Sentado em frente a uma mesa branca de material barato e cercado por equipamentos de gravação, Caim fora interrogado por alguma repórter de rádio famosa. O assunto da tal indagação era o relacionamento recente, mas forte e estável no qual depositava suas esperanças. Com calma e paciência, o rapaz reviu o filme do conto amoroso na própria cabeça, e não estava arrependido de perder-se neste.
Com a cabeça levemente tombada para o lado e as orbes verdes fixadas nos próprios dedos, a mesma história de sempre rodou como uma fita cassete dentro do coração frágil, e ele mergulhou de uma vez só nos próprios dizeres, e lembrou-se de tudo que continuamente dizia a si mesmo quando perguntava-se a ele próprio como é que chegaram ali, e como é que as coisas tornaram-se tão visivelmente intensas.
— Conheci o Damon numa época deplorável para minha pessoa, foi como quando alguém está no deserto e finalmente lida com um oásis, depois de tanto tempo sem água. Ele foi o meu.
Não sei ao certo dizer o que nos aproximou no começo, se foram apenas os interesses físicos ou se já sabíamos, no fundo, que estamos conectados. Tudo foi de maneira genuína, e os dias, por mais que rápidos, pareciam passar lentamente para nós dois. Isto é engraçado, porque os momentos felizes antes costumavam serem apressados, mas não funciona assim conosco. Temos algo que vai além do que posso colocar em palavras, e é por isso que não tento. Entretanto, tento manter-me focado em dá-lo tudo que tenho a oferecer. Todo, cada mínimo pedaço meu. Acho que meu coração era para ser dele.
Ajeitou-se na cadeira desconfortável, deixando um suspiro escapar.
— Algumas coisas, às vezes, parecem vir com tudo para tentar nos separar. Até mesmo os amigos. Numa situação incômoda como esta, me surpreende que ainda fiquemos juntos. Nossas mãos continuam dadas, mesmo no fogo. Mesmo ardendo muito. É assim que superamos os problemas, lidamos com eles como se nossos corpos, almas e corações fossem um só. E, de vez em quando, acho que são. Não que eu queira me comparar a ele ou ele a mim, porque somos bem opostos, mas não como inimigos que acabam virando amantes. Somos como os elementos, por exemplo, que complementam um ao outro. Se eu sou fogo, o Damon é água e vice-versa.
Olhou para cima, para onde a mulher de cabelos longos o olhava distante, mas a feição dava a entender que estava esperando alguma continuação. Então ele continuou:
— Você passa a vida toda lendo livros e vendo filmes sobre o amor e, baseado em suas experiências, acaba achando tudo um grande marketing exagerado do romantismo. Então, quando o amor chega, é meio assustador. Não tem para onde correr ou um lugar no qual possa se esconder por algum tempo, porque o sentimento está em você, em seu coração. E não há nenhuma forma de se esconder de si mesmo, não há como tirar férias e deixar o amor em casa. A diferença entre paixão e o que é isso fica irremediavelmente nítida, até nas mínimas coisas. Atitudes espelhadas nas do outro, ou então como os corpos realmente se encaixam bem e não é nenhuma suposição, porque poderíamos nos medir com réguas, se preciso.
Encolheu os ombros, coçou a nuca e reviveu sentado alguns momentos específicos. Como ligar para ele e depois de um tempo dizerem:
“Eu procurei tanto por você, Caim.”
“E eu esperei tanto por você, Damon.”
— Todo mundo acha que é separado, como amor de compreensão. Mas não é. Eu percebi isso há uns dias, que compreensão e respeito fazem parte de amar. E se você ainda não compartilha disto com alguém, é porque o amor talvez não tenha chegado. Todavia, vale a pena esperar por tudo isto. Assim como o amante que espera o amado depois de um dia cansativo. Voltar para casa torna-se não só voltar para o mesmo cômodo em que está quem ama, mas voltar para a pessoa que se ama. Lar começa a renascer com uma nova definição, mais branda e mais imperiosa que outrora.
Com um pequeno sorriso de lado contornando os lábios, encerrou:
— Damon é o meu lar.