O COLECIONADOR DE MÁSCARAS - por DÉCIO GOMES

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As cores típicas de outubro preenchiam as ruas, as sacadas das casas e as vidraças das lojinhas, dando vida a decorações alaranjadas, roxas e verdes que pendiam de todos os lugares que a vista alcançava. Era uma sexta-feira de clima agridoce, regada à véspera do evento mais esperado do ano pelo povo daquela pequenina cidade: o Halloween.

 As ruas e calçadas estavam mais movimentadas que o normal, graças ao fluxo que ia e vinha de todos os lugares com moradores apressados, carregando suas compras – em grande parte fantasias e sacos dos mais variados tipos de doces – em grandes sacolas coloridas. Por todos os lados crianças corriam, muitas já preparadas para a longa noite de travessuras ou gostosuras, em suas inocentes figuras de vampiros, esqueletos e zumbis. Os veículos que transitavam incessantemente pareciam comportar motoristas apressados, ansiosos pela hora dos festejos que se dariam poucas horas adiante.

 Em um dos carros, porém, um motorista tranquilo e despreocupado derramava seu olhar por cada detalhe da cidade, guiando lenta e cuidadosamente por entre as faixas tomadas por pedestres animados e coloridos. Era um homem de meia idade, com os cabelos mistos entre o preto e o grisalho, de aparência jovial e rosto forte. Usava um casaco de lã marrom, de aparência muito velha, que subia em uma longa gola até o fim de seu grosso pescoço e roçava na barba parcialmente grisalha a cada movimento realizado pelo homem.

 Depois de atravessar mais meia dúzia de semáforos o carro do homem de casaco marrom parou rente a um prédio de paredes brancas e descascadas, e aos movimentos de uma manobra rápida do motorista foi posicionado em um pequeno estacionamento de quatro lugares, preenchidas apenas por ele mesmo e mais um carro pequeno, vermelho e repleto de adesivos de times de futebol. Sem demora ele abriu a porta e moveu as pernas, sentindo um alívio reconfortante por finalmente poder ficar de pé, e curvando-se para o banco de trás puxou uma pequena mala preta, de tamanho suficiente para comportar apenas um par de roupas e talvez um ou dois utensílios pessoais. Trancou as portas do veículo e, após levar a mão esquerda a um dos bolsos e de lá retirar um discreto maço de cigarros, levou um deles aos lábios e o acendeu com um isqueiro prateado que repentinamente surgiu em suas mãos, também vindo de um dos bolsos da calça. Tragou, sentindo o prazer em forma gasosa deslizar em sua garganta, e logo em seguida pôs-se a caminhar de maneira lenta e ligeiramente manca na direção da entrada do prédio.

 Era uma pousada, uma pequenina pousada que parecia não comportar mais que quatro ou cinco quartos. Estava situada nos limites do centro da cidade, pouco afastada das ruas comerciais, e fixava-se em uma esquina circundada por casas pequenas e que se espalhavam no que parecia ser a entrada de um subúrbio qualquer. Com seus sapatos de solado grosso o homem guiou três ou quatro passos e alcançou a porta estreita, abrindo-a e fazendo com que rangesse de forma desgostosa.

 Entrou, e agora estava em um recinto estreito, uma espécie de sala residencial adaptada em recepção, onde um balcão de madeira se exibia recostado a uma parede, protegendo um painel com pequenos ganchos de onde alguns pares de chaves pendiam silenciosos. Havia por lá algumas poltronas espalhadas, cada uma de cor e material diferentes, contrastando com um papel de parede floral e móveis que pareciam ter sido retirados de uma casinha de bonecas. Não havia ninguém lá, mas o visitante não precisou esperar por muito tempo. Ouviu passos arrastados surgindo de um corredorzinho que seguia por uma das paredes, e segundos depois viu surgir uma mulherzinha esguia, vestindo um casaco amarelo que pouco combinava com o vestido azul cobalto. Exibia um corpo de não mais que um metro e meio de altura e alguns quarenta e cinco quilos de carne e ossos.

 -Seja bem-vindo à nossa pousada, senhor! – disse com entusiasmo enquanto se aproximava e dava a volta pelo balcão, parando tão logo chegou atrás dele e estarrecendo ao olhar para o cigarro aceso em meio a dois dedos do possível hóspede. –Senhor, não pode fumar aqui!

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