09- Verdades Ocultas

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"Mentiras são as flores, e as verdades são espinhos..."

JFS Rap.


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Quando cheguei em casa, Marcela estava com aquela cara de poucos amigos. Eu sabia que tinha dado mancada, e, como sempre, ela ficaria emburrada no início, mas logo voltaria ao normal, como em todas as outras vezes, em um outro mundo.

Entrei no meu quarto e, ao passar pela ampulheta, notei que a areia estava descendo mais rápido do que o normal. Mas o cansaço estava me vencendo, minhas pálpebras estavam se fechando sozinhas, como se me arrastassem para a cama.

Com as mãos pesadas, coloquei o celular para carregar, tirei as botas, o sobretudo e a calça. Entre os lençóis, o calor do descanso era irresistível. Fechei os olhos e me entreguei ao sono.

No dia seguinte, o som insistente do despertador me arrancou de um sono profundo. Quando olhei no espelho, vi que meus olhos estavam fundos e escuros, reflexo do pouco tempo que consegui dormir.

Me levantei e fui para o banheiro. Peguei a toalha, um vestido longo de alcinha verde escuro e uma lingerie, tirando minhas meias e jogando-as em cima da cama. Ainda enrolada na toalha, segui para o banho.

Fui a primeira a chegar no banheiro. Escovei os dentes, sentei no vaso e acabei cochilando por alguns minutos. Quando me levantei, não queria de jeito nenhum encarar a água gelada, mas entrei de vez. Sabia que, se tomasse banho quente, meu sono só iria aumentar.

Enquanto tomava um banho rápido, quase ouvindo Franchesca arrombar a porta gritando para eu apressar, acabei me vestindo rapidamente. Vesti o vestido, coloquei a jaqueta jeans por cima e as botas, peguei minha bolsa, tirei o celular do carregador e desci para a cozinha.

Marcela já estava acordada. Suas box braids estavam presas em um coque alto, e ela usava um vestido branco com seu costumeiro avental. Me lembrei que, no outro mundo, ela sempre foi assim — uma mulher forte, que nunca quis ajuda em sua cozinha. Eu sempre a incentivava a contratar alguém para os serviços domésticos, mas ela sempre dizia que só ela sabia como mexer em seus utensílios.

— Bom dia, Marci! — falei, tentando soar alegre, mas ela continuou lavando a louça, sem olhar para mim.

— Bom dia. — A resposta dela foi fria.

— Marci, não fique assim comigo. Eu juro que não farei mais isso. — implorei, e ela colocou o último prato no escorredor, enxugando as mãos com um pano de prato.

— Priscila, eu sei que você é grandinha e sabe se cuidar, mas te considero como uma filha. Você sabe como é essa cidade e as coisas bizarras que acontecem de madrugada. A filha da vizinha me contou que, ao voltar da loja da Victoria's Secret, viu um maluco batendo na parede com um taco de beisebol. — Marcela falou, fazendo meus olhos se arregalarem de surpresa. Que loucura.

— Você acredita nisso? — perguntei, tentando processar.

— Claro. Com tanta gente doida por aí, quem não acreditaria? A Franchesca uma vez viu um homem drogado sufocando uma garota na escada do metrô, e ninguém estava por perto. Sorte da menina que Fran estava com um taser e conseguiu salvá-la. — Marcela completou.

Eu me lembrei de como Franchesca era precavida. Ela havia treinado jiu-jitsu, Krav Maga, judô, e sua bolsa estava sempre cheia de equipamentos, como spray de pimenta e um taser.

— E pensar que isso acontece o tempo todo e muitas mulheres não têm a mesma sorte de serem salvas... — falei, triste com o rumo da conversa.

— Você precisa tomar mais cuidado, Priscila. Não seja tão inconsequente. O rapaz te chamou para sair, e ele podia ao menos te trazer em casa ou chamar um carro particular. Sei que nem todo mundo é confiável hoje em dia, mas a sua vida vale mais, e você não deve colocar nada — nem trabalho, nem paixão — acima disso. Entendeu? — Marcela me advertiu, e eu abaixei a cabeça, envergonhada.

REALIDADE PARALELAOnde histórias criam vida. Descubra agora