelmente escapado. Todo tipo de monstro com as mais diversas funções, sendo a maioria localizar e eliminar. Contudo, grande parte desses monstros ainda não estavam sob controle, eram apenas feras indomáveis e vorazes.

Alice amaldiçoou a si mesma por recuperar suas memórias. Seu coração batia acelerado e ela agora temia encontrar uma daquelas criaturas. O corredor lambuzado de sangue parecia mais sombrio, mais silencioso, o cheiro da morte entrando à força por suas narinas. O tempo todo, cada segundo parecia que ela sentia a respiração do predador aproximando-se por trás. Não era nada, era apenas medo.

A mulher quase vomitou o próprio coração quando o barulho de um ruído atrás de uma porta lhe trouxera de volta ao mundo real. Era estática, o som de um rádio. Abrindo a porta lentamente a mesma entrou na sala, haviam três daquelas pessoas mortas que andavam, as três foram eliminadas facilmente com tiros certeiros entre os olhos e na testa. Felizmente a perícia da mulher com armas de fogo era perfeita e aqueles eram alvos lentos. O que vira lhe deu um pequeno ponto de esperança, um rádio de comunicação com uma voz que chamava do outro lado. Apanhando rapidamente o fone a mesma respondeu.

—Aqui é Jennifer O’neil, estou presa na prefeitura, por favor, preciso de ajuda.

Claro que dar seu nome verdadeiro seria um erro. Se Alice tivesse mesmo sido descartada pela companhia para a qual trabalhara, bastava que uma breve notícia sobre estar viva vazasse para que um sem número de agentes surgisse em seu encalço para eliminá-la. No calor daqueles acontecimentos ninguém iria parar para averiguar um nome e qualquer nome que inventasse serviria. Além disso, ela precisava saber quem estava do outro lado da linha, aquela tênue linha que poderia significar sua escapada ou sua morte na cidade condenada. Em meio aos chiados uma voz lhe disse as palavras que ela precisava ouvir para que a esperança novamente inundasse e pulsasse por suas veias.

—Quem fala aqui é Leon S. Kennedy, estou bem longe de onde você. Sou policial, pode confiar em mim, acredito que sei como pode escapar por um caminho mais próximo de onde você está, mas terá de ser rápida e esperta, acho que logo a coisa por aí vai ficar bem feia.

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