Capítulo 6 - A história de Ana

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Pedro não viu a hora passar. Enturmado, tinha até entendido porque o sumiço do nepalês Sujeev era tão importante assim. Aparentemente, alunos de ASL podiam se conectar uns com os outros não importava onde estivessem. E, se acontecesse alguma coisa com alguém durante a conexão, todos os envolvidos sentiam.

— Acho que já maratonei uma série assim... — Pedro pensou em voz alta.

— Ah, mas ASL tem bem menos firula, bem mais pé no chão — Virgo respondeu.

 A jovem astróloga foi uma das últimas pessoas a sentar-se junto dele.

— Você é astróloga desde criança? — Pedro perguntou a ela. — Eu sei. Pergunta idiota!

Na verdade, queria saber dos sonhos dela. Queria ter coragem de perguntar coisas profundas como os demais faziam, mas ainda não tinha chegado a esse ponto.

— Existem perguntas que sempre vale a pena fazer... — disse, distraidamente, com sua voz de contralto — Quando eu tinha seis anos, meu sonho era ser uma fada.

Pedro não perguntaria se ela lia mentes. Resolveu dizer:

— Fada de fada mesmo?

— É... Eu queria transformar os sonhos de todo mundo em realidade... Eu tinha um caderno onde anotava minhas conversas com os anjos e as bruxas que conheci...

— Bruxas?

— Óbvio que, naquela época, elas não tinham consciência de seu poder. Mas eu sempre tive facilidade para ver além dos rótulos... Você está estudando o limite dos nomes?

— Parece que sim.

— Por que parece? — Virgo estava genuinamente interessada.

— Sei lá, quer dizer, tá tudo indo tão rápido. Nem parei direito ainda...

— ...pra pensar, né ? – ela sorriu.

— É, nem parei pra pensar.

— Bem, os nomes têm dessas coisas... Você diz que quer ser uma "fada" e as pessoas te relacionam a certas coisas. Te associam a outros nomes, né? Como em um mapa mental. E esses nomes têm peso, tem carga como dizemos aqui, carga energética. Se eu usar a palavra "ruim", a carga não é "positiva", né?

— É. Mas...

— ...mas é só uma palavra. "Ruim", "horrível", "péssimo" têm cargas diferentes quando descrevemos objetos e pessoas distantes ou quando falamos de nós mesmos e de pessoas próximas. É diferente dizer que você mesmo é uma pessoa ruim ou que fulano que a gente mal conhece é uma pessoa ruim. Dói de um jeito diferente...

— É.

— Como quando você estuda tarô e, por isso, usam a palavra "pirada". Você sabe ler mentes e, por isso, é "doentinha". Nada disso soa muito agradável. Tem a ver com a nossa intenção e com a de quem fala. As palavras vão ganhando carga...

— Foi isso que aconteceu com você?

— Em parte... Mas, sabe, o que é ser "louca", "doentinha" ou "pirada" também muda dependendo do tempo... Em alguns tempos e espaços, dizer que o deus da chuva precisa ser alimentado com sacrifícios humanos não era ser "louca", era ser "prudente". Hoje em dia, o que é ser prudente?

A resposta escapuliu da boca de Pedro:

— Saber seu lugar, ganhar seu dinheiro, se proteger e proteger os seus.

— Interessante, não é? Tudo depende do que se teme. Antes temíamos o deus da chuva, hoje tememos o deus dinheiro.

Pedro imaginou um deus empresário, vigiando as ações humanas e Bolsa de Valores com o mesmo afinco, e não conteve o riso. Virgo sorriu com ele.

Pedro e o Limite dos Nomes (Série A.S.L - volume I)Onde histórias criam vida. Descubra agora