Capítulo II

671 56 355
                                    

O espelho esfumaçado da pia escura de mármore, refletia a imagem embaçada da toalha felpuda enxugando as pontas molhadas dos cabelos sobre os ombros nus que, assim como a extensão de todo o corpo, exalava o aroma suave de jasmim e lavanda. Abotoei a calça jeans desbotada me perguntando da razão do top preto ser mais apertado que a calcinha do conjunto, mas abandonei a ideia de pedir outro e vesti o suéter bege de mangas tão compridas que cobriam as pontas dos dedos.

Encarei as olheiras escuras e algumas sardas na ponta do nariz; normalmente as pontas desordenadas da franja às escondiam. A aparência decadente era ofuscada pelo tom escuro dos fios ruivos, que acentuava minha palidez anêmica.

Girando os calcanhares, deixei o banheiro e calcei o par de tênis pretos, guardados estrategicamente embaixo da cama na espera de Louis que não tardou em aparecer:

- Posso entrar?

- Pode. - respondi amarrando o cadarço.

Louis entrou elegante e cordial no quarto, enquanto estendia a mão como um cavalheiro dos romances de época, guiando a pura e indefesa heroína aos caminhos da história. Admito que aceitei sua ajuda, mas obviamente a realidade não parecia com um romance meloso, muito menos que sou "inocente". O trajeto a sala de jantar foi recheado de informações e macetes para não me perder, ao tempo em que, intermitentemente, Louis explicava sua rotina atarefada de criado pessoal do mestre da casa e deixava escapar o quanto Gabe era demasiado negligente em "certos assuntos". A conversa foi se prolongando, prolongando e, ao paramos na porta dupla enorme, não percebi a presença de uma terceira pessoa passando por nós, e que abriu a porta.

- Boa sorte minha senhorita. - desejou curvando-se levemente, enquanto eu avançava rumo as portas escuras da sala de jantar, melhor dizendo: salão.

A arquitetura de espaço exagerado e as cores escuras eram as mesmas dos outros cômodos da mansão, assim como a mesa longa polvilhada de louçaria fina e sombria. Magnus - o qual por intermédio de Louis descobri ser o irmão mais novo de Gabe - ocupava a cabeceira da mesa.

- Sente-se ao lado de Gabe. - ordenou rígido.

O meu amo, como Louis instruiu chamá-lo, estava sentado no lado esquerdo da mesa com o outro que passou por mim na porta, mas o espaço de duas cadeiras desocupadas indicava que os dois preferiam manter distância. O oposto do trio do lado direito que sentavam juntos, inclusive a garota da cozinha que havia me abraçado estava sentada ao lado de um garoto de cabelos marrom-avermelhados, que apoiava o queixo numa mão enquanto batucava as pontas dos dedos na madeira num ritmo irritante.

- Pare com esse barulho, Dante. - estalando a língua, obedeceu Magnus.

Enquanto me juntava à mesa, os olhares pesados recaíam nas minhas costas como flechas num campo de batalha, propagando uma tensão intimidante que estremecia os ossos. Seis pares de olhos sedentos me encaravam como lobos antes de estilhaçar um cervo que foi encurralado.

- Agora que todos estão presentes, vamos às apresentações. - Magnus pigarreou quebrando o silêncio.- Esta jovem é a nova inquilina da casa, e também a presa de Gabe. - anunciou despertando a atenção de todos os presentes, menos o referido que continuava a comer de olhos fechados sem se importar com nada.

- Como assim? - Dante bateu o punho cerrado contra a mesa, nada feliz pela notícia. - Ela não é a nova noiva de sacrifício enviada pela igreja?

Então a igreja ainda troca suas ovelhas por trégua, que decepcionante.

- Não, ela não é. - Magnus franziu o cenho irritado por ser interrompido.- Vou deixar bem claro para que entendam: ela é propriedade do Gabe.- repetiu voltando a atenção a minha inexpressividade diante a situação.

O conto da máscara Onde histórias criam vida. Descubra agora