Capítulo VI

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Éramos cinco na carruagem, Baakir estava em cima do cavalo e todos os outros estavam
atrás, o sol batia no meu rosto, estava quente, conseguia ouvir o som do vento colidindo
com as folhas das árvores, Kellan estava sentado ao meu lado esquerdo e Ashia no meu
lado direito, a nossa frente estava Kiros e Amai, estávamos em um silêncio que parecia
eterno. No começo da viagem eu expliquei pra todos o que aconteceu, desde o sonho ao
que descobri.

- E agora, para onde vamos? - Perguntou Baakir.

- Para as nossas aldeias - respondeu Amai.

- Não, precisamos ir para outro lugar, minha Avô quando apareceu em  meu sonho disse que eu precisava ir para Kaneia.

- E nós vamos seguir os conselhos da tua avô que apareceu em teu sonho? - Perguntou Amai .

- Eu sei que não acreditas, mas no fundo sabes que foi real.

- Olha, eu acredito nos sinais dos deuses, então eu vou para Kaneia com a Afro - disse Kellan.

- Eu também irei - disse Kiros.

- Uma vez eu também tive um sonho com meu falecido avô, me caguei todo. Aquilo foi
de loucos, acho que os deuses tentaram se comunicar comigo, mas desistiram porque
eu me borrei todo - Disse Baakir - mas eu acredito nos sinais dos Orixás, vou contigo Afro.

- Vocês só podem estar a brincar - disse Amai.

Estava admirada com a nossa decisão.

- A culpa não é nossa se você não acredita nos Orixás - falei eu meio exaltada.

- Vocês acreditam em deuses que nunca existiram - Disse ela.

já estava a ficar nervosa pois detesto quando alguém blasfema contra nossas crenças.

- Então me diz qual deus existe?

- O Deus cristão, foi ele que criou o universo e os homens, ele é perfeito, todo poderoso,
criador do céu e a terra, li isso em um livro chamado Bíblia, esse livro existe a milhares
de anos e homens que vieram antes de nós adoravam-no.

- Se o deus cristão é perfeito, então me responda: Como um ser perfeito dá vida ao
homem, um ser imperfeito, isso não tornaria Deus imperfeito? – Perguntei.

Amai ficou calada, não me respondeu.

- Parem de discutir, Afro, por que vamos para Kaneia, o que tem lá? - Perguntou Baakir.

- Eu não sei ao certo, minha avô me disse que lá eu encontraria uma das coisas mais valiosas do universo, eu não sei o que é.

- Machado de Xangô - Disse Kellan.

- Machado de Xangô? Não, ouvi histórias sobre o machado de Xangô estar no mundo
dos homens desde que eu nasci, muitos homens procuraram e morreram tentando -
Disse Baakir. - Aliás, por que Xangô? Por que não um outro Orixá?

- Porque Xangô é o Orixá da justiça, explicou Kellan - e entre todos aqui, Afro é a única
que luta pela justiça, desde o dia que a conheci pude notar que ela é contra o torneio
Oxum, afro não aceitou nem beber água no reino, nem comer, porque achava injusto
uns comerem e outros não. Por isso ela foi escolhida, ela é filha de Xangô.
“Kaô Kabecilê” essa é expressão que usamos para saudar Xangô quando vem a terra, ela
significa “ venham saudar o rei “ e Xangô ilumina a terra com sua luz, oiço sempre
vocês falarem sobre os olhos da Afro, eles iluminam e encantam, assim como a
presença de Xangô. Xangô possui um machado chamado “Oxê” é um machado com
duas faces, por causa de sua inclinação guerreira, paralelamente, o domínio dos raios e
dos trovões, Xangô espelha fogo pela boca, apesar de ser guerreiro e violento, ele se
preocupa sempre em ser justo, exalta os oprimidos e destrói os opressores.

- Nem eu própria consegui analisar tudo dessa forma - disse eu admirada com a explanação de Kellan.

- Agora que tudo faz mais sentido, vamos procurar um lugar seguro - disse Baakir.

- Não existe lugar seguro, o mundo é o lugar mais perigoso do mundo - falou Kiros.

Não paramos, continuamos a viagem, o tempo foi passando, anoiteceu, durante esse
percurso todo notei que minha melhor amiga não havia dito uma palavra se quer, estava
em um canto calada o tempo todo, Ashia não era assim, senti logo que algo a estava a
incomodar.

- Ashia! - Chamei por ela, parecia não me ouvir - Ashia! - Gritei mais alto.

- O que foi? - Perguntou ela.

- Por que estás tão calada, o que se passa?

Ashia ficou em silêncio de novo, então olhou para mim.

- Quando vocês estavam a lutar contra o guerreiro das sombras, Kiros acertou o Colete
dele, no seu peito tinha uma marca, uma espiral.

- Sim eu vi - respondi.

Ashia levantou as mangas de seu traje, estendeu os braços para todos vermos, era a
mesma espiral no braço dela, igualzinha, logo, lembrei da história de seu irmão abandonado.

- Acho que ele é meu irmão.

- Como assim? Pensava que na tua aldeia não entravam homens - Disse Amai.

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