Pedido de Desculpas

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Luna Castilho:

Voltei para casa feito um cachorro humilhado, não sabia porquê, mas me sentia estranhamente mal após a discussão. E pela primeira vez, defender minha ideologia não parecia tão importante assim para mim, eu deveria ter calado a boca. Fiquei um bom tempo só em casa, com meus pensamentos me enchendo a cabeça, e já me preparando para as discussões que viriam com meus pais.
Eles chegaram, foi pior do que eu esperava. Os gritos começaram desde que puseram o pé dentro de casa, meu Pai esbravejava, gritava meu nome, eu me encolhi debaixo dos lençóis, olhando a estampa de bichinhos com lágrimas nos olhos. Espremi meus olhos com o coração batendo tão forte que eu ouvia suas batidas próximas ao meu ouvido como marteladas numa madeira oca. Os passos se aproximavam mais e mais da minha porta, ouvia o coturno de meu pai pisar mais forte do que nunca antes. Engoli meu choro e tentei conter minha respiração que estava descompassada por tamanho nervosismo.

LUNA CASTILHO! — Berrou, ouvi seus passos cessarem e mordi meus lábios, sabendo que ele abriria a porta mais cedo ou mais tarde. A porta se abriu com brutalidade, e meu pai berrou meu nome, meu coração bateu ainda mais forte, e eu temia acabar adquirindo uma cardiopatia por causa de tamanho nervosismo. Deixei minhas lágrimas escaparem e chorei em silêncio, tentando fingir que estava dormindo. — Sei que está fingindo, você não me engana, pare de ser sonsa!

E puxando o lençol de cima de mim, eu abri os olhos assustadas, olhando Papai com os olhos inchados de choro, e tremendo feito vara verde.

— Me desculpa, por favor! Me desculpa! — Exclamei, me encostando na parede, meu tio bufou.

Não é a primeira vez que você me envergonha! Não é! Você ama ficar expondo sua opinião por aí, mas não aceita que ninguém exponha a sua, você é uma alienada! — Ele gritou, eu solucei devido ao choro. — E amanhã você vai pedir desculpas para ele, o mais cedo possível! Você me entendeu?!

Afirmei com a cabeça aos prantos, meu peito doía do esforço que eu fazia para chorar e respirar ao mesmo tempo, e meus lábios tremiam ficando entreabertos por causa dos soluços de medo que me invadiam.
Após mais xingamentos e ameaças sem fundamento, meu Pai saiu do quarto, deixando tudo no maior e absoluto silêncio, com exceção de meus soluços que vez ou outra rompiam o silêncio.
Demorei muito tempo para conter meu choro, encarando a luz cor de âmbar do meu fraco abajur. Uma dor de cabeça lancinante me invadia, então finalmente reuni certa coragem para me levantar e ir até a sacada, abri a cortina torcendo mentalmente que Renan não estivesse ali. Em passos lentos e arrastados, caminhei em direção à sacada, quase berrando de frustração ao ver Rena parado ali, não era possível, com uma casa enorme, esse garoto não tinha outro lugar para gastar seu tempo? Fechei as cortinas cor de salmão novamente, me sentindo mais triste do que irritada.
Passei a madrugada em claro, contando as horas para ver os primeiros raios de sol e formulando desculpas boas o suficiente para os Bolsonaro não odiarem toda a minha família por minha única e exclusiva culpa. E enquanto terminava mentalmente meu discurso de: "Eu não disse tudo aquilo intencionalmente, me desculpem", o céu assumiu suas primeiras cores matinais, se preenchendo de tons pastéis que me fizeram sentir certa leveza. Quando o sol nasceu por completo, decidi tomar um banho, ansiando pelas desculpas que teria que dar logo mais.

[...]

Não demorou muito para que meus pais acordassem, e antes que eu pudesse lhe dar o gostinho de gritarem comigo para me acordarem, eu já estava de pé, para a surpresa de todos. Na primeira movimentação que observamos na casa dos Bolsonaro, atravessarmos a rua pela segunda vez, e eu tendo de reunir certa coragem, bati na porta. Um rosto sonolento apareceu, era Flávio, que coçava os olhos feito um bebê barbado. Ele sorriu e me encarou, tinha os olhos iguais aos de seu Pai, bocejando, ele rompeu o silêncio:

Minha Gatinha Comunista Onde histórias criam vida. Descubra agora