POBRE MARIA - por ROGÉRIO QUEIROZ

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Capítulo I

A morte de Maria

Era uma bonita noite de outubro, o céu desenhado pela lua e por estrelas faiscantes contradiziam a feiura estendida no chão.

O pequeno corpo da mulher, destroçado. O ventre fora esfaqueado com uma agressividade incomum. Animalesca. Uma jovem de cabelos negros, manchados de sangue; a pele branca, mortalmente pálida; o rosto outrora viçoso estava dramaticamente contorcido para o lado e os olhos castanhos-mel encaravam o meio fio da calçada de um beco escuro.

A polícia chegara ao local do crime e se deparara com a cena chocante, jamais vista na pacata cidade. 

O delegado Frederico Barros estava acostumado com a rotina calma da cidade, com seus casos de brigas entre vizinhos e bêbados inofensivos. O assassinato da jovem era assustador. A sua primeira chance de pôr o que havia estudado em prática o intimidava mas, internamente, ele se sentia tão desafiado quanto enojado.

Algo o intrigava com a posição contorcida do rosto da jovem, já identificada pelos policiais como Maria Tolentino, dezessete anos. Porque o assassino não queria que ela o encarasse?

A perícia também chegara ao local e fazia o seu trabalho, mas os resultados demorariam algum tempo até que ficassem prontos. E, dessa forma, a investigação ficaria comprometida. As primeiras horas são fundamentais na busca pelo assassino e qualquer pista seria útil.

Um aglomerado de pessoas se formara ao redor da faixa amarela posicionada pela polícia. A população parecia em choque com o que via. Os murmúrios incessantes cresciam e o grupo aumentava. Toda a confusão não impediu que Fred percebesse a presença de um homem vestido de preto se agachando para apanhar um objeto no chão. Em seguida, o padre se aproximou da faixa e pareceu abalado com o que via: “Meu Deus, não pode ser!”, ele exclamou.

Fred não poderia desperdiçar qualquer informação e pediu que o homem se aproximasse.

– Você a conhecia, Padre?

– Ela se confessou comigo hoje – Respondeu aflito, sem tirar os olhos do corpo. – Estava nervosa, mas eu não imaginei de forma alguma... Isso.

– Claro, padre, ninguém imaginaria essa barbárie – Fred relutou um pouco para perguntar o nome do homem.

– Eu me chamo Afrânio. Padre Afrânio.

– Padre Afrânio, há quanto tempo esta moça saiu da igreja, você poderia precisar?

– Sim. Depois da missa, alguns jovens se reuniram para se confessar comigo. Eu acredito que, depois que conversamos, ela foi embora. Respondendo a sua pergunta, penso que faz pouco mais de três horas. – Havia tristeza em sua voz, talvez pela percepção da idade da garota.

O relógio de Fred marcava vinte e três minutos passados da meia-noite.

– Obrigado, padre. Acredito que sua informação possa ser útil.

– Estou disposto a ajudar no que for preciso.

– Provavelmente voltaremos a nos ver, já que você foi a última pessoa que viu a moça com vida. Amanhã você poderia ir à delegacia para um depoimento formal? Se for o caso, a polícia pode emitir um mandado...

– Não será preciso, meu filho. – Afrânio o interrompeu um pouco nervoso. – Como disse antes, farei o possível para colaborar com a investigação.

Seguindo o velho clichê do “não deixe para amanhã o que você pode perguntar hoje” o delegado fez uma última pergunta:

– Você poderia me dizer o que recolheu do chão há pouco, Padre Afrânio?

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